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'Canção sem Nome', representante do Peru no Oscar 2021, é um drama cortante e belo | 2021

NOTA 9.0

Por Rogério Machado 

Será inevitável não criar comparações entre este 'Canção sem Nome', filme que brigou por uma vaga no Oscar 2021 representando o Peru, e 'Roma', um dos hits do Oscar 2019 com um total de dez indicações. Porém, a proposição visual, que vai desde o formato de tela até a fotografia em preto e branco,  é com toda certeza o único elo de ligação entre a produção peruana e o oscarizado mexicano de Alfonso Cuarón. O filme da diretora Melina León não guarda poesia nem na escolha das locações e muito menos no tema doloroso de uma história baseada em fatos. 

A trama se passa em 1988, quando o Peru está atravessando o auge de sua crise política e econômica. Para a pobre e grávida Georgina (Pamela Mendoza Arpi), a oferta de uma clínica que apoia e banca o parto de gestantes em situação precária chega na hora certa. Ela sai do interior e viaja para Lima para buscar a tal clínica anunciada em uma rádio. Porém, logo após o nascimento, seu bebê desaparece sem deixar vestígios. Jamais passaria pela mente de Georgina aceitar a perda e ela sai numa busca desesperada por sua filha. Com a ajuda do jornalista Pedro Campos (Tommy Párraga), ela se depara com uma rede de crimes de proporção alarmante.

Sim, 'Canção sem Nome' estabelece a semelhança com 'Roma' somente pelo apelo estético. Se o 'primo mexicano' usa a ausência de cor para ressaltar a beleza da luz e sombra num contexto agridoce, a história de Melina León aposta no preto e branco para tocar fundo na ferida aberta de uma mulher como tantas no mundo, vítima do tráfico internacional de crianças. A fotografia nada mais faz além de elevar a potência de um ambiente inóspito, cuja falta de amor e humanidade se contrasta com a ingenuidade na jornada de Georgina. Aliás, Georgina transborda essa dor a cada frame depois de perder seu bebê: desde o olhar perdido até o andar pesado, (como se ainda carregasse uma criança no ventre), somos levados pela mão através da potente performance de Pamela Mendonza.

Como se não bastasse todo o contexto cinzento, que extrapola a fotografia, a narrativa ainda encontra um ponto de resistência na figura do jornalista Pedro Campos. Além de ser agente transformador na vida de Georgina, o personagem tem certo destaque, numa sub-trama que só faz ressaltar outra grande fragilidade do ponto de vista social, mas que me absterei de revelar aqui para não comprometer a experiência. Qualquer detalhe, por menor que seja, num drama como esse pode fazer a diferença.

O filme abre contextualizando a ação em 1988, depois de situar o contexto sócio-político de um Peru devastado por governos totalitários, agregando a essa história de horror outras tradições locais, como os rituais tradicionais de vilarejos andinos. Essa percepção de rememoração cultural em oposição de tradições, dá lugar ao mais absoluto terror em escala universal: Georgina é uma jovem mãe que tem seu filho roubado após o parto, ficando à mercê de entidades e autoridades inertes, e no meio disso tudo um bebê com o qual ninguém se importa. Esse é o pulo do gato de 'Canção sem Nome', saindo de uma situação de desespero local para um alcance de grandes proporções.  O longa de Melina León conversa de perto com qualquer realidade e povo. 


Super Vale Ver!



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