Especial : Grandes Mestres - O Detalhismo de David Fincher
Grandes Mestres, CapÃtulo 3
Antes de mais nada, é bom comunicar aos desavisados do rolê que não é legal confundir David Fincher com David Lynch. Ambos são excelentes diretores, cada um à sua maneira, e não saber distingui-los é um absurdo que beira a ofensa cinematográfica (ok, assumo que já troquei os nomes uma ou outra vez, mas logo fui pedindo perdão à padroeira dos cinéfilos pelo pecado cometido). Portanto, lembre-se: Lynch é o cara que fez ‘Duna’, ‘Twin Peaks’ e ‘O Homem Elefante’; e Fincher é o que tem os filmes mais recentes, como ‘Garota Exemplar’, ‘A Rede Social’ e ‘O Curioso Caso de Benjamin Button’.
Esclarecida a diferença entre nomes e obras, vamos agora nos aprofundar no método tão zeloso com que Fincher trata suas obras de arte (vulgo obras-primas do cinema).
UM HOMEM CHAMADO DAVID FINCHER
David Andrew Leo Fincher (Ou só Dave, pros Ãntimos) fez seu primeiro filme - não oficial, é claro - no ano 1970, usando a câmera de seus pais em uma brincadeira infantil. Naquela época, com apenas 8 anos de idade, David já começava a desenvolver seu talento nato para contar histórias usando os artifÃcios audiovisuais que, futuramente, o tornariam um dos melhores diretores de sua geração. Nascido em Denver, Colorado (EUA), no dia 28 de Agosto de 1962, David se maravilhou com a descoberta da carreira que queria seguir após assistir ao épico quinto episódio da franquia 'Star Wars' (na ocasião o segundo filme da trilogia, que hoje chamamos de “trilogia clássica”) chamado ‘O Império Contra-Ataca’. Após essa epifania, David conseguiu um “bico” na Industrial Light and Magic, a ILM, onde aprendeu diversos macetes da metodologia de apresentação para histórias no cinema e ainda trabalhou nas equipes de produção de ‘O Retorno de Jedi’, onde foi assistente de cameraman, e de ‘Indiana Jones e o Templo da Perdição’, onde foi fotógrafo matte.
Quis a vida, porém, que David Fincher seguisse para o campo da publicidade e se afastasse por um tempo do cinema - mas não da arte de filmar. Ele passou então a produzir e dirigir videoclipes para grandes artistas, tais como Madonna, George Michael, Aerosmith e Johnny Hates Jazz. Após o ano 1992, trabalhou também com Michael Jackson, The Rolling Stones, The Wallflowers e, mais recentemente, com Justin Timberlake e Jay-Z. Já que falamos de 1992, foi nesse ano que Fincher lançou nos cinemas o seu primeiro longa-metragem. Foi um trabalho exaustivo, segundo ele mesmo já afirmou em entrevistas, tanto pela a tratativa com o estúdio como também pela pressão de dar sequência a uma das sagas mais amadas e idolatradas da época. O filme era o controverso ‘Alien³’, cuja franquia teve anteriormente os nomes já consagrados de Ridley Scott e James Cameron nos cargos de direção. O filme foi amplamente criticado pelos fãs e pelos crÃticos de plantão, e aquilo quase derrubou Fincher de seu propósito apaixonado com a sétima arte.
Porém, após ficar abismado com o roteiro de Andrew Kevin Walker para 'Seven: Os Sete Crimes Capitais', Fincher aceitou retornar ao cargo de diretor mais uma vez, já que agora não teria que se adequar a um universo e poderia contar uma "história virgem" ao seu próprio modo. E a chance dada por ele ao cinema foi divinamente retribuÃda: 'Seven' se tornou um sucesso cultuado até hoje e ainda é tido como um dos melhores filmes do diretor nos rankings montados pelos fãs - só perdendo, geralmente, para o quarto filme de sua carreira; um filme do qual não podemos falar a respeito, para não quebrarmos sua primeira regra.
Em 1997, após 'Seven' ter um ótimo recebimento do público e extensos elogios da crÃtica especializada, Fincher dirigiu 'The Game' (que chegou ao Brasil sob o tÃtulo 'Vidas em Jogo'), estrelado por ninguém menos que Michael Douglas. Depois disso, em 1999, veio o tal filme dos quais não podemos falar a respeito, e que foi seguido por ‘O Quarto do Pânico’ (2002), ‘ZodÃaco’ (2007), ‘O Curioso Caso de Benjamin Button’ (2008), ‘A Rede Social’ (2010), ‘Millenium: Os Homens que não Amavam as Mulheres’ (2011) e ‘Garota Exemplar’ (2014) - Todos com uma qualidade absurdamente boa e uma perÃcia técnica avassaladora, que é o grande diferencial dos filmes do diretor norte-americano.
A TÉCNICA CIRÚRGICA DE FINCHER
David Fincher é um diretor atento aos detalhes. Ele cuida de seus filmes com o capricho de um pai que cuida de seu filho a quem tanto ama. Cada mÃnimo elemento de cena é analisado para inserir mensagens dentro de mensagens, e isso constrói o subliminarismo perfeccionista que é sua marca registrada. Quando você revê um filme de Fincher já sabendo do final, provavelmente percebe como você mesmo é vÃtima de sua própria desatenção; Fincher espalha pistas sobre o desfecho de seus filmes a todo instante, seja nas paletas de cores que compõem a ambientação dos cenários e figurinos como também na condução brilhantemente calculada da fotografia, que mostra ao espectador para onde ele deve olhar quando as armadilhas do roteiro estão apontando justamente para o lado contrário. São as pequenas coisas, os escritos nas entrelinhas em letras minúsculas, que tornam a atividade de rever os filmes de Fincher algo tão interessante e expressivo. Sempre há algo novo a ser visto, mesmo que o filme em questão esteja sendo assistido por você pela décima vez. Tem sempre algo que você pode ter deixado escapar e que depois pensa “como eu não vi isso antes?” e fica se perguntando como uma informação tão importante foi esfregada na sua cara e você não percebeu nas ocasiões anteriores em que viu a mesma coisa.
Fincher dirigindo Brad Pitt e Edward Norton em 'Clude da Luta' (1999) |
Abaixo estão as notas de seus filmes no IMDb:
1992: Alien³ | 6,4
1995: Seven - Os Sete Crimes Capitais | 8,6
1997: Vidas em Jogo | 7,8
1999: Clube da Luta | 8,8
2002: O Quarto do Pânico | 6,8
2007: ZodÃaco | 7,7
2008: O Curioso Caso de Benjamin Button | 7,8
2010: A Rede Social | 7,7
2011: Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres | 7,8
2014: Garota Exemplar | 8,1
Fincher também foi, além de diretor, o produtor executivo de seu décimo filme, ‘Garota Exemplar’. Foi também produtor executivo de ‘A Garota na Teia de Aranha’, que é uma sequência (in)direta de ‘Os Homens que não Amavam as Mulheres’, adaptação da série literária Millennium que Fincher dirigiu na versão hollywoodiana em 2011 e que chegou aos cinemas brasileiros em Janeiro de 2012. Além de seus trabalhos no cinema, Fincher também é um dos responsáveis pelas brilhantes séries ‘House of Cards’, que se encerrou há alguns meses, e ‘Mindhunter’, cuja segunda temporada chegou recentemente ao catálogo da Netflix. Essa segunda série citada, que é estrelada por Jhonattan Groof, é um colÃrio para qualquer amante de tramas bem costuradas e eu recomendo pessoalmente a todos, vale a pena conferir.
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