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'Indianara' : muito mais que um documentário sobre transsexuais, é a história de um país dividido | 2020

NOTA 9.0

Por Rogério Machado


A primeira tomada do documentário que foi destaque na mostra ACID, do Festival de Cannes, e concorrente à Queer Palm, premiação dedicada a filmes com temática LGBT participantes do festival francês,  é crua e já entrega tons pesados empregados na narrativa dos cineastas Marcelo Barbosa e Aude Chevalier-Beaumel.  Um cemitério, um caixão barato, e provavelmente mais uma morte dentro da estatística de um país que está entre os que mais matam travestis e transsexuais.  No discurso, durante o enterro, Indianara vocifera olhando para a árida terra coberta de cruzes de madeira: - Quem é hétero? Quem é lésbica?  Quem é travesti? Quem é transsexual? Olha aí onde tudo termina?  É tanta briga por identidade de gênero, orientação sexual... Pra que? Cadê agora? 


Indianara ,a ativista de 48 anos que dá nome ao filme e é retratada aqui, há pelo menos três décadas  atua em defesa dos direitos de transexuais, mulheres, prostitutas e do acesso à saúde e à educação. O Brasil é o país que registra o maior número de mortes de pessoas trans no mundo, segundo a organização não governamental Transgender Europe (TGEU), com sede na Alemanha. Um a cada dois dias, pessoas são mortas com uso de arma de fogo. Indianara roda o país em palestras alertando para estas estatísticas.

Desde 2016, os cineastas acompanham a ativista durante seu cotidiano e na sua atuação na Casa Nem. Sendo uma das idealizadoras do projeto , o local abriga  pessoas LGBTs em situação de vulnerabilidade, no Rio de Janeiro. Em sua luta, ela teve o apoio da então vereadora Marielle Franco, que foi assassinada em março de 2018. O documentário vai além de pleitear o fim da invisibilidade de prostitutas, travestis e transsexuais, e se torna um recorte histórico que vai desde o movimento Fora Temer, passando pela surpresa da fatídica morte de Marielle , até as eleições em 2018 que nomeou Jair Messias Bolsonaro como o novo presidente do Brasil. 

Mesmo de cunho altamente político e tratando de assuntos sérios que se ramificam além dos direitos das minorias, o longa ainda consegue momentos de humor dentro do universo particular de Indianara, que junto com suas fiéis protegidas, protagonizam cenas que, além de captar espontaneidade também são hilárias. Não raras vezes somos pegos em risos ou gargalhadas. O tom de crítica é uma constante, mas a figura forte da protagonista acaba também levando o espectador de forma leve para dentro do seu mundo, cujos problemas estão longe de serem entendidos e muito menos resolvidos, mas que estranhamente refrigeram nossa esperança de que outras como Indianara, que lutam por causas de igualdade, existam ou surjam por aí. 

Super Vale Ver !

NOTA:  Indianara é proibida de entrar na França por já ter sido condenada e presa, entre 2007 e 2009, pelo crime de cafetinagem. A condenação é mais um elemento intrigante na história da protagonista, acrescenta o diretor Marcelo Barbosa, em entrevista: “Indianara é uma personagem complexa. Ela é um ponto fora da curva também por não ser perfeita. Viveu na Europa e teve problemas com a Justiça. Aliás, mesmo já tendo cumprido sua pena, não pode voltar à França”.  Fonte: Agência Brasil. 



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