'Happy Old Year' mostra que o desapego pode ser uma faca de dois gumes | 2019
NOTA 9.0
Por Karina Massud @cinemassud
“As Quatro Verdades Nobres” são um dos pilares da filosofia budista: 1- O sofrimento existe e não pode ser ignorado; 2- A fonte do sofrimento é o apego excessivo e expectativas irreais; 3- Elimine o apego e você acaba com o sofrimento; 4 – Existe um caminho para eliminar o apego mas ele não é fácil. Preceitos simples mas extremamente complexos pois o apego nasce e morre conosco, apego a pessoas, memórias e objetos.
Objetos até são fáceis de deixar ir, já emoções e lembranças estão um nível acima na escala de iluminação budista. E não é diferente com Jean, a protagonista do filme tailandês “Happy Old Year”. Ela prega e pratica o desapego radical, nas roupas pretas e brancas muito simples, no corte de cabelo curto e também em sua casa que ela pretende transformar num escritório de arquitetura e decoração. Depois de voltar de uma temporada na Suécia, terra minimalista, ela resolve jogar fora tudo que não lhe “dê mais alegria”, não só velharias inúteis mas também sua história em fotos, objetos do ex-namorado e peças de amigos que não via há anos. Só que nesse processo quanto mais ela tenta se desprender do passado mais ela o traz à tona, Jean percebe então o quanto os magoou com sua ânsia de desapego e de se mostrar uma pedra de gelo sem sentimentos. Ao invés de se sentir leve e feliz o drama e angústia vão crescendo e os fantasmas saem loucamente para assombrá-la. A atriz e modelo tailandesa Chutimon Chuegcharoebsukying, do suspense “Bad Genius”, está extraordinária como a minimalista obcecada Jean, ela demonstra uma frieza calculada enervante mas que em momentos de solidão desaba, ela não é essa quase sociopata que quer parecer, ela tem muitos sentimentos que estão escondidinhos no meio do seu furacão interno.
Curioso que esse processo de desapego tem uma suavidade tipicamente oriental, até a fúria da mãe de Jean ao saber que a filha quer dar o piano da família é leve e não um dramalhão, caso acontecesse numa família ocidental acumuladora.
Essa tendência de ter uma vida mais simples e desprovida de coisas supérfluas tem sido muito forte depois do sucesso do programa sobre organização de Marie Kondo na Netflix. Energia precisa ser reciclada e o que não nos serve mais pode ser útil para outro, desapego possível e sensato, não esse desprendimento radical discutido no longa que é doloroso e uma grande utopia.
O final de “Happy Old Year” é melancólico mas bonito e bem coerente com a trama toda, e nos faz refletir se vale a pena se desapegar das boas lembranças e emoções. Eu acho que não, e você?!
Super Vale Ver !
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