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'Entre Mulheres' : concorrente ao Oscar de Melhor Filme é um retrato complexo do feminismo | 2023

NOTA 8.0

Por Maurício Stertz @outrocinéfilo 

Costumo pensar que Cinema com temáticas que transbordam pelos filmes ao real, ou seja, assuntos que carregam a realidade ‘aqui de fora’, ganhem de presente a maior conexão do espectador como sua consequência mais clara. Um exemplo? A complexidade da vigilância feminina pelos seus direitos, presente pela sociologia histórica e longe o bastante da luz ao fim do túnel, é um destes assuntos pertinentes que, seja pelo ativismo escancarado ou pela sutileza dos realizadores em qualquer filme, aparentam, em ambos os casos, como icebergs possíveis de descobrimento (bem) abaixo de sua superfície. O medo constante, neste caso, dos homens de que a trama trata, relembra rapidamente um filme de Terror. Isso porque, o que é o Terror no Cinema se não o medo real de seus protagonistas (reais ou não)?.

De forma incisiva, o filme extrapola seus discursos, ora optando pela sutileza, outras pelas menções claras à suas principais intenções, como ao abordar termos comuns que vemos todos os dias. O mais interessante está na maneira em que reviosiona a história. Ao transportar algumas mulheres a um passado recente, mais simplista e menos tecnológico ou fazer surgir um letreiro ao início sob a narração infantil e ingênua de uma garota, reafirma o papel de uma história “que parte da imaginação de um grupo de mulheres”, como se qualquer atitude que as aproximasse da esperança, naquela época, não pudesse sair de seus pensamentos idealizados. É neste momento que sabia o que esperar de 'Entre Mulheres'. 

Em 'Entre Mulheres', indicado ao Oscar de Melhor Filme em 2023, em um vilarejo vivem mulheres e crianças. A colônia, como chamam, é onde se organizam como grupos de resistência (guerrilhas brandas), enfrentando uma ameaça que sempre parece possível. São todas vítimas de violência cometidas por homens e nesse contexto, com a impunidade total a eles, o medo é a mais pura valência e o sentimento motivador de todas as ações de cada uma das personagens. A sensação de perigo se esgueira pelos largos campos que circulam o local a todo momento, captados pela diretora. 

A narrativa aborda no arranjo feminino as atitudes (já que imaginativas) que poderiam ter: através de uma votação, que faz alusão direta à prática política adquirida pelas mulheres em vários países e em vários períodos diferentes, seria para escolher se ficariam naquele lugar e aceitariam a submissão agressiva dos maridos e homens que voltariam à colônia em algum momento; desbravar novos caminhos e recomeçar ou ficar e lutar. A violência, pelos traumas de cada uma daquelas mulheres se personifica em padrões e grupos. Melhor evitá-los, parece. O ativismo, porém, não é lá tão radical em todo tempo.  Esse é o espaço propício para que as narrativas se cruzem, que os traumas estejam nas superfícies e demonstrem, em cada uma das mulheres, perfis distintos. Cada uma delas representa uma analogia fiel à atual sociedade. Existe ali o espaço para a fadiga que leva a desistência, para àquelas que levantam e se incomodam e até mesmo à agressividade que surge como reação.

A construção proposta pela diretora Sarah Polley, reconhecida pelo seu ativismo político, tem seu distanciamento moral bem delimitado e cabe ao espectador, homem ou mulher, traduzir as intenções de sua manipulação (da câmera ou do olhar daquele que assiste) e compará-la à suas próprias predileções ao assunto. Pois diferente de exemplares mais brandos, em 'Entre Mulheres' há o julgamento de valor claríssimo pelo bem da narrativa. A direção habilidosa de Polley, que merecia pelo menos uma menção na categoria do Oscar, traduz pelos planos abertos e ângulos aéreos, os espaços fechados e tons amarronzados que absorvem a vida daquele local. Enquanto as discussões sempre fervorosas acontecem, acompanha precisamente as lágrimas e o entalar da garganta de cada personagem ao desabafar e reavaliar seus traumas. Destaque também para as atuações contundentes de Rooney Mara e Jessie Buckley (olho nela!). 

'Entre Mulheres' é efetivo em tudo que se propõe, sem baixar a cabeça ao enfrentar sua complexidade. Mas não precisa de aprovações prévias, pois é 'Entre Mulheres' e a elas essa discussão pertence.






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