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'A Morte do Demônio: A Ascensão' : longa renova a fórmula em mais uma boa entrada na franquia | 2023

NOTA 9.0

Por Rafa Ferraz @issonãoéumacrítica 

Existem expressões que repetidas à exaustão foram rebaixadas a qualificações vazias de sentido. Afirmativas como “fez história” ou “um marco para o cinema” geralmente são frases de efeito sem muito embasamento cujo intuito é de gerar engajamento. Contudo, em se tratando da franquia ‘A Morte do Demônio’ (Evil Dead no original) cada um desses méritos são a mais pura verdade.

Tudo começou de maneira improvável quando em 1978 alguns amigos da faculdade realizaram um curta bastante amador, porém promissor. A recepção não foi das melhores, todavia suficiente para alguns anos depois, em 1981, conseguir um financiamento modesto de 90 mil dólares para transformar a ideia inicial em longa-metragem. O amadorismo dos envolvidos gerou problemas dos mais diversos, de alimentação à logística. Faltaram recursos básicos, tornando o ambiente de trabalho precário e a elevação dos custos em 250 mil dólares ao fim da produção. Entretanto, a escassez é a mãe da criatividade e nesse quesito, Sam Raimi, na época um jovem de 21 anos, já demonstrava uma capacidade inovadora digna de gênio. 

A câmera sob a perspectiva do demônio se tornou um referencial da franquia e uma das maiores colaborações do diretor. Na ocasião, foi improvisado uma estrutura de madeira acoplada à câmera e operada por duas pessoas em movimento, introduzindo um conceito inédito até. Assim nasceu o primeiro filme que, apesar do retorno de bilheteria bastante razoável, teve problemas de distribuição sérios, sendo banido em alguns países dado o conteúdo de extrema violência e gore exagerado. A sequência não demorou muito, porém em 1987 os criadores já não tinham os direitos de distribuição, sendo necessário alguns ajustes. Mais uma vez a criatividade foi posta à prova e, se o primeiro foi marcando pelas técnicas inovadoras e alternativas criativas dado às limitações orçamentárias, o segundo muda a trajetória da premissa original, consolidando o que hoje se convencionou chamar de “terrir”. Também foi na sequência em que Ash, o protagonista vivido pelo carismático Bruce Campbell, foi alçado ao status de ícone do gênero. A trilogia é concluída já na década de 90 com “Army of Darkness”, onde Ash volta ao passado para lutar com demônios na idade média, encerrando o projeto com chave de ouro. Somente 20 anos depois, em 2013, a ideia de remake foi colocada em prática, gerando o interessante longa de mesmo nome dirigido pelo uruguaio Fede Alvarez. Com tantos êxitos, o anúncio de uma nova entrada foi encarado com desconfiança, afinal, o que mais falta ser contado? Para nossa sorte, o irlandês Lee Cronin provou ainda haver muito a ser aproveitado da fórmula “Evil Dead”

O filme foi pensado como adição de catálogo para a HBO MAX, mas a excelente repercussão nas sessões teste fizeram a companhia mudar a estratégia para lançamento mundial nos cinemas. O desafio era imenso, em parte porque os fãs de horror sofrem certa ressaca de “remakes” e “reboots” recentes e malsucedidos, porém, Cronin adota a postura de usar a obra original com menos referência e mais reverência, e isso fez toda a diferença.  É evidente que há elementos referenciais, dentre eles o movimento de câmera tradicional criado em 81, mas também existe espaço para novidades como a atmosfera da cabana isolada, aqui transposta para um decadente prédio em Los Angeles. Não que originalidade seja o ponto alto do longa, muito do que é feito soa bastante comum para o expectador não casual, entretanto a produção tem certo frescor quando, além da questão da mudança para o cenário urbano, a problemática se desenrola dentro de um mesmo núcleo familiar, aumentando nosso envolvimento e fazendo as mortes terem um peso a mais. 

A violência e o “gore” sobem de nível de maneira exponencial. Se analisarmos os lançamentos recentes, somente “Terrifier 2” (2022) tem nível equivalente. Estima-se que mais de 6 mil litros de sangue artificial tenham sido usados durante as gravações e, por mais que soe forçado, esse excesso faz parte da construção narrativa desde os primórdios da franquia. Os efeitos práticos e a maquiagem são de tamanha excelência que impressiona o filme ter custado 15 milhões de dólares. Apenas para parâmetro de comparação, o recente “Urso do Pó Branco” custou o dobro e basta colocar os resultados em perspectiva que nos damos conta que dinheiro definitivamente não é garantia de nada. O elenco é composto majoritariamente por rostos desconhecidos, exceto a atriz Alyssa Sutherland, a Aslaug da série “Vikings” (2013-2020), com especial destaque para a fisicalidade com que ela compõe a personagem, numa atuação que mesmo com quilos de maquiagem e efeitos da pós-produção, ainda é possível enxergar a atriz e todo o trabalho de construção envolvido. O elenco de apoio é eficiente, com alguns bons momentos de Lily Sullivan, interpretando a irmã da protagonista e a filha caçula, interpretada pela atriz mirim Nell Fisher.

“A Morte do Demônio: A Ascensão” mantém a série invicta da franquia idealizada por Sam Raimi mais de 40 anos atrás. Nos resta esperar e torcer para os próximos sustentarem o nível de excelência e desgraçamento mental que tornam essa experiência tão perturbadoramente prazerosa. 






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