'Curral' escancara as vergonhosas campanhas eleitorais no interior mais pobre do Brasil | 2020
NOTA 8.0
Por Karina Massud @cinemassud
Eleições 2020, 2016, 2022, não importa o ano, a bandalheira é sempre a mesma: pesquisas fraudulentas, baixarias, propagandas ridículas, compras de votos e agora as fake news, a mais nova praga que assola o universo.
“Curral”, filme do diretor Marcelo Brennand que é um dos destaques da 44ª Mostra de Cinema Internacional de SP, segue uma abordagem quase documental, pois apesar de ser ficção, é um retrato realista do processo eleitoral brasileiro, onde pessoas em situação de maior vulnerabilidade se vendem por pouco no famigerado “curral eleitoral”. Água é moeda de troca, pois vale mais que ouro em alguns lugares desse país riquíssimo em reservas de água doce mas mal administradas por governos cada vez piores. Demagogia aliada a jingles chiclete, candidatos que mais parecem bonecos de cera de tanto photoshop nos santinhos, promessas que morrem no dia seguinte à eleição , sorrisos e apertos de mão falsos. Mesmo que na sua cidade não ocorra essa “política do cabresto” você certamente sabe que ela existe em muitos lugares pobres, pois carência é o que não nos falta.
Chico Caixa (Thomas Aquino, ator excelente e em ascensão) é o anti-herói do povo que perde o emprego por levar um caminhão-pipa até o bairro “Caixa D'água”, nome irônico pra um lugar seco ao extremo como tantos outros do interior de Pernambuco. Ele precisa sustentar o filho, e por isso aceita trabalhar na campanha do amigo de infância Joel ( Rodrigo Garcia), advogado que pleiteia a vaga de vereador da cidade prometendo fazer uma “política diferente” e comprometida com os problemas do povo, mas que acaba usando a “verba” do partido para comprar votos e se aliar ao ex-inimigo sem escrúpulos. Caixa acreditava na mudança mas foi tragado para o mar de lama, o que o mergulha numa crise de consciência por trair seu povo, e é em volta desse impasse moral que a trama se desenrola. Daí vem um questionamento importante: será que é possível uma pessoa honesta e bem intencionada quebrar o ciclo vicioso do clientelismo político?
“Curral” não mostra uma solução, apenas denuncia o problema gravíssimo da manipulação de eleitores e troca de votos por 50 reais, por favores, empregos e consultas médicas. O povo brasileiro não está valendo nada, é um povo com uma autoestima massacrada que no desespero se rende à corrupção rasteira, se vendendo por coisas que são seus direitos básicos. Nesses lugares onde falta tudo e principalmente perspectiva de um futuro melhor, ter questionamentos éticos não é prioridade.
Tristes trópicos que parecem não ter salvação ou vislumbre de esperança, onde num piscar de olhos vende-se a única e mais poderosa arma de que o povo dispõe para mudar o cenário democrático: o voto.
Vale Ver !
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