Adsense Cabeçalho

Especial : Filmes Políticos - Parte 2 | O Sistema

Por Vinícius Martins @cinemarcante


Chegamos ao dia da segunda parte do nosso especial sobre política, e o que será abordado hoje é a interação dos políticos e da sociedade com o sistema e a relação entre o sistema e aqueles que os confrontam.

Esse tema talvez seja o mais importante para um dia como hoje: entender que o endeusamento de uma figura política não pode ser tratado como são, uma vez que nenhum messias vai tirar o país da cova onde se encontra enquanto o nosso sistema e a nossa compreensão de nós mesmos como nação não mudarem (e com "messias" não quis alfinetar o candidato Jair Messias Bolsonaro ou qualquer um de seus eleitores).

Quero registrar que me abstenho de minhas visões políticas para escrever este artigo, uma vez que a imparcialidade é e sempre será a melhor maneira de lidar com tantas visões diferentes sobre o tema e traçar uma rota para o que é realmente importante. Caso você, leitor e eleitor, ache que algum comentário ou comparação feita por mim neste ou nos outros especiais de política seja um discurso contra o seu candidato, não se ofenda; estou contra todos igualmente, e votarei em branco/nulo para presidente. Estou falando isso para deixar claro que não tenho um candidato favorito e se ataco algum não significa que estou defendendo o outro. A ideia aqui é criar consciência através do cinema, e se o seu candidato se enquadra na descrição de algum corrupto ou tirano dos filmes citados, talvez seja bom repensar seu voto nele.

Para dar início ao especial de hoje, vamos para uma das cidades mais corrompidas da ficção: Sin City!


➽Sin City - A Cidade do Pecado (2005)

O sistema dos favorecimentos

Se é para apontar a corrupção no sistema, o filme dirigido pela trindade Frank Miller, Robert Rodriguez e Quentin Tarantino é uma das obras mais completas possíveis. Baseado na graphic novel de Miller, o filme apresenta várias histórias conectadas sem ser necessariamente continuidades umas das outras. Há corrupção na polícia, na Igreja, nas gangues e, obviamente, na política. Uma história acrescenta detalhes a outra e a criação desse universo fedido se faz um espetáculo de horrores e violência. A fotografia, que destaca traços coloridos em meio ao breu preto e branco, dá sofisticação e identidade à produção. O uso das escalas de cinza faz figuras como o Assassino Amarelo parecerem ainda mais desprezíveis, como uma mancha borrada em um quadro bonito; e essa mesma impressão fica na comparação das pessoas de bem que o longa apresenta e toda a corrupção que existe ao redor delas.



Há o psicopata mimado cujo pai é um político (o que lhe dá carta branca para fazer a merda que der na telha), o policial que atira no parceiro pelas costas, o maníaco protegido por um cardeal, a corrupção entre prostitutas e os policiais que se beneficiam da autoridade que se tem ao portar um distintivo. Seguindo o ditado “Quer conhecer um homem como ele realmente é? Dê poder a ele.”, o longa é um primor em seu trabalho de exposição de todas as faces da moeda; não é a toa que 'Sin City' é uma obra prima em sua totalidade, tanto nas HQs quanto nos cinemas.

A palavra que melhor define o filme é: Traição.


➽Star Wars: A Vingança dos Sith (2005)

O sistema da ruína


'Star Wars' parece ser, visto de longe, uma aventura intergaláctica de luta entre o bem e o mal, e só. No entanto, engana-se quem não dá a devida atenção ao teor político que a saga criada por George Lucas possui, uma vez que o foco está em derrubar um império e restituir a república. De todos os dez filmes lançados até hoje, o que mais se empenha em apresentar as questões políticas da galáxia é o terceiro episódio da cronologia, que foi o sexto filme a ser lançado. A esperada produção teve como prato principal a criação de Darth Vader como o ícone monstruoso que se tornou, e muitos se atém somente a isso - mas o que o filme revela é um cenário conturbado no senado galáctico, onde um golpe está prestes a acontecer.



O que se nota aqui (alerta de spoiler) é que para que o tal golpe ocorra, há a execução dos que poderiam evitar o feito antes de sua consumação: os Jedi. Tidos como os agentes da Força e, consequentemente, representantes da paz, os Jedi são eliminados um a um, e os militares (os queridos e caricatos Stormtroopers) passam a fiscalizar toda e qualquer ação que possa vir a ser uma ameaça a esse novo regime.

Não quero levantar polêmica sobre o caso de Dilma Rousseff, afirmando se foi ou não foi golpe de estado (para mim há muitas formas de "golpe", mas não vem ao caso), mas sim comentar a fragilidade de um sistema dividido. Quando o desentendimento reina e cada um busca o bem individual acima do coletivo, tudo tende a desmoronar. No caso de 'Star Wars' o senador Palpatine usou a risca o conceito de dividir para conquistar, plantando a semente da discórdia entre seus colegas e inserindo dúvidas na cabeça do jovem Anakin Skywalker. No cenário real, alguém com essa mesma estratégia pode levar uma nação ao pó; tudo o que se precisa é de um bom argumento. 

A palavra que melhor define o filme é: Queda.


➽Jogos Vorazes (2012)

O sistema da coação

A premissa política de 'Jogos Vorazes' é bastante simples: a promoção de um massacre anual erguido como memorial de uma guerra passada. A fim de não permitir que a população de seus doze distritos se esqueça jamais da derrota e tente uma nova rebelião contra a capital, o presidente Snow coloca toda a Panem para assistir ao espetáculo sangrento de adolescentes matando uns aos outros até que um último sobreviva e alcance, assim, a glória. A história se passa em um futuro distópico, onde só resta uma nação unificada no mundo, mas seu conteúdo é tão atual quanto assombroso.



O sistema usado aqui é o totalitarismo, que se mantém através da pregação de uma teologia do medo, limitando o povo a se colocar sob a esfera da submissão para não ser aniquilado de uma vez por todas pela benevolente capital. Essa política de poda e exploração dos recursos dos distritos sem retorno me faz recordar uma frase de Montesquieu que diz o seguinte: "Encontrou-se, em boa política, o segredo de fazer morrer de fome aqueles que, cultivando a terra, fazem viver os outros". A política aqui não é boa; ela é cruel e perversa, como muitas outras são, mas passam despercebidas por estarem com uma máscara de boas intenções. Hoje vivemos o regime de Panem, mas não precisamos de arenas. Nossos jovens morrem nas ruas mesmo, nossa população passa fome e nossos sonhos são esmurrados por uma realidade que não melhora ao ponto de favorecer o povo. Podemos ser aparentemente diferentes daquele futuro, mas em essência estamos, lamentavelmente, iguais.

A palavra que melhor define o filme é: Distração.


➽Harry Potter e a Ordem da Fênix (2007)

O sistema da paranoia


Sim, meus queridos, há política em 'Harry Potter'. O quinto volume da série é o que mais aborda política, dentre uma variedade absurdamente grande de assuntos, apresentando a paranoia de Cornélio Fudge, Primeiro Ministro Mágico (“primeiro” é o título do cargo, ele não foi o primeiro de fato; trata-se de um título de formalidade, como Primeiro Ministro Britânico), que acredita estar prestes a sofrer um golpe de estado por parte do seu bom e velho amigo Alvo Dumbledore, que na ocasião era diretor da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. O Primeiro Ministro acredita que a insistência de Dumbledore na ideia de que Lorde Voldemort, o pior bruxo das trevas que já existiu, tenha retornado não passa de uma artimanha política para moldar sua ascensão ao poder e destituí-lo do cargo.



Além de Fudge, outra figura chama a atenção: Dolores Jane Umbridge. Se por um lado Umbridge venera a figura de Fudge, por outro ela é capaz de cometer atrocidades em nome dele sem que ele saiba; isso pode ser visto sem margem para dúvida quando ela abaixa o retrato do Primeiro Ministro na cena da tortura a Harry e à Armada de Dumbledore, onde ela afirma que “o que Cornélio não vê, Cornélio não sente”. Ao optar em seguir cegamente as afirmações de Fudge e empregar seus novos ideais rígidos, após se tornar diretora de Hogwarts, uma nova ditadura se instala na instituição. Isso gera a divisão entre o já conflituoso grupo de alunos e termina por produzir um quadro fascista onde antes havia respeito e diálogo.

A palavra que melhor define o filme é: Negação.


➽A Grande Ilusão (2006)

O sistema da manobra

Para quem não conhece ainda a versão clássica e o remake de 'A Grande Ilusão’, fica aqui um pedido: assista. Veja bem que não foi uma dica ou uma sugestão, mas sim um pedido. O mundo precisa assistir 'A Grande Ilusão’ antes de querer fazer qualquer debate sobre política. O clássico de 1949 venceu o Oscar de Melhor Filme, e é bem mais fácil falar dele do que do remake; todavia, hoje falo sobre o filme lançado em 2006, estrelado por Sean Penn com um elenco de apoio brilhante formado por Jude Law, Kate Winslet, Patricia Clarkson, James Gandolfini, Jackie Earle Haley, Mark Ruffalo e Anthony Hopkins. Há outros dois filmes sob esse mesmo título além dos já citados, sendo um francês de 1937 e outro de 2013 protagonizado por Kaya Scodelario - ambos nada tem a ver com este e o clássico.

O filme é um enorme debate sobre a corrupção do sistema e os arranjos políticos para maquiar intenções perversas. É aqui que se encontra uma das melhores cenas de queda de máscara da história do cinema, onde o candidato "patinho" percebe o esquema e o quebra ao meio. O que chama a atenção aqui é que essa estratégia é usada hoje nas eleições de forma descarada e poucos se dão conta disso. Acontece o seguinte: o partido do candidato que visa beneficiar os grandes empresários (vamos chamá-lo de Candidato 1) vê crescer a popularidade de um candidato do povão, em quem os pobres tendem a votar. Esse novo candidato ganha força e voz, de modo que a soma de seus votos se tornam uma ameaça ao eleger do Candidato 1. Para não dar margem para o erro, esse mesmo partido lança, através de uma aliança sob a legenda de outro partido, um outro candidato humilde e de fácil empatia com a massa a ser manobrada: os trabalhadores pobres do estado do Louisiana, nos EUA. A intenção era simples: com dois candidatos idealistas e do povo, os votos daqueles que não iriam votar no candidato 1 ficariam divididos, fazendo com que nenhum deles chegasse perto de ter o mesmo número de votos suficiente para impedir que se eleja o candidato 1.


Quando Willie Stark vê a podridão da corrupção que o cerca, descarrega sua indignação com a corrupção do governo e o culpa, por sua má administração, pela queda de uma escola em sua região. E Stark lava a alma, falando verdades que ninguém até então jamais tinha ousado falar, gerando um sentimento de unidade no povo e ganhando mais eleitores do que se poderia esperar. Não demorou para que o demagogo passasse com folga a frente dos demais candidatos, logo sendo eleito e tomando posse para cuidar do povo conforme havia prometido. Se o filme acabasse por aí já seria ótimo, mas a mesa vira e o homem bem intencionado que outrora cativava o povo com palavras de ordem revolucionária acaba sendo corrompido pelo sistema onde se insere. Willie Stark se torna um político tão desonesto quanto eram aqueles que ele criticou em sua campanha. E o caso fica tão sério que ele chega a sofrer um impeachment - ao qual responde mandando seus capachos investigarem a vida do denunciante a fim de encontrar algum podre e chantageá-lo.

A tragédia (não vou falar mais da trama para não entregar pontos de virada importantíssimos) é que essa mesma história se confunde facilmente com a do atual quadro político do Brasil. Talvez a mais pura dentre as pessoas, ao entrar no ramo político, se torne tão cruel e mesquinha quanto o velho Stark. Isso, meus queridos, aponta para algo ainda mais aterrador: não importa a quem elejamos, o país provavelmente continuará um poço de imundícies e corrupção. Enquanto não for mudado o nosso sistema, que defende os figurões e favorece políticos e seus protegidos, a política da impunidade continuará mandando e desmandando enquanto a classe trabalhadora sonha com o surgimento de um salvador que faça alguma real diferença nesse covil de ladrões.

A palavra que melhor define o filme é: Manipulação.

⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫⧫

Meu voto em ninguém será porque não me sinto representado e me recuso a ser cúmplice dessa barbárie. Mas quero convidar você, que já escolheu o seu candidato independente de quem seja, a questionar a si mesmo perguntando se é isso mesmo o que o país precisa agora. Não vote caso haja dúvida. Se o país der errado, você terá sua parcela de responsabilidade sobre o feito e não poderá reclamar depois se o vice que você mesmo elegeu tomar o poder. Voto consciente é, por enquanto, a sua maior arma contra o sistema. Use isso com sabedoria.

Nosso próximo especial faz jus ao título, então fique de olho aqui e em nossas mídias para não perder! E deixe seu comentário, todas as visões e opiniões são bem-vindas!



Nenhum comentário