'Amigo Secreto': documentário reverbera o lado nefasto da operação Lava-Jato | 2022

NOTA 9.0

Por Rogério Machado 

Aqui com meus botões, acredito piamente que Maria Augusta Ramos esteja construindo, consciente ou não, uma trilogia de documentários: primeiro sobre o golpe, passando pelos desdobramentos da operação Lava-Jato e quem sabe (aqui entra um devaneio de quem vos escreve) da volta a esquerda ao Palácio do Planalto, como resposta a esse golpe arquitetado pela extrema direita. Estou falando de 'O Processo' (2018) , que acompanhou todo imbróglio que culminou na destituição da presidenta Dilma da cargo, e essa sequência, 'Amigo Secreto', que segue a investigação do presidente Lula através da Lava-Jato. Não dá pra dizer se um terceiro longa existirá, mas sonho que se ele acontecer que traga a notícia de bons ventos, aqueles vindos da democracia, aqueles que restabelecem o Estado Laico, a Cultura, o apoio à Ciência, às organizações indígenas e daqueles que protegem a Amazônia do desmatamento. 

No documentário, Maria Augusta parte da inquietação que move todo o seu cinema: a investigação da injustiça. Esse novo filme aborda  as averiguações da Operação Lava-Jato, que levaram à prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao posterior escândalo envolvendo juízes e procuradores, acusados de manipular informações e cometerem ilegalidades jurídicas, tendo como um dos personagens chave, a figura do jurista Deltan Dallagnol, que através de um grupo de Whatsapp (de nome amigo secreto) trocava mensagens com o então juiz Sérgio Moro. Pra quem não se lembra, Deltan é o responsável por aquele famoso powerpoint, que desenhou o cenário fictício de uma organização criminosa tendo como cabeça o ex presidente. 

 

A documentarista lança mão de três instâncias principais para traçar sua linha narrativa: o trabalho de jornalistas do The Intercept Brasil e do El País Brasil na apuração do que ficou conhecido como “Vaza-Jato”; imagens de arquivo, como o depoimento de Lula diante do ex-juiz Sergio Moro, figura-chave em todo o processo; e a costura de imagens contemporâneas de protestos e movimentações em torno de Jair Bolsonaro, eleito presidente da República em 2018. 

Maria Augusta permite que seus personagens, em especial os jornalistas, circulem pelo filme como se fizessem parte dele. No trabalho, em casa ou em entrevistas diretamente com suas fontes, figuras como Leandro Demori, Carla Jiménez, Regiane Oliveira e Marina Rossi têm documentadas as tensas rotinas de trabalho e a apreensão de estarem diante de um episódio que alterou sobremaneira os rumos do país.  Entrevistas com componentes da Federação Única dos Petroleiros, vídeos dos incontáveis interrogatórios e das sessões com os senadores, advogados e executivos da Odebrecht vão compondo uma grande colcha de retalhos que prova  que a famosa operação usada como amuleto pelos guardiões do movimento 'anticorrupção' não foi tão vantajosa assim para o pais. A fragilização da Lava-Jato resultou no desaparecimento de grandes quantias dos cofres públicos - chega a ser irônico tantos resultados nefastos em processos dentro da Lava-Jato que foram criados pela esquerda e depois foram usados para demonizá-la. 

Enquanto material documental 'Amigo Secreto' é impecável. É unilateral sim, mas coerente com sua verdade e a defesa de um lado. Nada passa despercebido aos olhos de Maria Augusta: a polêmica reunião com os ministros, que sinalizou  a interferência de Bolsonaro  na Polícia Federal, a ultrajante fala de Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente, o pedido de demissão de Sérgio Moro do ministério por considerar não ter autonomia no cargo, entre tantos momentos desconexos com o interesse público, nos mostram o quanto nós, enquanto povo, temos errado nas nossas escolhas. 

'Amigo Secreto' chega hoje aos cinemas. Assista sob a luz de um pensamento crítico e tire suas próprias conclusões.  

Super Vale Ver!