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'Velozes e Furiosos 10' : franquia mostra que mesmo depois de muita estrada, ainda tem Diesel para queimar I 2023

NOTA 7.0

Nunca aceite a morte quando o sofrimento é devido

Por Vinícius Martins @cinemarcante 

Uma das coisas que brasileiro mais ama consumir é o café. Existem diversos tipos e, de igual maneira, diversos modos de preparo. Se o cafezinho é passado no coador, coloca-se uma medida de pó para uma quantidade específica de água - contudo, se quem está fazendo quiser levar o café a render mais do que deveria, é colocada uma porção maior de água e, com isso, o resultado é um líquido ralo, fraco, aguado. Perde-se o gosto e o que sobra é uma água doce levemente saborizada. E por que estou falando de café? Bem, porque outra coisa que brasileiro também ama consumir é a franquia 'Velozes e Furiosos', que por aqui é extremamente popular, atingindo com facilidade todas as classes sociais e tendo um apelo enorme entre o público casual, que vai ao cinema despretensiosamente só para se distrair durante duas horas.

Ocorre que a franquia tem sido explorada de forma mais comercial do que artística (no sentido de coerência interna e respeito às próprias regras e à própria "mitologia"), e isso causa o mesmo efeito que colocar mais água no café do que se deveria. Para fazer render, doses e mais doses de exageros são atirados em tela com um propósito pífio que escancara a falta de interesse criativo por parte de seus realizadores. Personagens são tirados do cu chapéu para inventar passados que até então não existiam, indivíduos que morrem e retornam miraculosamente e vilões que se mostram terrivelmente perversos em uma primeira vista logo acabam se tornando aliados e, posteriormente, até amigos da família que Dominic Toretto criou. São absurdos em cima de absurdos, e alguns filmes não só reconhecem essa veia como fazem piada com ela. Como resultado, a franquia perdeu o sabor em seus últimos capítulos, saindo de absurdos convenientes para uma fantasia mais apelona do que filmes de magia e criaturas mágicas.

Existe uma diferença enorme entre obras surrealistas e obras mentirosas. Se quiser exemplos de surrealismo (artístico, inclusive, e não somente como ferramenta comercial), recorra a Bollywood; o cinema indiano é ótimo nisso. O que temos em 'Velozes e Furiosos' é a mais pura e crua mentira, e em seu décimo primeiro volume (não nos esqueçamos do spin-off de 2019) não é diferente. Carros capotam e batem com uma frequência grotesca e não aparece um arranhão na careca do Vin Diesel, mesmo em sequências onde o escapismo causaria inveja em Houdini. No entanto, em se tratando de 'Velozes e Furiosos', isso não somente é perdoável como também se tornou desejável.

O público da franquia vai ao cinema querendo ver essas coisas, que acabaram saindo do espectro da mentira e entraram no caricato; e este novo episódio acabou colocando um pouco mais de pó de café na água com açúcar que a franquia estava se tornando, revitalizando a si mesma com a adição carismática de Jason Momoa - que está para esse filme quase como Thanos está para 'Vingadores 3', roubando a cena sempre que aparece - mas não tomando o filme para si como Thanos fez; esse filme ainda é do Dom. Sua caracterização em muito se assemelha à do Coringa de Heath Ledger em trejeitos e psicopatia, mas o sadismo debochado de seu personagem dá uma identidade polarizada em relação ao discurso do arqui-inimigo do Batman.

Um acerto que vale muito a pena destacar está em colocar o pé no freio naquela premissa de "maior e melhor", aderindo agora ao "menos é mais" e reduzindo um pouco a megalomania exacerbada que vinha em uma crescente descontrolada, escolhendo desta vez focar mais nas relações entre os personagens do que em pirotecnias (pirotecnias essas que continuam no filme, mas em uma dose mais pontual). Distribuindo os personagens e separando núcleos, o filme mostrou que a franquia, com suas corridas e fugas milagrosas, não é movida somente a Diesel. Adições ao já extenso elenco marcam participações especiais que prometem render mais algum sumo à já demasiadamente espremida franquia. Se esse caldo vai ser satisfatório ou se vai azedar, saberemos nos próximos capítulos. Por enquanto, fica a promessa de uma história sem fim em um filme que apela ao elemento nostálgico como fio condutor, uma vez que o cinema hollywoodiano insiste em fazer reciclagens ao invés de abraçar o risco. Mas calma, essa foi só a primeira parte da trilogia final da saga. Ano que vem tem mais.






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