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'A História da Minha Mulher' : filme esmiúça a improvável beleza de uma relação tóxica | 2023

NOTA 8.0

Por Karina Massud @cinemassud 

Ao contrário do que prega o senso comum, segundo o qual relacionamentos tóxicos são sempre nefastos e de belo nada tem, em “A História da Minha Mulher” conhecemos e torcemos por um casamento falido, que machuca e destrói o equilíbrio emocional, mas que tem apelo graças ao magnetismo do casal de protagonistas.

Adaptado do livro homônimo de 1942 do poeta húngaro  Milán Füst, o longa é a volta da diretora, também húngara, Ildikó Enyedi , afastada das telonas desde 2017 quando lançou “Corpo e Alma”, ganhador do Urso de Ouro no Festival de Berlim. 

Jakob (Gijs Naber) é o capitão de um navio de carga que, num café casual com um amigo, aposta que se casará com a primeira mulher que lá entrar, e eis que se depara com a belíssima  Lizzy (Léa Seydoux). Eles se casam e formam um casal improvável: ela uma francesa afeita a festas nos salões da Paris efervescente dos anos 20, a luxo e prazeres mundanos, porém sem um ganha-pão para manter esse estilo de vida; ele um capitão renomado que apesar de lidar com homens brutos, tem lá seu refinamento, e também muita habilidade para comandar qualquer navio ou adversidade no mar, qualidade que não tem na vida pessoal. Duas pessoas separadas pelo mar propriamente dito e pelo mar de diferenças que só desaparecem com o imenso desejo satisfeito na cama. 

Lizzy é o céu mas também o inferno na vida de Jakob, num casamento que  tem amor mas também loucura,  e que vive na corda banda devido ao comportamento dela. Ela tem os “olhos de ressaca” e a ambiguidade de uma Capitu; ela seduz, provoca e faz o que quer do marido, que aos nossos olhos parece um bobalhão que precisa de uma sacudida pra reverter a situação. Essa mesma sedução Lizzy dedica ao terceiro elemento desse triângulo amoroso, o bom vivant cafajeste Dedin (Louis Garrel); ele é a sombra que paira sobre o frágil casamento. Atormentado por ciúme e angústia, Jakob alterna a vida em terra firme com viagens de meses, pois só essas longas ausências o fazem suportar tanto sofrimento e insegurança. 

As quase três horas desse jogo de gato e rato   são excessivas e a certa altura o filme se torna um pouco enfadonho pois gira em círculos. No entanto, a atmosfera de “A História da Minha Mulher” é altamente sensual, com cenas quentes e elegantes. Esse é um romance trágico mas muito bonito, com uma bela trilha sonora, cenários magníficos e uma ótima fotografia que passeia pelas emoções de Jakob: no mar é tudo seguro e simétrico, e em terra o mundo é irregular e nebuloso.

O que começou num mar brilhante e de alegria, termina num mar sombrio de melancolia e arrependimentos. Talvez Jakob jamais devesse ter se aventurado em terra firme.








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