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'Barbie' : longa de Greta Gerwig debate a (des)evolução humana através do universo da famosa boneca | 2023

NOTA 8.0

Por Rogério Machado 

Depois de atuar em uma dúzia de filmes, foi a boa repercussão de 'Frances-Ha' (2012) que trouxe Greta Gerwig ao conhecimento do grande público. Não demorou muito para essa americana de trinta e poucos anos ir caminhar de vez (já que em 2008 havia estado por trás das câmeras em parceria com Joe Swanberg) pelas veredas da direção  com 'Lady Bird',  e ainda com direito a indicações ao Oscar em 2018. Logo depois 'Adoráveis Mulheres' também reservou surpresas e nominações, não só ao Oscar como em outras premiações, entre elas a láurea de um Critics' de Melhor Roteiro Adaptado. 

Pode parecer clichê afirmar isso, mas foi essa ampla entrada no universo feminino que trouxe Greta até 'Barbie', que, coincidência ou não, divide o posto de roteirista com Noah Baumbach, assim como fez em 'Mistress America' (2015). Acredito que não só essas experiências anteriores, que trouxeram a liberdade de ousar, mas também o entrosamento com Baumbach, sejam o tempero na medida para o êxito dessa produção estrelada pela boneca mais desejada de todos os tempos.  Com a vida pregressa construída dentro do cinema, era certo que essa dupla entregaria muito mais do que uma simples aventura na Barbieland. 


Nessa aventura salpicada de rosa, acompanhamos o dia a dia em Barbieland - um lugar onde todas as versões da boneca Barbie vivem em completa harmonia e suas únicas preocupações são encontrar as melhores roupas para passear com as amigas, curtir festas e a praia. É quando a chamada Barbie estereotipada (Margot Robbie) começa a perceber que talvez sua vida não seja tão perfeita assim, questionando-se sobre o sentido de sua existência e alarmando suas amigas acerca disso. Depois de algumas alterações em seu corpo ela procura respostas com a Barbie Estranha (Kate McKinnon) e vai ouvir coisas que ela não gostaria, uma delas que existe um mundo real e que ela precisa ir até lá para descobrir o que está acontecendo com ela. Barbie  então precisa lutar com as dificuldades de não ser mais apenas uma boneca - pelo menos ela está acompanhada de seu fiel e amado Ken (Ryan Gosling), que parece cada vez mais fascinado pela vida no novo mundo. 

Ken descobre que homens podem ter voz no mundo real e busca conhecimento embasado em literaturas que abordam o patriarcado. É aí que toda a confusão começa, dando margem pra Gosling colocar todo seu poder cômico em ação. O Ken de Ryan Gosling tem camadas interessantíssimas e pra mim o personagem vivido pelo ator é a cereja do bolo da produção. Não seria exagero dizer inclusive que ele rouba a cena, fazendo além do que se espera de alguém que teoricamente deveria viver à sombra de um ícone como Barbie. 

No mundo real Barbie realiza que ser humano não é tão legal assim e entre tantas temáticas discutidas, a crítica à humanidade, com toda sua sistemática, ignorância e modo de viver estão em destaque no roteiro de Gerwig e Baumbach. Aliás, a crítica e a autocrítica são ingredientes de peso em 'Barbie', expressas pela narração impagável de Hellen Mirren. São as interpelações dessa narradora que somam acidez e ironia, elementos que residem no cerne da construção desse projeto, que provoca um misto de reações no público. Ao mesmo tempo que nos faz rir, o filme produz emoção, e acima de todos esses sentimentos, motivados talvez pela nostalgia, o longa traz questionamentos que também aprofundam o debate sobre feminismo/machismo, mas sem pesar a mão na militância.    

Em meio a milhares de referências à cultura pop e a sétima arte, 'Barbie' é o que o cinema tem de melhor: tem ritmo, humor, elenco redondo e temas atualíssimos. É como se Greta Gerwig resgatasse o que há muito estava perdido: a vontade de ver um filme no cinema. Você vai me dizer que isso se deve ao hype provocado pelo marketing em torno do filme, mas posso rebater dizendo que marketing sozinho é simplesmente marketing, mas marketing que traz consigo um produto que abraça gerações enquanto atualiza tantos discursos urgentes com inteligência e, o melhor, sem a pretensão de ser cult, é muito mais do que apenas publicidade. 'Barbie' é o popular com refinamentos que só grandes filmes conseguem ser. 






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