Matéria Especial: Como a Farsa de Edir Macedo Afeta o Cinema
Por Vinícius Martins @cinemarcante
A FARSA DO FILME DE EDIR MACEDO
Normalmente não gastaria meu tempo falando de alguém como o autointitulado bispo Edir Macedo, mas a situação de certo modo me obriga. Hoje vou falar sobre a trapaça que ele cometeu dentro da indústria do cinema e de como isso atrapalha o mercado como um todo.
Em tempo, uso aqui o termo “trapaça” porque “ilegal” infelizmente não pode ser aplicado, por mais mesquinha que seja a situação (não há leis que proíbam essa ação, mas isso não significa que ela seja correta). O que quero expor nesse artigo é a minha indignação quanto a desonestidade de uma figura pública que usa meios nada cristãos com o argumento da fé, já tendo levado pessoas economicamente vulneráveis a entregar suas casas e carros sob a jura de uma recompensa divina, e que agora promete, novamente, bênçãos descendo dos céus sobre a cabeça de quem for assistir ao seu filme no cinema.
Antes de prosseguir, devo deixar claro que não é minha intenção ofender aos fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus com essa postagem, e nem tampouco aos milhares de trabalhadores diretos e indiretos da emissora Record de televisão. Estou falando exclusivamente sobre a conduta do homem que chefia ambas as instituições e das coisas que ele obriga e incentiva aqueles que o seguem - empregados ou fiéis de igreja - a fazer.
COMO FUNCIONA A INDÚSTRIA DO CINEMA
A indústria do cinema é um celeiro de arte. Algumas obras são compreendidas e/ou bem aceitas, enquanto outras não. Todavia, o que ninguém contesta no cinema é a imensa variedade de gêneros que existe, dando ao pagante a opção de investir seu dinheiro comprando o ingresso do filme que melhor lhe encha os olhos (por isso milhões são gastos em marketing massivo, para promover o filme a blockbuster.) A lotação das salas de cinema é determinante para o tempo que o filme permanecerá em cartaz e também ao número de salas em que ele será exibido, e esse mesmo critério dita quantas sessões cada sala terá (podemos ver quatro filmes diferentes em uma mesma sala em um único dia, por exemplo).
Logo, se um filme não faz sucesso quando é lançado, ele não dura muito no cinema. E é aí que entra em debate o filme 'Nada a Perder’, cinebiografia de Macedo, que tem como subtítulo um sensacionalista “Contra tudo. Por todos.” Afinal, contra tudo o quê? E por quem exatamente? Porque a mim ele não representa, e até hoje não fez nada que influenciasse positivamente a minha vida. Só pelo cartaz já é visível que o filme superestima a si mesmo, glorificando a figura de um presidiário que lê a Bíblia com a pompa de um mártir.
'Nada a Perder’ começou sua pré-venda seis semanas antes de estrear, e já tinha garantidas três semanas de exibição nos principais shoppings da região, sendo que para essas três semanas estavam reservadas três salas em cada complexo, e todas com horários integrais. Sessões o dia todo, de um filme que, quando colocado ao lado de 'Jogador N°1’ de Steven Spielberg, não é nada. E por ironia, 'Jogador N°1’ está saindo de cartaz após fazer milhões e lotar várias salas em todo o país, mas 'Nada a Perder' permanece em cartaz em múltiplos horários. Mano do céu, tinha sessão desse filme até às nove da manhã! Nove da manhã! E cinemas nem abrem de manhã!
O problema que aponto aqui é o uso desleal de Macedo, que tem como arma seus próprios recursos (dinheiro doado por cristãos fiéis a Deus, enganados pelas promessas desprovidas de fundamentos bíblicos) em uso para tornar seu filme um blockbuster. Imaginem o seguinte cenário: eu, que vos falo, escrevo um livro; mil exemplares do meu livro são impressos na primeira tiragem, e desse milhar eu compro novecentos. Após tamanha venda, a editora lança mais cinco mil exemplares no mercado, e desses eu compro mais quatro mil. Em seguida, são impressos dez mil novas cópias do meu livro, e eu compro nove mil. Agora eu pergunto a você: o meu livro é um sucesso genuíno ou o fato de ele configurar na lista de mais vendidos não passa de uma farsa criada por mim? As pessoas compraram e leram o que eu escrevi ou o “sucesso” desse livro é na verdade fabricado pelo meu ego, já que tenho dinheiro para comprar meu próprio produto e quero ver o meu nome no topo da lista de mais vendidos?
Ter uma obra no topo faz parecer um sucesso, não é mesmo? Pois é, só parece.
Acontece que a ilustração do livro que citei acima é exatamente o que o “bispo” fez.
Edir Macedo pode até tirar onda, dizendo que 'Os Dez Mandamentos’ é o filme nacional de maior bilheteria de todos os tempos, mas não é nem nunca será o dono do maior público e nem um sucesso verdadeiro, nem o mais rentável, já que a Igreja Universal, a mando do próprio Macedo, comprou os ingressos e passou a distribuí-los gratuitamente após o fiasco nas vendas ao público. E agora, querendo ter seu ego acariciado mais uma vez, ele faz o mesmo com seu filme autobiográfico.
Aí entramos nos méritos da igreja. Macedo induz sua congregação a ir assistir ao filme, quase como uma imposição. O problema é que agora, além de prometer o retorno financeiro em dobro do dízimo entregue, o recebimento equivalente ao dízimo antecipado, criar um “parque temático” de Deus (a réplica do Templo de Salomão) e vender por quantias de três dígitos produtos ungidos que custam cinquenta centavos quando comprados em atacado, o cara me vem com o discurso de que os fiéis que forem assistir sua autobiografia no cinema terão algum crédito com Deus e receberão uma benção especial que será dada na sessão só para quem estiver na sala. E mais! Se quiser receber a bênção mais de uma vez é só ir várias vezes assistir, pois para cada sessão há uma benção diferente e especial. Quer saber como eu sei disso? Eu já explico.
O CARTAZ NA IGREJA
Não gostaria de me ater aqui a debater as mentiras pregadas nas igrejas, que vendem a benevolência divina como se bênçãos fossem algo que se compram em um mercado e templos fossem shoppings (acho que todos se lembram do episódio em que Cristo expulsou esse tipinho de gente de dentro da casa de Deus, relatado no segundo capítulo do livro de João). Entretanto, sou obrigado a tocar em um ponto em particular. Há algumas semanas, bem antes do lançamento do filme, estava eu andando pela rua principal do meu bairro e passei em frente a uma filial da empresa (ops...) da igreja do Edir Macedo. Ao invés de ter algum cartaz pregando as boas novas da salvação, ou algum dizer edificante que atraia o indivíduo comum andante a refletir sobre Deus, estava colado na parede, bem na entrada da igreja, um pôster do filme ‘Nada a Perder’, que viria a estrear nos cinemas em 29 de Março de 2018. Parei um instante e analisei o cartaz, ainda tentando digerir o fato de o homem estar veiculando seu filme (que não é um épico bíblico), cuja finalidade é vender a própria imagem em uma versão “beatificada”, na porta de uma igreja que deveria pregar a presença divina. Foi então que fui surpreendido por uma senhora com um sorriso simpático.
Ela me desejou boa noite e perguntou se eu era repórter, e após eu negar ela perguntou por que eu estava interessado no filme. Conversei rapidamente com ela, explicando educadamente minha curiosidade, enquanto o culto acontecia dentro do templo. E ela me perguntou se eu não gostaria de comprar um ingresso para ir assistir ao filme, com o “preço simbólico” (palavras dela) de apenas R$10,00. Agradeci a oferta e recusei, mas pedi para tirar uma foto do cartaz. Ela permitiu e ainda me ofereceu um jornal, o Folha Universal, que trazia no verso a mesma propaganda que estava colada na parede. Me despedi e fui embora, me sentindo confuso sobre as razões que teriam levado aquela senhora a querer me vender um ingresso para assistir ao filme mas não ter me convidado para assistir ao culto. Afinal, quais são as prioridades dessa igreja?
A Igreja Católica não fez campanha para promover o filme sobre a vida da Irmã Dulce, que é uma produção modesta e belíssima. A Comunidade Espírita não obrigou seus fiéis a assistirem em 2010 ao filme ‘Chico Xavier’, que foi um sucesso legítimo de público e crítica. A Igreja Adventista do Sétimo Dia não vendeu ingressos em seus templos para que seus membros assistissem ao excelente e premiado ‘Até o Último Homem’, que inclusive foi indicado ao Oscar de Melhor Filme em 2017. E nenhuma delas prometeu bênçãos para quem fosse e levasse várias pessoas junto.
Sabe por que essas religiões não agiram dessa forma? A resposta é muito simples: elas não visam o lucro. Ao contrário da Igreja Universal do Reino de Deus, elas visam a edificação do pecador através da mensagem pregada e exposta na tela, não a autopromoção de um charlatão que se vende como representante de Deus. Como já dizia o sábio Salomão (o mesmo que teve uma réplica do seu templo erguida como ponto turístico onde só se entra comprando ingresso), tudo se resume a vaidade.
SOBRE O SUCESSO FABRICADO
Os astros das novelas e os jornalistas da rede Record foram obrigados a comparecer na pré estreia do filme (leia mais aqui), e agora muitos cinemas tem suas salas ocupadas com sessões de ingressos esgotados para essa produção, sendo que na realidade a sala conta com meia dúzia de pessoas. Há relatos de “salas lotadas” com apenas três pessoas. Três! Para 'Os Dez Mandamentos’, me ofereceram o ingresso de graça na porta do cinema, e alguns conhecidos e familiares agora disseram passar pela mesma situação com o longa autobiográfico. Porém, a abordagem dos fiéis que distribuem o ingresso está mais cautelosa, ao ponto de apresentarem o filme como uma história de superação do bullying e a luta de uma família. Ingressos comprados pelas igrejas e distribuídos sem custo para a população, que provam que nem de graça o povo quer ver a história desse cara. Poderia até ser que na primeira semana tivesse dado algum público (os membros da Universal), mas depois disso o filme não se sustentaria em cartaz se não fosse pelo exercício de Macedo em querer provar, Deus sabe para quem, que o filme dele é o que mais vendeu ingressos na história do cinema nacional.
Se o “bispo” quer viver de título e ter um filme que de sucesso de bilheteria só tem isso, então só resta ter paciência. Deixe ele ficar iludindo a si mesmo, afinal, ele mesmo não passa de um crente de título. Só resta esperar que se ele quiser trapacear e usar de mentiras para obter suas vantagens e fazer seu nome, que limite seu trabalho desonesto às paredes de suas igrejas e não se meta com o cinema.
No fim das contas, 'Nada a Perder' pode até ser um sucesso de bilheteria (ilegítimo, bem verdade), mas sucesso de público certamente não é. Salas vazias com sessões em excesso comprovam que a exibição do filme é comprada. A pergunta é: com que dinheiro? Da emissora? Dos fiéis da igreja? Ou será que o excelentíssimo exemplo de humildade que o senhor Edir Macedo é teve que penhorar uma de suas mansões para fazer seu filme ganhar nome? Os meios da trapaça, queridos, só os trapaceiros devem saber de verdade.
A verdade lamentável que tenho a dizer é que se Deus for mesmo esse mercenário que o “bispo” Edir Macedo me leva a crer que Ele é, então prefiro a perdição do inferno. O Deus que eu aprendi a amar quando era criança é um cara super gente boa, membro do povão e amigo da galera, que ajuda os necessitados ao invés de tirar o sustento deles.
Enquanto o filme do “bispo” fica em cartaz, outros títulos bem melhores e infinitamente mais úteis, como o excelente gerador de debates 'Aos Teus Olhos’ - que infelizmente ainda não vi devido ao excesso de salas com 'Nada a Perder’ -, fica sem exibição por aqui. Perde o cinéfilo, perde a indústria, perde a cultura, perde o cinema de verdade.
A FARSA DO FILME DE EDIR MACEDO
Normalmente não gastaria meu tempo falando de alguém como o autointitulado bispo Edir Macedo, mas a situação de certo modo me obriga. Hoje vou falar sobre a trapaça que ele cometeu dentro da indústria do cinema e de como isso atrapalha o mercado como um todo.
Em tempo, uso aqui o termo “trapaça” porque “ilegal” infelizmente não pode ser aplicado, por mais mesquinha que seja a situação (não há leis que proíbam essa ação, mas isso não significa que ela seja correta). O que quero expor nesse artigo é a minha indignação quanto a desonestidade de uma figura pública que usa meios nada cristãos com o argumento da fé, já tendo levado pessoas economicamente vulneráveis a entregar suas casas e carros sob a jura de uma recompensa divina, e que agora promete, novamente, bênçãos descendo dos céus sobre a cabeça de quem for assistir ao seu filme no cinema.
Antes de prosseguir, devo deixar claro que não é minha intenção ofender aos fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus com essa postagem, e nem tampouco aos milhares de trabalhadores diretos e indiretos da emissora Record de televisão. Estou falando exclusivamente sobre a conduta do homem que chefia ambas as instituições e das coisas que ele obriga e incentiva aqueles que o seguem - empregados ou fiéis de igreja - a fazer.
COMO FUNCIONA A INDÚSTRIA DO CINEMA
A indústria do cinema é um celeiro de arte. Algumas obras são compreendidas e/ou bem aceitas, enquanto outras não. Todavia, o que ninguém contesta no cinema é a imensa variedade de gêneros que existe, dando ao pagante a opção de investir seu dinheiro comprando o ingresso do filme que melhor lhe encha os olhos (por isso milhões são gastos em marketing massivo, para promover o filme a blockbuster.) A lotação das salas de cinema é determinante para o tempo que o filme permanecerá em cartaz e também ao número de salas em que ele será exibido, e esse mesmo critério dita quantas sessões cada sala terá (podemos ver quatro filmes diferentes em uma mesma sala em um único dia, por exemplo).
Logo, se um filme não faz sucesso quando é lançado, ele não dura muito no cinema. E é aí que entra em debate o filme 'Nada a Perder’, cinebiografia de Macedo, que tem como subtítulo um sensacionalista “Contra tudo. Por todos.” Afinal, contra tudo o quê? E por quem exatamente? Porque a mim ele não representa, e até hoje não fez nada que influenciasse positivamente a minha vida. Só pelo cartaz já é visível que o filme superestima a si mesmo, glorificando a figura de um presidiário que lê a Bíblia com a pompa de um mártir.
'Nada a Perder’ começou sua pré-venda seis semanas antes de estrear, e já tinha garantidas três semanas de exibição nos principais shoppings da região, sendo que para essas três semanas estavam reservadas três salas em cada complexo, e todas com horários integrais. Sessões o dia todo, de um filme que, quando colocado ao lado de 'Jogador N°1’ de Steven Spielberg, não é nada. E por ironia, 'Jogador N°1’ está saindo de cartaz após fazer milhões e lotar várias salas em todo o país, mas 'Nada a Perder' permanece em cartaz em múltiplos horários. Mano do céu, tinha sessão desse filme até às nove da manhã! Nove da manhã! E cinemas nem abrem de manhã!
O problema que aponto aqui é o uso desleal de Macedo, que tem como arma seus próprios recursos (dinheiro doado por cristãos fiéis a Deus, enganados pelas promessas desprovidas de fundamentos bíblicos) em uso para tornar seu filme um blockbuster. Imaginem o seguinte cenário: eu, que vos falo, escrevo um livro; mil exemplares do meu livro são impressos na primeira tiragem, e desse milhar eu compro novecentos. Após tamanha venda, a editora lança mais cinco mil exemplares no mercado, e desses eu compro mais quatro mil. Em seguida, são impressos dez mil novas cópias do meu livro, e eu compro nove mil. Agora eu pergunto a você: o meu livro é um sucesso genuíno ou o fato de ele configurar na lista de mais vendidos não passa de uma farsa criada por mim? As pessoas compraram e leram o que eu escrevi ou o “sucesso” desse livro é na verdade fabricado pelo meu ego, já que tenho dinheiro para comprar meu próprio produto e quero ver o meu nome no topo da lista de mais vendidos?
Ter uma obra no topo faz parecer um sucesso, não é mesmo? Pois é, só parece.
Acontece que a ilustração do livro que citei acima é exatamente o que o “bispo” fez.
Edir Macedo pode até tirar onda, dizendo que 'Os Dez Mandamentos’ é o filme nacional de maior bilheteria de todos os tempos, mas não é nem nunca será o dono do maior público e nem um sucesso verdadeiro, nem o mais rentável, já que a Igreja Universal, a mando do próprio Macedo, comprou os ingressos e passou a distribuí-los gratuitamente após o fiasco nas vendas ao público. E agora, querendo ter seu ego acariciado mais uma vez, ele faz o mesmo com seu filme autobiográfico.
Aí entramos nos méritos da igreja. Macedo induz sua congregação a ir assistir ao filme, quase como uma imposição. O problema é que agora, além de prometer o retorno financeiro em dobro do dízimo entregue, o recebimento equivalente ao dízimo antecipado, criar um “parque temático” de Deus (a réplica do Templo de Salomão) e vender por quantias de três dígitos produtos ungidos que custam cinquenta centavos quando comprados em atacado, o cara me vem com o discurso de que os fiéis que forem assistir sua autobiografia no cinema terão algum crédito com Deus e receberão uma benção especial que será dada na sessão só para quem estiver na sala. E mais! Se quiser receber a bênção mais de uma vez é só ir várias vezes assistir, pois para cada sessão há uma benção diferente e especial. Quer saber como eu sei disso? Eu já explico.
O CARTAZ NA IGREJA
Não gostaria de me ater aqui a debater as mentiras pregadas nas igrejas, que vendem a benevolência divina como se bênçãos fossem algo que se compram em um mercado e templos fossem shoppings (acho que todos se lembram do episódio em que Cristo expulsou esse tipinho de gente de dentro da casa de Deus, relatado no segundo capítulo do livro de João). Entretanto, sou obrigado a tocar em um ponto em particular. Há algumas semanas, bem antes do lançamento do filme, estava eu andando pela rua principal do meu bairro e passei em frente a uma filial da empresa (ops...) da igreja do Edir Macedo. Ao invés de ter algum cartaz pregando as boas novas da salvação, ou algum dizer edificante que atraia o indivíduo comum andante a refletir sobre Deus, estava colado na parede, bem na entrada da igreja, um pôster do filme ‘Nada a Perder’, que viria a estrear nos cinemas em 29 de Março de 2018. Parei um instante e analisei o cartaz, ainda tentando digerir o fato de o homem estar veiculando seu filme (que não é um épico bíblico), cuja finalidade é vender a própria imagem em uma versão “beatificada”, na porta de uma igreja que deveria pregar a presença divina. Foi então que fui surpreendido por uma senhora com um sorriso simpático.
Ela me desejou boa noite e perguntou se eu era repórter, e após eu negar ela perguntou por que eu estava interessado no filme. Conversei rapidamente com ela, explicando educadamente minha curiosidade, enquanto o culto acontecia dentro do templo. E ela me perguntou se eu não gostaria de comprar um ingresso para ir assistir ao filme, com o “preço simbólico” (palavras dela) de apenas R$10,00. Agradeci a oferta e recusei, mas pedi para tirar uma foto do cartaz. Ela permitiu e ainda me ofereceu um jornal, o Folha Universal, que trazia no verso a mesma propaganda que estava colada na parede. Me despedi e fui embora, me sentindo confuso sobre as razões que teriam levado aquela senhora a querer me vender um ingresso para assistir ao filme mas não ter me convidado para assistir ao culto. Afinal, quais são as prioridades dessa igreja?
A Igreja Católica não fez campanha para promover o filme sobre a vida da Irmã Dulce, que é uma produção modesta e belíssima. A Comunidade Espírita não obrigou seus fiéis a assistirem em 2010 ao filme ‘Chico Xavier’, que foi um sucesso legítimo de público e crítica. A Igreja Adventista do Sétimo Dia não vendeu ingressos em seus templos para que seus membros assistissem ao excelente e premiado ‘Até o Último Homem’, que inclusive foi indicado ao Oscar de Melhor Filme em 2017. E nenhuma delas prometeu bênçãos para quem fosse e levasse várias pessoas junto.
Sabe por que essas religiões não agiram dessa forma? A resposta é muito simples: elas não visam o lucro. Ao contrário da Igreja Universal do Reino de Deus, elas visam a edificação do pecador através da mensagem pregada e exposta na tela, não a autopromoção de um charlatão que se vende como representante de Deus. Como já dizia o sábio Salomão (o mesmo que teve uma réplica do seu templo erguida como ponto turístico onde só se entra comprando ingresso), tudo se resume a vaidade.
SOBRE O SUCESSO FABRICADO
Os astros das novelas e os jornalistas da rede Record foram obrigados a comparecer na pré estreia do filme (leia mais aqui), e agora muitos cinemas tem suas salas ocupadas com sessões de ingressos esgotados para essa produção, sendo que na realidade a sala conta com meia dúzia de pessoas. Há relatos de “salas lotadas” com apenas três pessoas. Três! Para 'Os Dez Mandamentos’, me ofereceram o ingresso de graça na porta do cinema, e alguns conhecidos e familiares agora disseram passar pela mesma situação com o longa autobiográfico. Porém, a abordagem dos fiéis que distribuem o ingresso está mais cautelosa, ao ponto de apresentarem o filme como uma história de superação do bullying e a luta de uma família. Ingressos comprados pelas igrejas e distribuídos sem custo para a população, que provam que nem de graça o povo quer ver a história desse cara. Poderia até ser que na primeira semana tivesse dado algum público (os membros da Universal), mas depois disso o filme não se sustentaria em cartaz se não fosse pelo exercício de Macedo em querer provar, Deus sabe para quem, que o filme dele é o que mais vendeu ingressos na história do cinema nacional.
Se o “bispo” quer viver de título e ter um filme que de sucesso de bilheteria só tem isso, então só resta ter paciência. Deixe ele ficar iludindo a si mesmo, afinal, ele mesmo não passa de um crente de título. Só resta esperar que se ele quiser trapacear e usar de mentiras para obter suas vantagens e fazer seu nome, que limite seu trabalho desonesto às paredes de suas igrejas e não se meta com o cinema.
No fim das contas, 'Nada a Perder' pode até ser um sucesso de bilheteria (ilegítimo, bem verdade), mas sucesso de público certamente não é. Salas vazias com sessões em excesso comprovam que a exibição do filme é comprada. A pergunta é: com que dinheiro? Da emissora? Dos fiéis da igreja? Ou será que o excelentíssimo exemplo de humildade que o senhor Edir Macedo é teve que penhorar uma de suas mansões para fazer seu filme ganhar nome? Os meios da trapaça, queridos, só os trapaceiros devem saber de verdade.
A verdade lamentável que tenho a dizer é que se Deus for mesmo esse mercenário que o “bispo” Edir Macedo me leva a crer que Ele é, então prefiro a perdição do inferno. O Deus que eu aprendi a amar quando era criança é um cara super gente boa, membro do povão e amigo da galera, que ajuda os necessitados ao invés de tirar o sustento deles.
Enquanto o filme do “bispo” fica em cartaz, outros títulos bem melhores e infinitamente mais úteis, como o excelente gerador de debates 'Aos Teus Olhos’ - que infelizmente ainda não vi devido ao excesso de salas com 'Nada a Perder’ -, fica sem exibição por aqui. Perde o cinéfilo, perde a indústria, perde a cultura, perde o cinema de verdade.
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