'O Novelo': drama familiar nos chama a refletir sobre como processamos as perdas | 2021
NOTA 8.5
Por Rogério Machado
É certo que a adorável ação do tempo é capaz de amenizar dores fÃsicas e também feridas da alma. Algumas são mais difÃceis de descolar do coração, mas o tempo e o enfrentamento com amor pode sim amenizar mágoas profundas. 'O Novelo', drama familiar de Cláudia Pinheiro, aborda com sensibilidade os efeitos do tempo na vida de cinco irmãos ao ter que administrar o abandono do pai e em seguida a perda da mãe. O longa também está na mostra competitiva do Festival de Cinema de Gramado esse ano que vai ao ar todos os dias pelo Canal Brasil.
Na história conheceremos cinco irmãos: Mauro (Nando Cunha), Cicinho (Rocco Pitanga), Zeca (Sérgio Menezes), João (Rogério Brito) e Cacau (Sidney Santiago Kuanza), que acabaram sendo criados pelo irmão mais velho, Mauro, após a morte da mãe (Isabél Zuaa). Um dia, já adultos, eles recebem a notÃcia de que um homem em coma em uma UTI pode ser o pai, desaparecido há muitos anos.
Na sala de espera do hospital os irmãos mergulham em seus conflitos e memórias e, através do tricô aprendido na infância eles irão alinhavar as recordações das costuras que eram ensinadas aos cinco filhos pela mãe. É interessante notar como a simples figura de um homem com agulhas de tricot nos causa estranheza. O enraizamento da cultura machista e o estabelecimento de padrões é plenamente desconstruÃdo na narrativa conduzida por Cláudia Pinheiro, que promove uma espécie de queda da quarta parede com inédita ternura ao usar uma ação tão simples como forma de protesto à s normas estabelecidas pela sociedade.
Isso é claramente ratificado quando vemos o irmão mais velho fazer o papel de mãe dos demais irmãos, ou como quando o caçula encontra um batom nos guardados da progenitora e decide se maquiar, e ao ser surpreendido pelo irmão este não o exorta mas se une à ele. Sem dúvida uma das cenas mais comoventes e ternas que já pude ver - livre de preconceito, convenções e impregnada de doçura e inocência. A grande sacada da realizadora ao unir os cinco irmãos e suas memórias é lançar mão das bandeiras da representatividade e diversidade sem apelar para a militância. Somos levados pelo drama do reencontro desses cinco irmãos com o pai, além das lembranças com a mãe, e tudo que está intrÃnseco na realidade de cada um converge em uma narrativa que tem muito a dizer sem precisar ser verborrágica. A imagem muitas vezes é um tanto maior que mil palavras.
Vale Ver !
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