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PiTacO do PapO - 'Ad Astra - Rumo às Estrelas' | 2019

NOTA 9.0

O dilema existencial universal

Por Vinícius Martins @cinemarcante


Per Aspera Ad Astra (Rumo Às Estrelas Por Caminhos Difíceis)

Pense, só por um instante, nos defeitos que o seu pai tem. Tire um minuto para mentalizar isso antes de prosseguir com a leitura. Pensou? Agora receba uma verdade chocante: esses são exatamente os defeitos que você possui. Quem está certificando isso não sou eu, é claro; essa é uma afirmação da psicanálise. E o filme 'Ad Astra: Rumo às Estrelas' bebe bastante dessa fonte, já que o principal objetivo de seu protagonista é, justamente, não se tornar o próprio pai - ou não ser como ele, no caso.


Esse temor se expressa com uma sutil apresentação de cenas onde a fotografia angular se repete, causando uma ligeira confusão proposital no que diz respeito ao tempo do próprio filme, como se fossem frames que retornam em loop após um certo período de tempo. Um exemplo disso é o close na face do protagonista enquanto ele vagueia pelo espaço em meio a uma queda turbulenta no começo do filme, que é similar ao close dado em um momento chave no final da obra. Essa linguagem audiovisual deixa clara a mensagem de que tudo se repete, de alguma maneira, e isso explicita os dilemas do protagonista acerca de seu ente paterno. A figura controversa do pai, quando encarada pelo ponto de vista do filho, é ao mesmo tempo inspiradora e cercada por rancores - e o filho (Brad Pitt), por mais que tente, não consegue se desvencilhar da sombra do pai (Tommy Lee Jones). Mesmo sem perceber, o filho traçou o mesmo caminho que seu progenitor, mas de maneiras diferentes. Seguiu a mesma carreira, foi ausente com a família, e até viveu alguns acessos de ira, conforme confessado pelo próprio em uma das sessões de análise psicológica para testar a capacidade do mesmo em prosseguir com a missão.

O filme é um jornada, nos vários sentidos que a palavra "jornada" possui. Sua estrutura remete ao imaginário de um vídeo-game, onde fases tem que ser passadas até chegar ao objetivo final (ou ao chefão, que também é uma interpretação cabível). Isso faz com que o filme tenha um recheio interessante, com elementos que lembram 'Mad Max: Estrada da Fúria' e 'Vida', além da cena de abertura, que é muito parecida com a cena de queda livre do 'Star Trek' de 2009. No entanto, o principal entendimento sobre "jornada" se faz no espectro introspectivo, na evolução do protagonista sobre si mesmo. A descoberta espacial com a confirmação ou não de vida extraterrestre é um mero pano de fundo (muito bem feito e tecnicamente preciso, devo dizer) para a descoberta que o indivíduo faz sobre si enquanto revê os próprios conceitos e prioridades de vida. O 'homem-feito", sisudo, focado, dono de um auto-controle invejável e amante do isolamento que vemos no começo do longa (e que conhecemos melhor através dos pensamentos expressos em narrações off), mostra ser um indivíduo sensível e ressentido já no meio do filme, deixando ao público a seguinte pergunta: ele sempre foi assim ou foi a viagem que o transformou?

No que diz respeito ao espaço, 'Ad Astra' é uma belíssima obra com ares contemplativos tal qual a '2001: Uma Odisseia no Espaço', de Stanley Kubrick. Os reflexos nos capacetes, o vislumbre da vastidão, e o temor de pânico mesclado com respeito perante a própria pequenez diante da imensidão do universo são traços que enriquecem ainda mais a obra de James Gray (diretor que ama desbravar ambientes, vide 'Z: A Cidade Perdida'). Porém, o que melhor representa o vácuo espacial aqui é o distanciamento entre pai e filho, seja ele físico ou emocional, e o vazio que uma relação de ausência pode provocar na vida de quem busca a confirmação de sua referência de vida. ‘Ad Astra’ é um filme intimista, frágil e igualmente ágil. Não é um filme para todos os públicos, apesar de merecer ser visto. Todavia, recomendo veementemente.


Super Vale Ver !


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