PiTacO do PapO - 'Selvagem' | 2019
NOTA 7.5
Farrapo humano
Por Rogério Machado
'Selvagem', que ainda segue sem previsão de estreia oficial no Brasil, fez sua estreia no Festival de Cannes no ano passado e causou polêmica. Boa parte da audiência presente deixou a sala por conta das cenas de sexo e fetichismo ultra realistas propostas pela estreante Camille Vidal-Naquet. O longa, de temática LGBT, é muito mais do que uma história que discute sexo como modo de ganhar a vida.
Na trama Léo (Félix Maritaud) é um jovem de 22 anos que vende seu corpo nas ruas por um pouco de dinheiro. Os homens vêm e vão, e ele continua ali, esperando talvez por um amor, que parece se refletir na pessoa de Ahd (Eric Bernard) , um outro garoto de programa com quem divide espaço nas ruas. Ele não sabe o que o futuro vai trazer, mas pega a estrada à sua procura. Meio sem rumo e com muta inconsequência, mas segue mesmo assim, como se não se importasse com o que estivesse à frente, fosse bom ou ruim.
O filme ganha pelo realismo, pela verdade com que se aproxima desse mundo (ou submundo,como preferir). Léo perambula pelas ruas, procura sexo para ganhar os dias, principalmente para poder consumir em paz sua droga preferida: o crack. Visivelmente doente, ele não se importa com seu estado e visita uma médica sem a menor intenção de mudança. Nessa tomada, chama a atenção uma cena extremamente sensÃvel e comovente: no meio da consulta ele abraça firme a doutora, que sem pensar retribui o abraço. Léo buscava nas ruas o que nunca encontraria: aconchego e afeto. Aproveito para destacar o notório desempenho do jovem ator Félix Maritaud, sua entrega para dar veracidade à quela fatÃdica realidade é o que o longa tem de mais proeminente - seu desempenho inclusive lhe rendeu o Prêmio da Fundação Louis Roederer de Estrela em Ascensão, concedido pela Semana da CrÃtica no festival.
'Sauvage' (no original), usa basicamente o meio homossexual ao retratar a prostituição, mas isso é um mero detalhe. O longa de Vidal-Naquet quer mesmo é deixar à luz do dia a dura realidade desse meio, e como quem nele se aventura, tende a perder o sentido e o sentimento. O dia a dia faz deixar crescer uma carapaça que afasta qualquer possibilidade de aproximação de quem tem algo bom a oferecer. Um caminho sem volta? Sim, a pergunta fica no ar, mas a trilha para uma vida diferente também é mostrada. 'Sauvage' nos fala sobre uma alma perdida que já não sabe mais dar ou receber amor.
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