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'Instinto' coloca na mesa o estranho magnetismo do assédio | 2020

NOTA 7.5

Por Rogério Machado 

Existem linhas que não devem nunca serem cruzadas. O resultado desse rompimento quando ele acontece, produz efeitos irreversíveis. Esse pensamento ficou martelando em minha cabeça durante a sessão de 'Instinto', filme representante da Holanda no Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2020, lançado por aqui no início do ano. O tema pesado pode reverberar de diversas formas no público, mas é certo que, principalmente por ser um filme produzido, roteirizado e dirigido por uma mulher, causa estranheza a forma como se dá a abordagem da violência sexual. 


Na trama conheceremos Nicoline (Carice Van Houten), uma psicóloga experiente, que inicia um novo emprego em uma instituição penal, apesar de ter decidido nunca mais voltar à psiquiatria. Ela conhece Idris (Marwan Kenzari), um homem inteligente com um distúrbio de personalidade antissocial e narcisista, que cometeu uma série de crimes sexuais graves. Após cinco anos de tratamento, ele está prestes a ter sua primeira saída em liberdade condicional desacompanhada. A equipe de profissionais da instituição está entusiasmada com o desenvolvimento e comportamento do condenado, mas Nicoline não confia que o rapaz se reabilitou. Ela tenta adiar a soltura, para o espanto de seus colegas de trabalho. Idris tenta ao máximo convencer Nicoline de suas boas intenções, mas, como ela permanece cética, ele vai ficando gradualmente mais violento em relação a ela, transformando-se em um homem manipulador – o que Nicoline viu nele desde o começo. Um jogo de poder surge entre os dois e Nicoline, apesar de seu conhecimento e experiência, deixa-se envolver, e acaba em uma situação muito tensa e perigosa.

Van Routen (muito conhecida por viver a Melisandre de 'Game of Thrones') exprime com grande desenvoltura as nuances de uma mulher que demostra desconforto com carinhos e exposição de sentimentos. Idris, por seu passado violento e pela postura rude, de alguma forma desperta curiosidade em Nicoline. A conexão desse ser selvagem com a ausência de sentimentos da personagem protagonista parecerá providencial para que ela se entregue, sem que isso se revele uma fraqueza. Esse jogo é atrativo e envolvente enquanto trama, mas pode cair numa questão imperdoável: a romantização do assédio. 

Sim, o roteiro de estreia de Halina Rejin pode incorrer nesse erro, muito embora consiga, no minuto derradeiro, reverter a sensação de romantização do tema e promover o sempre curioso final aberto. Não dá pra negar a boa sacada ao esconder as reais motivações e intenções dos personagens, e mesmo depois dos créditos subirem, ainda ficaremos na dúvida sobre elas. 'Instinto' é um drama potente, bem conduzido, que se deixa levar pelo apelo do suspense e se descuida do politicamente correto, mas que ainda sim se estabelece com saldo positivo. 


Vale Ver !











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