PiTacO do PapO - 'Han Solo: Uma História Star Wars' | 2018
NOTA 7.5
O filho desgarrado de uma franquia bilionária
Por Vinícius Martins @cinemarcante
Algumas produções passam por tantos problemas nos bastidores que o resultado final acaba sofrendo sequelas notáveis. Filmes como ‘Anjos e Demônios’, de 2009, que teve uma troca de roteiristas devido a greve da categoria que ocorreu no meio das filmagens; ‘Chatô: O Rei do Brasil’, que teve questões orçamentárias e jurídicas que atrasaram o filme em anos, e ‘Homem-Formiga’, que foi vítima, assim como ‘Han Solo: Uma História Star Wars’, da divergência do estúdio com o diretor que iniciou o projeto (os diretores, no caso de Solo), são apenas alguns exemplos. Após um período já adiantado da produção, Ron Howard assumiu o posto anteriormente ocupado por Phil Lord e Chris Miller (que no longa são creditados como diretores executivos) em um filme que já trazia um estilo próprio e a assinatura da dupla que ficou famosa após comandar ‘Uma Aventura Lego’ em 2014.
O problema aqui é que Howard é um ótimo diretor de dramas e suspenses, mas não tem muito tato para a ação. É visível a diferença entre a construção do excelente ‘Uma Mente Brilhante’, vencedor do Oscar em 2002, e da aventura mediana ‘No Coração do Mar’, lançado em dezembro de 2015. Alguns de seus dramas notáveis, como ‘Rush: No Limite da Emoção’, de 2013, e ‘Frost/Nixon’, de 2008, trazem uma abordagem mais íntima na maneira como o diretor conta sua história - e esse mesmo aspecto de filmagem pode ser visto nas melhores cenas de ‘Han Solo’, que são justamente aquelas em que a interação humana se faz valer nos bons (e poucos) diálogos que o filme apresenta; não que a ação seja de todo ruim nesse filme, mas, convenhamos, não é o ponto mais forte.
Lawrence Kasdan, que roteirizou outros filmes da franquia Star Wars e o primeiro Indiana Jones, agora escreveu o roteiro de ‘Han Solo’ ao lado do filho, Jonathan Kasdan. O maior defeito nesse novo trabalho de Kasdan está nas repetições excessivas de questões que não acrescentam em nada nem à franquia como um todo e nem ao andamento do próprio filme em si. Frases como ‘não confie em ninguém’ e enxurradas de referências com o intuito de fazer ligações gratuitas com os filmes clássicos tornam cenas que deveriam ser dinâmicas em expressões cafonas e enfadonhas de um apelo desnatural à nostalgia.
Desde que foi anunciado, ‘Han Solo: Uma História Star Wars’ soou como apenas um filme desnecessário, produzido com a finalidade de fazer dinheiro sob o peso do manto da franquia criada por George Lucas. Agora, depois de lançado, confirma-se que ele é basicamente isso mesmo. A produção se propõe a explicar coisas que ninguém nunca se preocupou em saber porque simplesmente não eram relevantes. Ninguém se importava em como Han e Chewie se conheceram e boa parte do charme do relacionamento dos dois se dava a esse e outros “mistérios” acerca do passado de Solo. O mistério, que sempre foi um dos três traços mais marcantes do personagem originalmente interpretado por Harrison Ford, agora ganha uma face menos atraente e mais definida - como uma pessoa bonita que você vê de longe mas que, ao se aproximar, percebe as imperfeições em seus traços.
O filme não é o pior da franquia Star Wars. Dá para dizer facilmente que ‘Ataque dos Clones’ é bem mais tedioso que esse novo spin-off, se formos colocá-los em uma balança cujo peso é a vontade do público de que o filme termine logo. Porém, isso não significa que a produção não tenha seus pontos altos. Os personagens novos, aqui são bem mais desenvolvidos do que a maioria dos da equipe kamikaze de ‘Rogue One’ (incluindo a protagonista Jyn Erso, vivida por Felicity Jones). O roteiro, apesar de cretino e ingrato em muitos momentos, não tira o mérito do esforço de Alden ehrenreich em dar personalidade própria à sua versão do contrabandista que dá nome ao filme. Tal roteiro também não faz um desfavor aos personagens coadjuvantes, apesar de se empenhar em ter diálogos meio enfadonhos e quase infantis. Emilia Clarke, Woody Harrelson, e Paul Bettany estão decentes em seus papéis, e todos eles conseguiram transpor as camadas de seus personagens. Donald Glover, que interpreta o canastrão Lando, velho conhecido dos fãs da saga, está bem no papel mas pode decepcionar quem for mais exigente - não por sua performance, mas pela expectativa gerada em torno dela.
A mudança de diretores não destoa tanto do tom como ocorreu no lamentável ‘Liga da Justiça’, mas é evidente que as rédeas estavam o tempo todo nas mãos dos produtores. A assinatura sutil de Howard quase se perdeu, podendo ser vista apenas suavemente em closes e expressões mínimas da direção de atores, que é a especialidade do diretor sessentão. O longa diverte e cativa pela familiaridade, mas não emociona e nem se faz importante dentro da imensidão do universo da franquia. Com as categorias técnicas bem trabalhadas, o filme tem destaque aos efeitos e em especial a trilha sonora composta por John Powell (que é um dos melhores compositores de trilhas de todos os tempos).
Sendo o filme menos útil já feito de Star Wars (não consideremos ‘Caravana da Coragem’ e ‘A Batalha de Endor’ como cânone), ‘Han Solo: Uma História Star Wars’ é quase como um filho bastardo. Resta saber se vingará nas bilheterias para que a suposta sequência saia do papel, pois o gancho para ela já está lá. Falaremos sobre esse gancho e o problema que ele representa na linha do tempo da saga na próxima semana. Enquanto isso, assista ao filme e tente descobrir a que cena estamos nos referindo.
Entre adereços de retrovisor em forma de dados ou em tiros que são efetuados primeiro, a figura de Han Solo agora terá que ser retrabalhada no imaginário daqueles que se dispuserem a aceitar o filme solo do “herói” e abraçá-lo. Querido ou não, o filme está aí e não se pode desver o que foi visto, para o bem ou para o mal.
Vale Ver !
O filho desgarrado de uma franquia bilionária
Por Vinícius Martins @cinemarcante
Algumas produções passam por tantos problemas nos bastidores que o resultado final acaba sofrendo sequelas notáveis. Filmes como ‘Anjos e Demônios’, de 2009, que teve uma troca de roteiristas devido a greve da categoria que ocorreu no meio das filmagens; ‘Chatô: O Rei do Brasil’, que teve questões orçamentárias e jurídicas que atrasaram o filme em anos, e ‘Homem-Formiga’, que foi vítima, assim como ‘Han Solo: Uma História Star Wars’, da divergência do estúdio com o diretor que iniciou o projeto (os diretores, no caso de Solo), são apenas alguns exemplos. Após um período já adiantado da produção, Ron Howard assumiu o posto anteriormente ocupado por Phil Lord e Chris Miller (que no longa são creditados como diretores executivos) em um filme que já trazia um estilo próprio e a assinatura da dupla que ficou famosa após comandar ‘Uma Aventura Lego’ em 2014.
O problema aqui é que Howard é um ótimo diretor de dramas e suspenses, mas não tem muito tato para a ação. É visível a diferença entre a construção do excelente ‘Uma Mente Brilhante’, vencedor do Oscar em 2002, e da aventura mediana ‘No Coração do Mar’, lançado em dezembro de 2015. Alguns de seus dramas notáveis, como ‘Rush: No Limite da Emoção’, de 2013, e ‘Frost/Nixon’, de 2008, trazem uma abordagem mais íntima na maneira como o diretor conta sua história - e esse mesmo aspecto de filmagem pode ser visto nas melhores cenas de ‘Han Solo’, que são justamente aquelas em que a interação humana se faz valer nos bons (e poucos) diálogos que o filme apresenta; não que a ação seja de todo ruim nesse filme, mas, convenhamos, não é o ponto mais forte.
Lawrence Kasdan, que roteirizou outros filmes da franquia Star Wars e o primeiro Indiana Jones, agora escreveu o roteiro de ‘Han Solo’ ao lado do filho, Jonathan Kasdan. O maior defeito nesse novo trabalho de Kasdan está nas repetições excessivas de questões que não acrescentam em nada nem à franquia como um todo e nem ao andamento do próprio filme em si. Frases como ‘não confie em ninguém’ e enxurradas de referências com o intuito de fazer ligações gratuitas com os filmes clássicos tornam cenas que deveriam ser dinâmicas em expressões cafonas e enfadonhas de um apelo desnatural à nostalgia.
Desde que foi anunciado, ‘Han Solo: Uma História Star Wars’ soou como apenas um filme desnecessário, produzido com a finalidade de fazer dinheiro sob o peso do manto da franquia criada por George Lucas. Agora, depois de lançado, confirma-se que ele é basicamente isso mesmo. A produção se propõe a explicar coisas que ninguém nunca se preocupou em saber porque simplesmente não eram relevantes. Ninguém se importava em como Han e Chewie se conheceram e boa parte do charme do relacionamento dos dois se dava a esse e outros “mistérios” acerca do passado de Solo. O mistério, que sempre foi um dos três traços mais marcantes do personagem originalmente interpretado por Harrison Ford, agora ganha uma face menos atraente e mais definida - como uma pessoa bonita que você vê de longe mas que, ao se aproximar, percebe as imperfeições em seus traços.
O filme não é o pior da franquia Star Wars. Dá para dizer facilmente que ‘Ataque dos Clones’ é bem mais tedioso que esse novo spin-off, se formos colocá-los em uma balança cujo peso é a vontade do público de que o filme termine logo. Porém, isso não significa que a produção não tenha seus pontos altos. Os personagens novos, aqui são bem mais desenvolvidos do que a maioria dos da equipe kamikaze de ‘Rogue One’ (incluindo a protagonista Jyn Erso, vivida por Felicity Jones). O roteiro, apesar de cretino e ingrato em muitos momentos, não tira o mérito do esforço de Alden ehrenreich em dar personalidade própria à sua versão do contrabandista que dá nome ao filme. Tal roteiro também não faz um desfavor aos personagens coadjuvantes, apesar de se empenhar em ter diálogos meio enfadonhos e quase infantis. Emilia Clarke, Woody Harrelson, e Paul Bettany estão decentes em seus papéis, e todos eles conseguiram transpor as camadas de seus personagens. Donald Glover, que interpreta o canastrão Lando, velho conhecido dos fãs da saga, está bem no papel mas pode decepcionar quem for mais exigente - não por sua performance, mas pela expectativa gerada em torno dela.
A mudança de diretores não destoa tanto do tom como ocorreu no lamentável ‘Liga da Justiça’, mas é evidente que as rédeas estavam o tempo todo nas mãos dos produtores. A assinatura sutil de Howard quase se perdeu, podendo ser vista apenas suavemente em closes e expressões mínimas da direção de atores, que é a especialidade do diretor sessentão. O longa diverte e cativa pela familiaridade, mas não emociona e nem se faz importante dentro da imensidão do universo da franquia. Com as categorias técnicas bem trabalhadas, o filme tem destaque aos efeitos e em especial a trilha sonora composta por John Powell (que é um dos melhores compositores de trilhas de todos os tempos).
Sendo o filme menos útil já feito de Star Wars (não consideremos ‘Caravana da Coragem’ e ‘A Batalha de Endor’ como cânone), ‘Han Solo: Uma História Star Wars’ é quase como um filho bastardo. Resta saber se vingará nas bilheterias para que a suposta sequência saia do papel, pois o gancho para ela já está lá. Falaremos sobre esse gancho e o problema que ele representa na linha do tempo da saga na próxima semana. Enquanto isso, assista ao filme e tente descobrir a que cena estamos nos referindo.
Entre adereços de retrovisor em forma de dados ou em tiros que são efetuados primeiro, a figura de Han Solo agora terá que ser retrabalhada no imaginário daqueles que se dispuserem a aceitar o filme solo do “herói” e abraçá-lo. Querido ou não, o filme está aí e não se pode desver o que foi visto, para o bem ou para o mal.
Vale Ver !
DIREÇÃO
- Ron Howard
EQUIPE TÉCNICA
Roteiro: George Lucas, Jon Kasdan, Lawrence Kasdan
Produção: Allison Shearmur, Kathleen Kennedy, Kiri Hart, Simon Emanuel, Susan Towner, Will Allegra
Fotografia: Bradford Young
Trilha Sonora: John Powell
Estúdio: Allison Shearmur Productions, Imagine Entertainment, Lucasfilm, Walt Disney Pictures
Montador: Chris Dickens, Pietro Scalia
Distribuidora: Disney
ELENCO
Alden Ehrenreich, Clint Howard, Deepak Anand, Donald Glover, Emilia Clarke, Harley Durst, Ian Kenny, Izzy Bayley-King, Jackson Kai, Jo Wheatley, Jon Favreau, Joonas Suotamo, Lily Newmark, Paul Bettany, Phoebe Waller-Bridge, Ray Whelan, Richard Dixon, Sarah-Stephanie, Slim Khezri, Thandie Newton, Warwick Davis, Woody Harrelson
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