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PiTacO do PapO - 'Um Lugar Silencioso' | 2018

NOTA 10

O terror dramático que segue na contramão e cria uma nova tendência

Por Vinícius Martins  @cinemarcante



Filmes de terror são, em geral, moldados pelos efeitos de áudio. O susto que se dá no público é proveniente de um silêncio anêmico antes de uma explosão sonora vinda das caixas de som do cinema, e isso não é novidade para mais ninguém. Em outras palavras, o gênero tem estado cansado. De uns tempos para cá, terrores com veias de horror tem dado novos rumos para essa área do cinema. Filmes como ‘O Babadoock’ (2014) e os dois ‘Invocação do Mal’ e seus derivados (2013 – 2018) trazem o pânico por ser perseguido por uma entidade que te assiste e fica no teu encalço, com o intuito de contemplar a bestialidade, fugindo da linha de clássicos noventistas como os da série ‘Pânico’, de Wes Craven. Assim sendo, era de se esperar que ‘Um Lugar Silencioso’, do ator, escritor, roteirista e diretor John Krasinski, tirasse bastante proveito dessa característica em especial. No entanto, o resultado que se tem na tela é totalmente diferente do imaginado.

Há, é óbvio, o susto do volume alto. Porém, esse susto não é para apresentar um monstro ou algo assombroso, que fará o espectador saltar de sua poltrona e murmurar uma praga por ter caído em mais uma explosão sônica previsível. O susto do som aqui é, na verdade, para conscientizar a quem assiste de como é, após viver por mais de um ano sem fazer barulho, se deparar com uma situação onde o controle foge das mãos e o barulho toma uma grande proporção em meio ao silêncio quase absoluto.


A trama poderia ser complexa, com uma grande metrópole como cenário, mas ao invés disso decide se fazer simples limitando-se na rotina de uma família fazendeira. Após um surto (alienígena, aparentemente), eles ficam isolados do restante do mundo e tentam sobreviver ao seu modo, fazendo o mínimo de barulho possível para não acabar atraindo as criaturas monstruosas que dominam o planeta – criaturas essas que são cegas e localizam suas presas através do som. E é nesse ponto que o filme consegue cativar. Não há excesso de personagens. Todos são úteis e tem um propósito dentro do contexto, desde o casal protagonista vivido por Krasinski e Emily Blunt (que também é um casal na vida real) até o mísero figurante que só aparece para morrer.

Os dilemas familiares são os que guiam o ritmo da produção. A menina surda, o filho medroso, o caçula que sonhava em ir para o espaço, a gravidez da matriarca e o peso da responsabilidade do pai de família que teme não conseguir cuidar de todos. Uma família feita de pessoas que se amam, mas tem problemas entre si. E monstros. Muitos monstros. Segundo o diretor, que afirmou ter se inspirado no clássico ‘Tubarão’ (1975) de Spielberg, quanto menos fosse mostrado sobre as criaturas, melhor. E essa tática funcionou, da mesma forma que o também clássico ‘O Massacre da Serra Elétrica’ - que optou por deixar parte do trabalho sangrento com a imaginação de quem assiste ao filme.

O longa não cai na mesmice, e entrega uma obra singular em meio a tantos outros que trazem apenas mais do mesmo. E apesar do gênero, não seria inadequado colocá-lo também nas etiquetas de ficção científica, drama, ação e talvez até mesmo fantasia. Há elementos desses gêneros todos circulando as cenas, e tudo é posto na tela com uma delicadeza sem igual, manuseada pelo tato preciso de um diretor que mostra que tem um futuro brilhante dentro da indústria.

Seja na dança do casal em meio ao caos (que mostra que cabe um mundo inteiro entre os fones de ouvido), na trilha intensa expressando o isolamento e a angustia da impotência, na claustrofobia de se sentir perseguido ou na simplicidade da comunicação gestual, ‘Um Lugar Silencioso’ é um colírio aos olhos e uma sinfonia aos ouvidos. Como mesmo disse o editor deste blog após ver o filme, essa é uma produção que gera um debate gigantesco, pois em um mundo tão barulhento, onde as pessoas não prestam atenção em mais nada, algumas palavras são dispensáveis e a necessidade de dar atenção ao outro e à simplicidade de um gesto ou um olhar afetuoso se faz ainda maior. Essa é uma obra cinematográfica que merece no mínimo uma indicação ao Oscar nas categorias técnicas de som. Emocionante, assustador, compassivo e bem orquestrado, esse filme já é um dos melhores do ano. Aplaudi mentalmente ao final da sessão, pois, afinal, fazer barulho pode não ser uma boa ideia.


Super Vale Ver !

DIREÇÃO

  • John Krasinski

EQUIPE TÉCNICA

Roteiro: Bryan Woods, John Krasinski, Scott Beck
Produção: Andrew Form, Bradley Fuller, Michael Bay
Fotografia: Charlotte Bruus Christensen
Trilha Sonora: Marco Beltrami
Estúdio: Platinum Dunes, Sunday Night
Montador: Christopher Tellefsen
Distribuidora: Paramount Pictures Brasil

ELENCO

Cade Woodward, Doris McCarthy, Emily Blunt, John Krasinski, Leon Russom, Millicent Simmonds, Noah Jupe

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