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PiTacO do PapO! 'Annabelle 2 : A Criação do Mal' - 2017

NOTA 7.5

'Satanás, é você?'

Por Vinícius Martins @cinemarcante


Dizem que quando uma pessoa boceja em público, outra também boceja em resposta; esse ato trata-se de um reflexo natural do organismo, que muitas vezes foge do nosso controle e até mesmo da nossa percepção. Em ‘Annabelle 2: A Criação do Mal’, existe uma cena de bocejo logo nos primeiros cinco minutos – quando a mãe da menina Annabelle a coloca para dormir ao som de 'You Are My Sunshine'. Quando me notei, estava eu bocejando junto com a garotinha, começando a acreditar que esse segundo filme seria tão tedioso quanto o primeiro. Doce engano esse truque do bocejo, ponto para o diretor David F. Sandberg e para o roteirista Gary Dauberman pela astúcia.

Para ser franco, fiquei o primeiro ato inteiro crendo que as melhores coisas da sessão seriam a prévia de ‘IT’ e a nostalgia potteriana de ver a logo da Warner surgindo entre as nuvens num céu noturno. Após uma rápida introdução sobre como foi a breve vida da garota a que a boneca do título se refere, o filme começa a se desembolar com uma pegada bem parecida com a do segundo ‘A Mulher de Preto’, onde crianças de um orfanato, por não terem outro lugar para ir, se mudam para uma casa enorme no meio do nada. No entanto, as cenas foram passando e a trama começou a girar de verdade. Veio um arrepio, depois outro, e então o susto (uma premiação pela expectativa criada na construção do suspense, assunto a ser debatido em um artigo vindouro). Foi então que o capeta entrou em cena (há um duplo sentido aqui) e começou a assombrar a vida de uma pobre garota órfã, a fim de torná-la sua próxima vítima. Comecei aí a perceber que esse não seria um filme para dormir, como o sonífero audiovisual que foi o longa de 2014, e dei mais atenção para o que eu estava assistindo – e entre altos e baixos, constatei que o bocejo me traiu.

Tem diabo pra tudo quanto é lado, e é criada uma atmosfera de perigo que se sustenta de forma constante após a lenta primeira meia hora de duração. E por falar no diabo, devo dizer que tenho ressalvas com o uso excessivo de sua figura.

Particularmente, nunca entendi a necessidade de pintar o demônio com uma face horrenda sob um par de chifres protuberantes e fálicos. Muitos filmes fazem uso da figura de satã como um monstro católico, aquele pintado por Botticelli e descrito por Dante Alighieri em sua famosa 'Divina Comédia', mas sou meio cético quanto a essa monstruosidade toda (afinal, como o mal encarnado pode ser sedutor e atrativo – como dizem que é – se for parecido com um monstro borrachudo saído dos Power Rangers?). 

Deixando meu cinismo de lado, já que meu papel aqui não é bancar o advogado do diabo, devo dizer que usam e abusam do tinhoso (não leve para o lado sexual do termo “abusar”, uma vez que o capeta nesse filme não é molestado) e da figura assombrosa que ele é, lançando sua imagem quase que gratuitamente na tela a todo instante. 

O que incomoda em ‘Annabelle 2’ é sua previsibilidade. Nos momentos de silêncio e “calmaria”, já é evidente que em seguida o áudio irá explodir e algo será lançado contra a câmera. O uso do diabo fica nítido como artifício para colocar medo e “presença” como justificativa para que o espectador salte da poltrona, mas acaba que isso é justamente o que impede o filme de ser surpreendente –  já que é sabido quem está por trás da boneca encapetada e não há criação de expectativa sobre o que será visto. Isso faz com que a tensão criada soe forçada e vire até caricatura de si mesma, gerando uma áurea cômica na situação como um todo que chega a beirar o ridículo.

Outra coisa que não entendo, que é um cliché dos filmes de terror, é a imbecilidade que alguns personagens tem diante de uma ameaça. Se eu olho por um buraco de fechadura e vejo que dentro do cômodo há uma boneca se balançando sozinha em uma cadeira, é certo que não vou nem cogitar abrir a maldita porta. Todavia, a porta é aberta no filme. E os personagens pagam pela ignorância de sua própria estupidez.

O novo filme da boneca manipulada pelo pé preto (sim, há uma cena de pé preto no filme) rende alguns bons sustos e se faz uma sessão pipoca até decente, sendo bem melhor e mais assustador que o primeiro – mas ainda assim permanece longe de ter a mesma qualidade e cuidado que os dois filmes da franquia que o originou. O final tem uma boa reviravolta (também previsível, pelo menos para mim, que desde o começo estava me perguntando como essa história iria se resolver de modo a não contradizer o seu antecessor) e a produção no geral cumpre sua função de arrancar gritos da plateia; mas deixa vazio o assunto para depois da sessão, na hora do lanche, já que não há nada de novo a ser discutido sobre o tema. Minto! Há uma lição importantíssima sim a ser aprendida com esse filme, e ela é a seguinte: se o capeta quiser puxar o seu elevadorzinho pra baixo, dê com a lanterna nos dedos dele que ele solta. Fica a dica.


Vale Ver ! 

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