Adsense Cabeçalho

Festival do Rio: 'Priscilla' | 2023

Longa desconstrói o mito Elvis sob o olhar de Priscilla Presley 

Por Rafa Ferraz @issonãoéumacrítica 


A discussão em torno da separação entre arte e artista é inegavelmente complexa, no entanto, é indiscutível que algumas personalidades alcançam um status de importância que parece apagar qualquer traço de subjetividade. O cinema desempenha um papel significativo nesse fenômeno, já que muitos projetos têm como principal objetivo celebrar esses ícones, o que, em si, não é problemático. De fato, essa abordagem criativa é válida e, em muitos casos, revela verdades, mesmo que não “toda” a verdade. Um exemplo recente que ilustra esse viés criativo é o filme "Elvis"(2022). Embora ele proponha uma discussão em torno da influência do empresário Tom Parker, o foco está na carreira do rei do rock. Contudo, "Priscilla", dirigido por Sofia Coppola, oferece uma perspectiva contrastante. Em contraposição à mitificação promovida por Baz Luhrmann, o filme de Coppola nos apresenta um Elvis desprovido de fama e glória. 

Baseado no livro de memórias "Elvis and Me," escrito por Priscilla Presley, o longa trata do relacionamento do casal, desde o momento em que se conheceram pela primeira vez quando o já consagrado cantor servia as forças armadas americanas na Alemanha Ocidental, em 1959, passando pelo casamento, consumado em 1967, até seu derradeiro fim, em 1972. 

Oferecer voz a quem antes foi historicamente silenciado é uma notável tendência do cinema contemporâneo e uma mudança de direção digna de destaque. E se tratando desse silêncio, quase invariavelmente, estamos falando de minorias. Priscilla Presley desempenhou papel central na projeção da imagem de Elvis como parte de uma família tradicional e feliz. No entanto, nos bastidores, enfrentou situações traumáticas devido ao comportamento temperamental, abusivo, egocêntrico e controlador do astro. Entretanto, conforme exploramos mais a fundo a figura do homem por trás do mito, torna-se evidente que sabemos cada vez menos sobre Priscilla para além do seu papel de vítima. Essa aparente contradição surge porque, embora seja a sua visão dos fatos, em essência, quase nada é sobre ela. Nesse sentido, Baz Luhrmann parece ter feito uma escolha mais acertada ao intitular sua obra "Elvis", já que, mesmo narrado por Tom Parker, a atenção está completamente centrada em Elvis. Por sua vez, obedecendo a mesma lógica, o título mais apropriado para o filme “Priscilla” fosse "Elvis, por Priscilla Presley". 

As atuações de Cailee Spaeny e Jacob Elordi são competentes em suas respectivos propostas. Spaeny personifica de forma convincente a experiência da mulher invisibilizada, objetificada e, à medida que é relegada a papéis secundários, sua solidão e tédio se tornam evidentes. O trabalho de maquiagem e figurino é sutil e eficaz, auxiliando na percepção da passagem do tempo, uma vez que acompanhamos Priscilla desde os seus 14 anos até a idade adulta. Jacob faz um excelente trabalho de voz e, assim como em sua atuação na série "Euphoria", consegue transmitir potencial ameaçador enquanto expressa uma ingênua e patética insegurança. 

Sofia Coppola é conhecida por sua filmografia excepcional, caracterizada pelo protagonismo feminino e uma abordagem não sensacionalista sobre temas delicados e de suma importância. Dito isso, “Priscilla” mais parece um desvio de rota e uma incoerente nova entrada em seu currículo, que mesmo razoável na trama é no mínimo falho na temática. 






Nenhum comentário