'Doutor Gama' : cinebio retrata a abolição pela ação de um homem negro | 2021
NOTA 8.0
Por Rogério Machado
Por inúmeras vezes a dramaturgia foi a responsável por fazer reparações históricas a personagens reais em relação ao grande público. Me lembro de diversas obras onde personalidades saíram da invisibilidade - alguns fomentados pelo preconceito - através da arte: 'O Mordomo da Casa Branca' (2013), do cineasta Lee Daniels, é um desses trabalhos que tiram grandes homens que até então habitavam no anonimato para muitos. É a hora e a vez de um personagem importantíssimo para o processo abolicionista no Brasil completar seu ciclo. 'Doutor Gama', depois de muitos adiamentos, chega finalmente ao circuito comercial.
É fato que o longa não consegue fugir da romantização na abordagem, talvez pelo fato do pouco tempo para condensar todos os anos e processos pelos quais esse homem passou ao sair dos pavilhões da escravidão direto para os tribunais, alcançando fama e respeito não só entre os negros mas também entre os senhores de escravos. A representação da figura de Luiz Gama fica aquém do grande homem que ele foi e dos feitos conquistados por ele, mas ainda sim há que se elevar todos os esforços em trazer ao mundo mais um importante episódio da nossa história pelas vias cinematográficas, cujo alcance é insuperável.
Veja bem, se a representação da vida de Gama não tem tempo hábil para se aprofundar nos detalhes, o mesmo não se pode dizer no que tange a interpretação de Cesar Mello (que vive Gama na fase adulta), que imprime força e verdade ao incorporar o personagem. 'Doutor Gama' entrega com riqueza de detalhes a ambientação e o clima de um Brasil de opressão e cego aos avanços do processo abolicionista sem precisar lançar mão de sequências de violência e sofrimento, muito visto em filmes do gênero. Vemos também como a lei é burlada e ultrajada há mais de dois séculos nesse país, coisas que infelizmente seguem acontecendo até os dias de hoje.
O cineasta Jeferson De reafirma mais uma vez sua vocação para um cinema de resistência. Em seu terceiro trabalho seguido trabalhando temas pertinentes à excelência preta, o realizador deixa sua marca na arte de um país que convive com a vergonha de ter sido o último a abolir a escravatura, e que ainda ostenta tristes episódios de racismo e intolerância.
Vale Ver!
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