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'Tia Virgínia' : Fábio Meira conduz com humor e drama a libertação de uma mulher na terceira idade | 2023

NOTA 10 

Por Rogério Machado 


No primeiro plano de 'Tia Virginia', novo filme de Fábio Meira ('As Duas Irenes' - 2017), que levou nada menos que seis prêmios em Gramado esse ano, o destaque é uma parede repleta de quadros com fotos e um relógio antigo ao meio, que nesse momento está sob o domínio da personagem título que com todo cuidado acerta os ponteiros para que a engenhoca continue trabalhando corretamente. Poderia ser só mais uma abertura bonita para nos ambientar nessa casa cheia de memórias, mas em se tratando de Virgínia, seu duelo com o relógio muito tem a ver com o tempo que ela já não tem mais, uma vez que doou todo seu tempo aos outros. Ainda daria tempo de uma drástica mudança? 


Vera Holtz é quem vive a Tia Virgínia, que está na casa dos 70 anos, não teve nenhum filho e nunca se casou. Em dado momento, no agravamento da doença da mãe (Vera Valdez) ela acabou sendo convencida pelas irmãs, Vanda (Arlete Salles) e Valquíria (Louise Cardoso), a cuidar da mulher em tempo integral e em contrapartida abandonando a própria vida em troco de ter um lugar pra ficar.  Em uma casa na região serrana no Rio de Janeiro e se passando em apenas um dia, a narrativa acompanha a preparação de Virginia para receber as irmãs que estão vindo com os sobrinhos para celebrar as festas de fim de ano. 

O longa recebe um olhar íntimo e pessoal de seu criador, o diretor e roteirista Fábio Meira, que faz uma espécie de homenagem às suas tias. Tudo em 'Tia Virgínia' é muito palpável e todos nós vamos nos reconhecer em uma e outra situação representada ali, sobretudo nas interações dessas três grandes atrizes que estão em total estado de graça, amparadas por um roteiro que eleva a voz de mulheres maduras, que na nossa sociedade são constantemente caladas pelo etarismo. 

'Tia Virgínia' é o que eu chamaria de um encontro redondo e feliz em tudo que compõe o que pensamos sobre cinema. O projeto tem a potência e a voltagem de uma protagonista do quilate de Vera Holtz, que merecidamente foi premiada no prestigiado Festival de Gramado esse ano. Virgínia é uma personagem disruptiva, que quebra todos os protocolos estabelecidos pelas irmãs, que despedaça o ritmo imposto como padrão em qualquer família e que há de gerar identificação em muitos. Meira conduz uma câmera inquieta, que ora observa de longe e às vezes esconde reações, escolhas provocativas que fazem crescer nosso interesse em torno de cada personagem. 

Dentre tantas qualidades, também chama a atenção a impecável direção de arte de Ana Mara Abreu (premiada recentemente no Los Angeles Brazilian Film Festival) e claro, o misto de delicadeza e técnica de seu criador, que se supera a cada trabalho, colocando 'Tia Virgínia' entre os grandes feitos do cinema nacional dos últimos anos. 







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