O incrível fim do mundo em ‘Amor e Monstros’ | 2021
NOTA 9.0
“Até que a natureza é legal quando não tá tentando te matar”
Por Vinícius Martins @cinemarcante
A excelente comédia romântica ‘De Repente É Amor’ (2005), estrelada por Amanda Peet e Ashton Kutcher, tem uma cena bastante memorável em que o casal de protagonistas vai até um deserto e tira uma foto sem roupas, à luz da lua. Momentos antes dessa foto, no entanto, há um diálogo sobre o capô do carro onde Emily (Peet) diz a Oliver (Kutcher) que se você não está disposto a parecer estúpido, então não merece estar apaixonado. Aquele raciocínio parece simplista, principalmente se olhado da atualidade, mas se encaixa perfeitamente com o caráter apocalíptico de ‘Amor e Monstros’, novo filme a chegar ao catálogo da Netflix produzido pela Paramount. Nesse caso aqui, a estupidez consiste em atravessar uma fração significativa dos EUA a pé só para encontrar a garota amada que não vê há sete anos - mas com o detalhe de que o mundo se tornou um lugar perigosíssimo e há milhares de monstros na superfície, ocupando o caminho a ser percorrido pelo herói apaixonado.
Mesmo com tudo contra ele e chances crescentes de ser morto a qualquer momento, ele vai avançando em seu caminho repleto de cuidados detalhados pela equipe de design de produção e pelo departamento de efeitos visuais (categoria em que o filme concorre ao Oscar em 2021). Se tem uma coisa em que ‘Amor e Monstros’ acerta é na ambientação. O filme, dirigido por Michael Matthews e produzido por Shawn Levy sobre o roteiro de Matthew Robinson e Brian Duffield, é uma comédia de situações inusitadas que constrói sua própria versão do fim do mundo. Não é uma obra redondinha, é claro, mas as pontas soltas podem ser facilmente ignoradas se o público não procurar complexidade onde não é para ter. Afinal, quem é que se perguntaria quais seriam as razões de só a estrutura genética dos animais ter sido alterada com a exposição dos componentes do asteróide e os humanos continuarem normais? E quem questionaria que o único animal normal que aparece no filme seja, convenientemente, um cachorro que aparece no momento mais apropriado como um deus ex-machina? Afinal, cachorros não são afetados? Enfim, deve-se desligar o cérebro para as perguntas mais escabrosas e aproveitar o passeio que esse road-movie tem a oferecer - e devo dizer, que passeio agradável! A natureza aqui é belíssima, mesmo quando é ameaçadora, e os traços dos monstros se costuram nas amarrações do roteiro com uma precisão cirúrgica, oferecendo toda a urgência que a trama exige.
Nos atuais tempos da pandemia, o simples ato de “sair do subsolo e encarar os monstros que estão na superfície” pode ser facilmente comparado ao “sair de casa e encarar os monstros que estão lá fora, na rua”. Mas o cinema é uma arte que constantemente ensina coisas importantes, sendo um reflexo ativo do mundo real até quando aborda temas fantasiosos; então, caso você precise ir para a rua, vá protegido e não traga um monstro para a sua casa ao retornar. Nos filmes, cada um usa a arma que tem para combater o seu monstro; então fica aqui o memorando para que você use a sua arma também. Use a máscara. Afinal, a chance de sobreviver é mínima se você não estiver preparado para a batalha cotidiana que temos enfrentado há meses. ‘Amor e Monstros’ se estabelece então, na vida real, como um escapismo divertido para a crise sanitária e é uma excelente fuga do estresse das manchetes jornalísticas do mundo ao nosso redor. E como filme ficcional, por outro lado, ‘Amor e Monstros’ é um memorando dos resquícios de humanidade que ainda nos restam, seja na apaixonada jornada de um jovem até sua amada ou no simples ato de enterrar algo ou alguém, que se revela como uma expressão de gratidão em meio à ferocidade do mundo.
Super Vale Ver!
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