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PiTacO do PapO - 'Pantera Negra' | 2018

NOTA  9.6

Um novo conceito para a representatividade negra no cinema.

Por Vinícius Martins @cinemarcante 


O termo “representatividade” me soa meio agressivo. Geralmente, a representatividade é usada para grupos que são tidos como minoria, o que não é o caso dos negros. Então, usar a palavra no subtítulo pareceu um tanto inapropriado, mas dentro do contexto cinematográfico me pareceu cabível. Os filmes que abordam a cultura negra são, em sua maioria, ou de rebeldia contra o “sistema opressor” ou obras dramáticas que vitimizam o negro para que o público diga “olha ele, coitadinho, é negro e sofre por causa da cor da pele”. Esses rumos de linguagem passam longe de serem usados aqui. Não tem coitados em Wakanda, e a rebeldia do vilão é uma expressão da sua ambição pelo domínio global (de novo isso, mas vamos lá...)


O negro não é meramente a vítima do sistema, e nem tampouco o problema de si mesmo. Não há espaço para o racismo (apesar de o filme debater bastante questões raciais). Ao contrário de ‘Preciosa’(2010), onde vemos uma situação de desgraça na vida da protagonista gerando o sentimento de pena do espectador, ou ’12 Anos de Escravidão’(2013), onde o negro tem que ser forte e superar as adversidades em sua jornada para a casa, ou ‘Histórias Cruzadas’ (2011), onde a comunidade negra é explicitamente vítima de um racismo maquiado, o que se vê pelas ruas de ‘Pantera Negra’ é um império forte e vivo na fictícia Wakanda. Ao espectador é apresentada uma sensação diferente da que ficou ao assistir os filmes citados acima, assim como também os tantos outros filmes que depreciam o negro e colocam o “cara do gueto” como um efeito colateral de um sistema que não dá a mínima para ele. Isso, é claro, também é debatido no filme, mas não cria um espectro de “longa de justiça”, para apresentar uma realidade que poucos mostram (linha que já foi seguida por ‘Moonlight’- 2016). A sensação, meus queridos, é de uma pura e simples euforia contemplativa.

A Marvel Studios deu início, dez anos atrás, ao seu universo cinematográfico expandido. E agora, com seu décimo oitavo filme, vai além e remonta seu corpo de protagonistas. Com a evidente saída de pelo menos dois dos quatro heróis principais, as lacunas que serão deixadas por eles começam a ser preenchidas de uma forma mais atrativa, tanto etnicamente quanto em gênero. ‘Pantera Negra’ é de longe o filme mais sério da Marvel até agora. Ele é o que tem menos piadas gratuitas e fora do tom, que mais se distancia da famosa fórmula engraçadinha e descontraída, dando lugar a um discurso político que funciona efetivamente tanto na história quanto na atual situação mundial. É um filme que reflete o nosso momento, mas que fica registrado como um marco no que se define o termo “representatividade”, que há muito deveria ter deixado de ser necessário.



Praticidade é algo que se vê somente em ocasiões onde há maestria na direção. Em pouquíssimos minutos, o diretor Ryan Coogler situa seu público quanto a origem de Wakanda, dá um tour pela história mundial, explica os elementos centrais da mitologia e todo o conceito que irá reger as mais de duas horas de duração do filme – tempo esse que se faz passar em um piscar de olhos.

As cenas de luta são contidas, mas muito bem filmadas. Tanto sua fotografia quanto sua edição fogem dos estilos de corte da franquia ‘Bourne’, e é possível apreciar a coreografia dos confrontos com mais veracidade. Os figurinos são belíssimos, e a trilha é de um bom gosto tremendo. Raízes e culturas são aqui elementos centrais da trama, que são tão importantes para a história que chegam a ser a própria história. Os efeitos é que pecam um pouco, sendo estéticos em uma medida irregular e plásticos de um modo que beira o incômodo. Rinocerontes, em especial, passam longe de serem visualmente palatáveis.

Temos aqui um vilão que, para o nível dos filmes da Marvel, é muito bom; mas que não é memorável ou grandioso fora do seu próprio meio, como foi o Coringa de Ledger dez anos atrás. O Abutre, vilão de ‘Homem-Aranha – De Volta ao Lar’(2017), tem um desenvolvimento muito melhor e mais eficiente do que o do Killmonger de Michael B. Jordan. O vilão não é um personagem ruim, não me entendam mal, mas poderia ter sido ainda melhor se tivessem dado à ele um enredo menos previsível.

Podemos dizer que ‘Pantera Negra’ reflete o mundo de hoje com a beleza da poesia ritmada das batidas africanas. O sotaque típico (recomendo que o filme seja assistido legendado) é um charme a mais, mostrando quão rico foi o trabalho da produção em querer legitimar seu país que poderia existir na realidade. No que se diz cinema afro, esse é um passo enorme dado no quesito igualdade. Não lembremos de ‘Pantera Negra’ como “aquele filme maneiro dos negros”, mas sim como “aquele filme maneiro da Marvel”. Política, crenças e cores são aqui simplesmente artigos de beleza; e meus amigos, que beleza linda! (isso conta como pleonasmo?)



Após a bela arte do filme, um rápido comentário COM SPOILERS :

O cinema mundial precisa parar me matar o Andy Serkis. O cara morreu em ‘Planeta dos Macacos: A Guerra’ , morreu em ‘Star Wars: Os Últimos Jedi’ (2017) e agora também morreu no MCU. Isso sem contar com o Gollum e com o seu maravilhoso Kong, de 2005. Será ele o novo Sean Bean?

E por falar em Gollum, eu bem que fiquei esperando um jogo de charadas na cena em que Serkis e Martin Freeman ficam cara a cara em um interrogatório. Quem pegou a referência, pegou; quem não pegou, veja ‘O Hobbit: Uma Jornada Inesperada’ (2012).

Super Vale Ver !


DIREÇÃO

 Ryan Coogler

EQUIPE TÉCNICA

Roteiro: Joe Robert Cole, Ryan Coogler
Produção: David J. Grant, Kevin Feige
Fotografia: Rachel Morrison
Trilha Sonora: Ludwig Goransson
Estúdio: Marvel Studios, Walt Disney Pictures
Montador: Debbie Berman, Michael P. Shawver
Distribuidora: Walt Disney Pictures

ELENCO

Alexis Rhee, Andy Serkis, Angela Bassett, Atandwa Kani, Bambadjan Bamba, Chadwick Boseman, Connie Chiume, Danai Gurira, Daniel Kaluuya, David S. Lee, Elizabeth Elkins, Florence Kasumba, Forest Whitaker, Francesca Faridany, Isaach De Bankolé, John Kani, Letitia Wright, Lupita Nyong'o, Mark Ashworth, Martin Freeman, Michael B. Jordan, Nabiyah Be, Sasha Morfaw, Seth Carr, Shaunette Renée Wilson, Sope Aluko, Sterling K. Brown, Sydelle Noel, Tony Sears, Tunde Laleye, Winston Duke

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