PiTacO do PapO - Dois Papas | 2019

NOTA 9.0

Por Rafael Yonamine @cinemacrica

Entre altos e baixos, com "Dois Papas", Fernando Meirelles no mínimo demonstra versatilidade. O novo longa do diretor, na verdade, faz muito mais do que isso. De uma temática potencialmente entediante, Meirelles eleva uma ficção com áreas documentais brilhante. Mais do que isso, corresponde à expectativa de uma grande aposta da Netflix e a orquestração de grandes astros e insumos espinhosos. O peso da responsabilidade definitivamente não pesou sobre a mão do diretor.

O contexto está compreendido entre as duas últimas transições papais: a que se inicia com Bento XVI e se estende ao atual papado de Francisco. O roteiro poderia perfeitamente transitar por registros documentais ou passagens formais. Entretanto, o viés da estaticidade é criativamente contornado com uma dosagem precisa da porção não ficcional. Quando utilizada, as formalidades ainda conseguem incorporar elementos interessantes como os bastidores do funcionamento do processo da eleição papal. Saindo desse terreno, local onde o filme se apropria em maior volume, passamos a apreciar a habilidade de retratar o convívio de duas autoridades religiosas. Esqueça a monotonia e ceda lugar para a leveza baseada em palavras profundas, mas banhadas em irreverência.

Antes do verbo, vêm as caracterizações. A elegância na forma de revelar os traços dos dois papas é perene. No banheiro do Vaticano, um cardeal assobia "Dancing Queen" ao lavar as mãos, na pia ao lado, Bento XVI pergunta que canção era aquela. A partir daí fica demonstrada a capacidade de desenvolver sutilezas e estabelecer a razão pela qual Jorge Bergoglio, o futuro papa, estava descontente com os rumos demasiadamente tradicionais da igreja católica. O brilhantismo dos gestos também se refletem nos diálogos. Mesmo somando 2h, as conversas entre os papas são submetidas a uma dinâmica imersiva. Credito o mérito à qualidade dos textos, que sabe ser profundo e recorrer ao humor fino quando necessário, e a atuação irrepreensível da dupla Anthony Hopkins e Jonathan Pryce.

Mesmo reconhecendo alguns exageros, como as sucessivas tentativas frustradas de  Bergoglio em conseguir a assinatura de Bento XVI para sua renúncia, "Dois Papas" é um dos pontos altos do ano.

Super Vale Ver !