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'Glass Onion: Um Mistério Knives Out' : as parcas camadas investigativas do novo whodunit de Rian Johnson | 2022

NOTA 6.5

Por Alan Ferreira @depoisdaquelefilme

- É tão idiota!
- É tão idiota que é brilhante!
- Não! É só idiota!

Não é mistério que a engrenagem da máquina hollywoodiana se alimenta há tempos de franquias, das quais os resultados mais exitosos vêm sendo nas searas da ação (e aqui incluo o subgênero-galinha-dos-ovos-de-ouro “filmes de super-heróis) e do terror. E se o estrondoso sucesso de um whodunit como “Entre Facas e Segredos” – produção que faturou 313 milhões de dólares tendo um orçamento na altura de módicos 40 milhões – não deixou de ser uma baita surpresa, o mesmo não se pode dizer da consequente iniciativa de se filmar novas intrigas protagonizadas pelo detetive Benoit Blanc.

Agora, o intrépido personagem encarnado pelo ex-007 Daniel Craig será envolvido no encontro de amigos não mais tão amigos assim promovido pelo ricaço megalomaníaco Miles Bron numa ilha paradisíaca na Grécia que, obviamente, servirá de palco para um assassinato. O diretor Rian Johnson repete a estrutura bem sucedida do primeiro filme, inclusive ao colocar uma mulher como verdadeiro agente da ação, e que não deixa de seguir a cartilha definida pelos romances de Agatha Christie, ainda mais popularizada nos lares mundo afora pelo famoso jogo Detetive, mencionado, inclusive, em certo diálogo. As peças dispostas no tabuleiro mais uma vez são tipos excêntricos com aquele indefectível ar suspeito, vividos por um novo elenco estelar que reúne nomes como Kate Hudson, Edward Norton, Janelle Monáe, Dave Bautista, Kathryn Kahn e Leslie Odom Jr., além de algumas curiosas participações especiais. É importante observar como Johnson pretende, através dessas figuras, tecer uma crítica àqueles que detêm variadas manifestações de poder na sociedade contemporânea, na qual se destacam os arquétipos que representam ferramentas de influência em jogos de interesses tais como o dinheiro (em primeiro lugar, claro), o saber científico, a política, os padrões de beleza, a internet e o sexo. 


Com um orçamento bem mais gordo à disposição, “Glass Onion” pôde ter a escala de seus cenários consideravelmente ampliados, fazendo da construção que toma boa parte da ilha uma espécie de projeção da megalomania de Miles, alguém que sintetiza de forma estereotipada a seleta casta da qual faz parte. É até possível perceber como o diretor, à la Jacques Tati, tenta forjar piadas com os gadgets extravagantes com as quais vez ou outra os personagens, sobretudo Benoit Blanc, se deparam. No entanto, fica claro que falta a Johnson o mesmo timing na elaboração de um humor mais sofisticado, algo que o genial autor de “Meu Tio” e “Playtime – Tempo de Diversão” esbanjava.

Outro elemento que decepciona em “Glass Onion” é o próprio mistério em si. Embora a montagem consiga estabelecer um bom ritmo, as reviravoltas, sempre explicadas detalhadamente, mostram-se pouco convincentes.  E tal sensação é fruto também do já referido desleixo no desenvolvimento da cartela de suspeitos que a trama fornece. Aliás, nesse quesito, tirando as presenças de Janelle Monáe e Edward Norton, não há qualquer outro astro ou estrela ali que não sirva de mero penduricalho para que exista, no final, um leque variado de opções disponíveis para a grande resolução. E no que tange ao protagonista (em tese) vivido por Craig, sua melhor faceta se revela não quando ele está servindo de enfadonho instrumento expositivo, mas sim nos momentos em que verbaliza a sua impotência diante de encruzilhadas éticas.  

Filme que sobrevive de uma ou outra boa sacada (a da Monalisa é um bom exemplo), “Glass Onion” acaba reforçando a metáfora presente em seu título, ao apresentar uma narrativa de quase duas horas e meia sobre pessoas sem camadas a serem desvendadas. E se sua intenção era a de promover uma paródia inteligente não só desses seres tão rasos quanto um balde de gelo, mas também do subgênero que alavancou há três anos, Rian Johnson acaba sendo vítima da mesma arrogância que almeja criticar. Achando-se brilhante como um diamante enquanto se vale de truques baratos – um deles bem risível -, sua inicialmente interessante tentativa de ridicularizar uma elite que se perde no emaranhado tecido em prol da preservação dos próprios privilégios e da eterna impunidade acabou virando um cansativo exercício de como enganar o espectador e, por que não, de autoengano.  Uma nababesca bola de vidro, dura, frágil e que pouco reflete.


Vale Ver Mas Nem Tanto! 



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