'Cherry – Inocência Perdida', o drama antiguerra infinito dos Irmãos Russo | 2021
NOTA 5.5
Por Alan Ferreira @depoisdaquelefilme
Recém-chegado à plataforma Apple TV+, “Cherry – Inocência Perdida” é o aguardado retorno dos irmãos Joe e Anthony Russo após anos por trás das câmeras nas mais bem sucedidas produções do MCU. E como os rapazes não são bobos nem nada, eles quiseram aproveitar na empreitada a exitosa parceria com Tom Holland, ator ainda mais popular desde que passou a vestir a fantasia do Homem-Aranha, para trazer às telas um projeto mais pessoal, no caso, a adaptação do romance de Nico Walker.
Narrado pelo protagonista, o longa pretende abarcar uma trajetória que percorre quase duas décadas de uma vida destroçada por traumas adquiridos na Guerra do Iraque e pela busca por algum alívio no também devastador mundo das drogas. Traçado desde a gênese para ser um tratado antibelicista, o roteiro de Jessica Goldberg mantém a estrutura em capítulos, alternando de forma quase matemática uma escala menor, quase intimista, com o tom grandioso de uma superprodução.
Já a direção dos Irmãos Russo parece atirar para vários lados sem jamais atingir qualquer alvo. Embora surjam momentos como os passados em batalha, que até trazem à lembrança o reconhecido talento da dupla para sequências de ação, não demora para que eles tropecem no campo minado das referências gratuitas como, por exemplo, na mudança da razão de aspecto da obra, numa clara tentativa de emular a estética de projetos como “Nascido para Matar”. Aliás, impressiona a quantidade de obras que não resistem à tentação de evocar o clássico de Stanley Kubrick quando precisam retratar a dureza do treinamento militar e como ele pode afetar a cabeça de jovens soldados.
Mas o grande problema do filme é a forma como ele trabalha o drama do paramédico que retorna para casa com Transtorno de Estresse Pós-Traumático e de sua esposa, vivida por Ciara Bravo. Expondo uma tremenda falta de imaginação no segundo ato, pós-guerra, os diretores lançam mão de uma sucessão de cenas do casal se injetando heroína e passando por todos os clichês já mostrados à exaustão sobre o dia a dia dos dependentes químicos. Tal opção narrativa faz com que o longa se arraste, capítulo a capítulo, sem que ao menos haja qualquer preocupação de desenvolvê-los em suas relações com os familiares, que são lembrados numa cena rápida de hospital e logo esquecidos.
Diferente do que foi feito no terço final do premiado “Guerra ao Terror” na abordagem da rotina de um ex-militar que se torna incapaz de se reconectar com sua vida pregressa, a opção aqui é jogar para longe qualquer sutileza e apostar numa ciranda tragicômica – na qual as decisões estéticas evidenciam ainda mais o foco em primeira pessoa – entre o retrato dos efeitos do vício e a consequente necessidade de dinheiro que transforma o protagonista num improvável assaltante de bancos.
Pretensioso na maior parte de sua longa rodagem e com um final que mais se assemelha a um videoclipe criado de última hora para acelerar uma solução, “Cherry – Inocência Perdida” é bagunçado na administração de seus vários intuitos, sendo o principal deles mostrar a guerra infinita travada na mente de quem viu os maiores horrores em combates sem sentido. Ao menos, esse tour de force (inclusive para o espectador) serve para confirmar Tom Holland como um ator de primeira grandeza. Assim como se viu em “O Diabo de Cada Dia”, o ator se sobressai dentro de uma história que se acha muito mais profunda do que realmente é e ainda consegue sair ileso dos golpes narrativos vindos das mãos pesadas de uma dupla de seres superpoderosos que deveriam atuar como seus aliados.
Nem Vale Ver!
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