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Simone Spoladore ilumina a tela em 'O Livro dos Prazeres' , adaptação de Clarice Lispector | 2020

NOTA 8.5

Por Rogério Machado 

A obra de Clarice Lispector não é para os fracos,  muito menos para os conservadores, não é para aqueles que impõem limites a si e nos outros. 'Liberdade é pouco. 'O que eu desejo ainda não tem nome...' Uma das frases mais célebres, dentre tantos poemas marcantes da escritora ucraniana naturalizada brasileira,  parece ser também uma das marcas de Lispector, que penso eu, se volta muito para o público feminino e na autoafirmação da mulher nos mais diferentes meios ou classes sociais. 


Livremente adaptado na obra 'Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres', o longa ficcional de estreia da cineasta Marcela Lordy, que foi destaque na Mostra SP e deve chegar em breve aos cinemas, tem na sua protagonista o maior exemplo da mulher desmotivada em tudo o que faz. Seja no amor, na relação com a família e até na interação com seus alunos ou colegas de trabalho. A história, orginalmente escrita em 1969, situa sua narrativa nos tempos atuais em moldes muito atraentes, diga-se de passagem. 
 
Lóri (Simone Spoladore) é uma mulher que vive a monotonia entre   uma rotina de trabalho como professora no ensino fundamental,  e relacionamentos furtivos com muito sexo casual,  até que conhece Ulisses (Javier Drolas), um professor de filosofia argentino, egocêntrico e muito provocador. É com ele que Lóri aprende a amar enfrentando sua própria solidão. A mulher até então seca e que bloqueava envolvimentos de qualquer ordem , entra  numa jornada de investigação íntima, de cara a cara com suas angústias e dores, (entre elas a morte de sua mãe),  numa trajetória só possível pelo encontro e  a troca de aprendizado entre os dois.

No primeiro ato a narrativa nos mostra  Lóri em um apartamento com poucos móveis (alguns fora de lugar), sem luz e numa total desorganização. A  insônia é companhia constante e que por vezes era preenchida com sexo encontrado através da caça em bares ou pela rua. Lóri é a própria desordem, e a aquela habitação refletia o que vinha de dentro dela. A ausência materna, a falta de amor. e a total desmotivação em buscar felicidade. Toda companhia que representasse aconchego e avançasse na intimidade do sentimento era repelida. Essa mulher, brilhantemente interpretada por Spoladore, é o próprio mistério, que mais tarde se revelará e entregará as respostas ao público. 

As mulheres de Lispector são donas de si e espirituosas,  mas ao mesmo tempo frágeis. Não se entregam com facilidade, mas são adoráveis. Lordy constrói uma narrativa atraente e elegante, tudo pulsa, inclusive a vontade que a heroína de sua história tem de se lançar, mesmo que essa vontade venha tarde demais... aliás, quando é tarde? 


Vale Ver !








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