Os detalhes de ‘Mulher-Maravilha 1984’ - Com Spoilers | 2020
Por Vinícius Martins @cinemarcante
Clique aqui para ler a nossa crítica sem spoilers.
‘Mulher-Maravilha 1984’ é uma obra riquíssima, cheia de detalhes que podem passar despercebidos pelo grande público - assim como alguns defeitos que poucos podem ter notado. E é sobre esses detalhes que vamos comentar agora, com a honestidade de um cinéfilo que também é fã de adaptações de histórias em quadrinhos.
⧪ O retorno de Hans Zimmer
Depois de trabalhar em ‘Batman vs Superman: A Origem da Justiça’, em 2016, Hans Zimmer anunciou, no programa HARDtalk, da BBC, que se afastaria dos filmes de super-heróis. “Eu decidi me aposentar oficialmente desse subgênero”, disse ele. Contudo, foi Zimmer o responsável pela trilha sonora de ‘X-Men: Fênix Negra’, de 2019 (um trabalho excelente, devo destacar, e que é a melhor coisa do filme). O longa dos mutantes tem uma pegada mais inclinada ao drama do que ao gênero de heróis, mas ainda assim não deixa de ser um filme do tipo. Após isso, ele foi anunciado como o compositor de ‘Mulher Maravilha 1984’ e teve seu retorno confirmado para a versão do diretor de ‘Liga da Justiça’, que será lançada em março de 2021 (informação divulgada recentemente pelo próprio Zack Snyder). Não podemos afirmar com plena certeza sobre a$ razõe$ que fizeram Zimmer voltar atrás com sua declaração anterior, mas gosto de imaginar que exista entre ele e sua obra algum tipo de apego emocional, uma vez que foi ele quem compôs o tema da Mulher-Maravilha e ditou o tom sóbrio e sombrio das notas dos dois primeiros filmes do universo cinematográfico da DC.
Desse modo, sendo ele também o compositor deste novo filme, houve o resgate de um tema de ‘Batman vs Superman’ que não tem nada a ver com a jornada da Mulher-Maravilha e que os fãs mais ávidos certamente se lembram como “a canção do momento Martha”. A faixa ‘A Beautiful Lie’ (clique aqui para ouvi-la no YouTube) é também a trilha que abre o filme de 2016, com a exibição da infância de Bruce Wayne e o assassinato de Thomas e Martha. Apesar de parecer deslocada para a maioria das pessoas, a trilha se encaixa perfeitamente com a mensagem pregada em MM84, tanto na conclusão da sequência de abertura na Ilha de Themyscira quanto na cena onde a faixa de fato aparece, na batalha final do longa. Ao resgatar “Uma Bela Mentira”, Zimmer dá um novo significado à sua melodia melancólica, que agora passa a transmitir esperança em lugar à solidão. A faixa tem tudo a ver com o discurso da protagonista, que desde pequena foi ensinada a combater a mentira, por mais bela, agradável ou fácil que ela possa ser.
Assim sendo, não há nenhuma conexão com o fator Martha mas sim com o título da música.
⧪ Mulher-Maravilha 2: A Ameaça de Electro
Existem tantas semelhanças entre ‘Mulher-Maravilha 1984’ e ‘O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro’ (2014) que eu decidi listá-las, para título de comparação.
✔Ambos os filmes tem a trilha composta por Hans Zimmer.
✔É construída a jornada do coadjuvante fracassado e atrapalhado até “tropeçar” em uma solução milagrosa e acidental aos seus problemas, fazendo-o crescer até se tornar um vilão fascinado com o poder adquirido, que luta para defender o novo status e não perder o que o torna especial.
✔Um vilão passa por uma intensa transformação física para a sua batalha final.
✔A penúltima batalha, já no clímax do filme (entre o herói e o vilão que era um fracassado), ocorre em meio a torres elétricas.
✔O herói tem que se despedir do seu par romântico e aprender a lidar com o luto.
✔Um vilão chamado Maxwell.
Troque os termos “herói” e “vilão” por “heroína” e “vilã” e voilà! Está descrito ‘Mulher-Maravilha 1984’.
⧪ Santa ignorância, Batman!
Os Princípios da Lógica Formal, criados e desenvolvidos por Aristóteles, consistem na veracidade das ideias. O segundo princípio, chamado Princípio da Não Contradição, explana que um pensamento pode ser verdadeiro ou pode ser falso, mas nunca simultaneamente ambas as coisas. Os roteiristas e executivos da DC parecem ignorar completamente esse princípio, uma vez que ‘Mulher-Maravilha 1984’ é mais um filme a quebrar a coerência do próprio universo estabelecido em que está inserido. Em ‘Liga da Justiça’ (2017), Bruce Wayne diz para Diana que nunca tinha sequer ouvido falar dela até Lex Luthor encontrar uma foto em que ela aparece com Steve Trevor e o grupo formado por eles durante a 1ª Guerra Mundial. Esse ponto foi totalmente esquecido - ou convenientemente ignorado - na construção de MM84, que traz a heroína de volta às telonas com uma trama solo que, como o próprio título já sugere, ocorre no passado - e, portanto, antes dos eventos apresentados em ‘Liga da Justiça’. Se Diana Prince só deu as caras no “mundo dos homens” em meados da década de 1910, como é que ela foi a figura central de uma conspiração mundial dos anos 1980?
É claro, ela poderia ter interferido ocasionalmente impedindo um atropelamento aqui ou ali, mas com tantas interferências no “curso normal” do mundo certamente haveria evidências e testemunhas de sua presença singular. E o pior: ao final do filme ela salva o mundo inteiro em um evento de escala global, se revelando a todos com seu pedido de renúncia aos pedidos feitos, e naquela época o Bruce Wayne de Ben Affleck já era vivo há muito tempo. Diana correu com os trajes de Mulher-Maravilha por shoppings, avenidas movimentadas, cruzou fronteiras e rodou o mundo uniformizada como heroína, e não há um único registro ou menção a ela em lugar nenhum? Francamente, um acontecimento como o mostrado em MM84 seria lembrado por todos, e não passaria despercebido pelo Batman. Fica registrada a esperança de que a versão oficial de Zack Snyder de ‘Liga da Justiça’ corrija esse comentário de Bruce Wayne (já que o filme passou por gravações adicionais nas últimas semanas) e que o filme de 2017 seja ignorado do cânone. Ou que, no mínimo, essa contradição seja justificada no vindouro filme do Flash, que deve apresentar o conceito de multiversos ao universo cinematográfico da DC.
⧪ 2x Marco Ribeiro
A dublagem brasileira é uma das melhores do mundo - quiçá a melhor -, mas está passando por alguns momentos de escassez. Depois de Alexandre Moreno dublar dois personagens importantes do universo cinematográfico da DC (Sammer, no primeiro ‘Mulher Maravilha’, interpretado por Saïd Taghmaoui, e o Coringa de ‘Esquadrão Suicida', vivido por Jared Leto - fora a meia dúzia de personagens que viveu no MCU), chegou a vez de Marco Ribeiro emprestar a voz para dois personagens distintos, dessa vez no mesmo filme.
Você talvez não conheça o nome, mas com certeza deve se lembrar da voz. Marco é o dublador de Robert Downey Jr. no universo dos Vingadores desde o primeiro filme do Homem de Ferro, lá em 2008. Ele também é a voz de Tom Hanks na maioria de seus filmes, inclusive na franquia de animação ‘Toy Story’. Também dublou Michael Kyle em ‘Eu, a Patroa e as Crianças’, série que fez a alegria de muita gente nas tardes do SBT.
Aqui em ‘Mulher-Maravilha 1984’ ele dá voz a um dos assaltantes na cena do shopping, logo no início do filme, e depois dubla também o narrador informativo aos visitantes do museu Smithsonian. Muita gente não deve ter percebido, mas fica o registro da curiosidade para quem se interessar. Se você vai ver ou rever o filme em uma cópia dublada, preste atenção a esse detalhe!
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Por último, mas não menos importante, recomendo a leitura do conto ‘A Mão do Macaco’, de William Wymark Jacobs. O conto marcou a transição entre a minha infância e a adolescência (junto com ‘Pesadelo a 20.000 Pés’, de Richard Matherson, que é outra recomendação pessoal). ‘A Mão do Macaco’ é importantíssimo para uma compreensão mais ampla dos diálogos de ‘Mulher-Maravilha 1984’, inclusive para entender os contextos de quando alguém o cita (no filme o chamam de ‘A Pata do Macaco’, na dublagem brasileira). Eu comentei sobre ele na crítica sem spoilers, cujo link você encontra no topo da página. Não deixe de ler!
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