Com uma mistura de autobiografia e ficção, “Ontem Havia Coisas Estranhas no Céu” vai fundo na melancolia e tédio familiares | 2020
NOTA 7.5
Por Karina Massud @cinemassud
A classe média-baixa brasileira sempre viveu entre altos e baixos, há tempos de alguma fartura e outros de muitas dificuldades causadas por sucessivas crises econômicas, desemprego e mudanças bruscas de vida. A família do diretor Bruno Risas (originalmente produtor e diretor de fotografia) é um perfeito exemplo de família que entra numa bola de neve de derrotas: o pai perdeu o emprego, a mãe se sente invisível e tratada como inútil, a irmã vive de subemprego e a avó está ficando senil. Esses percalços fizeram com que voltassem a morar na velha casa do bairro do Bresser, no subúrbio de São Paulo, num dia-a-dia onde focam nas pequenas coisas como cortar a unha da mãe, trocar a antena da casa ou fazer faxina, tudo para não sucumbir à tristeza que os ronda desde que a vida degringolou. Um retrato genérico de muitas famílias próximas de nós.
Em sua estreia como diretor Bruno nos leva ao quotidiano de sua família que ele vem filmando há muitos anos e só agora teve a ideia de compilar os registros caseiros nesse inusitado documentário autobiográfico e metalinguístico com um pequeno toque de ficção, com câmeras visíveis que viraram membros da família, quebra da quarta parede e narração em off que nos envolvem e intrigam a cada minuto.
Sua mãe Viviane tem um magnetismo ímpar que a torna, mesmo que a contragosto, a protagonista e espinhal dorsal dessa história que cheira à desesperança, e que com sua simplicidade mantém a audiência ligada e no aguardo de que algo de muito bom aconteça com aqueles personagens. Ela ri, segura as lágrimas, reflete sobre os antigos empregos que ficaram num passado feliz e comenta o roteiro enquanto o lê, tudo sem muitos cortes, pois os bastidores são parte da produção.
O desfecho é de uma delicadeza e tristeza cortantes, que junto de um curioso elemento fantasia servem de alegoria para a vontade de sumir daquela vidinha medíocre sem alegrias ou propósito. A vida não foi muito generosa com essa família que sonhava com mais do que teve mas que não vê saída pros problemas senão fingir que nada aconteceu e seguir em frente. A nós espectadores resta apreciar esse belo documentário e sentir o vazio deixado por ele.
Vale Ver !
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