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'Lightyear' explora a construção do mito adorado por Andy em 'Toy Story' I 2022

NOTA 7.0

Um entretenimento casual divergente

Por Vinícius Martins @cinemarcante 

O fascínio por aventuras espaciais é uma constante no cinema mundial como parte da cultura pop desde os primórdios da indústria - Georges Méliès deixou uma ótima evidência disso em sua obra-prima 'Viagem à Lua' (1902). E hoje, em 'Lightyear', vemos referências a 'Star Wars' (1977 - atualmente), '2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), 'Gravidade' (2013) e até mesmo a 'Lunar' (2009), de Duncan Jones. Essas referências, entre outras que aparecem, são conexões que se erguem como tributos aos "pais" da fixação das últimas gerações por filmes do gênero. A ambição por ser tão icônico quanto os títulos a que confessa amor, porém, faz com que 'Lightyear' acabe pesando demais a mão em sua própria inclinação à grandeza e se torne muito 'Star Wars' quando deveria ser mais 'Star Trek', explorando o infinito e o além com o mesmo espírito das séries clássicas de TV, sem muita pretensão de ser maior do que realmente é.


É curioso perceber que o filme 'Lightyear', segundo constam nos autos, é o mesmo filme que despertou em Andy a vontade de possuir um boneco do patrulheiro espacial, lá no ano de 1995 - isso segundo o próprio diretor, Augus MacLane, em entrevista ao EW. Chegado aos cinemas daqui em 2022, o longa-metragem marca o retorno da Pixar às telonas após 3 lançamentos irem direto para o streaming Disney+ ('Soul', 'Luca' e 'Red'), tendo um deles vencido o Oscar em sua categoria. Seguindo a proposta que apresentou Buzz Lightyear ao público, essa diferença de quase 30 anos entre o lançamento do filme no mundo de 'Toy Story' e no nosso deveria tornar 'Lightyear' um acréscimo saudoso à mitologia do primeiro filme dos brinquedos vivos, mas o efeito que causa é efetivamente conflitante - bem, pelo menos no que se trata de cânone. 

É difícil imaginar esse filme como o mesmo visto por Andy por duas razões densas: a primeira é que este é um filme a frente do seu tempo (considerando 1995), tanto em tecnologia digital como também em abordagens e temáticas que, naquela época, ainda eram tabus (antes que questionem, a franquia 'Toy Story' tem fundamento na nossa realidade e segue a mesma datação que seguimos, sendo a única diferença os brinquedos conscientes); a segunda razão está diretamente ligada à liberdade criativa tomada com o Zurg, que aqui ganha uma complexidade díspar com tudo que se sabia sobre o personagem até então - chegando, inclusive, a contradizer alguns conceitos explorados nos dois primeiros 'Toy Story'. Quanto à tecnologia, quando colocados lado a lado é mais fácil dizer que 'Toy Story' é um filme dentro do universo de Buzz Lightyear do que o contrário. Os modelos animados de 95 permitiriam a crença de que Andy poderia ter visto algo "inferior" a si mesmo no cinema, algo como uma animação 2D convencional. O filme 'Buzz Lightyear do Comando Estelar', de 2000, se casava com muito mais eficiência no universo de 'Toy Story' como uma obra ficcional vinda de lá, mas infelizmente o filme é ignorado pela própria Pixar e nem mesmo no catálogo da Disney+ ele sequer entrou.

Entretanto, já que o assunto é a qualidade gráfica, é justo destacar quão nítido é o aprimoramento da Pixar com o passar dos anos e o cuidado que o estúdio tem com os detalhamentos de suas obras. Devo apontar, contudo, que o maior mérito de 'Lightyear' é a simplificação que o roteiro tem ao falar de temas complexos, tornando conceitos clássicos da ficção científica algo acessível ao público infantil ao empregar uma linguagem didática e objetiva, sem dar muito espaço para aprofundamentos às camadas da física que o filme mostra respeitar (o que acaba sendo meio incongruente, uma vez que aqui o som se propaga no vácuo num momento e no outro o silêncio espacial é respeitado). Enfim, de modo geral, 'Lightyear' é um filme legal mas que seria ótimo se não conflitasse com a própria obra do qual deriva. Tem muitas qualidades visuais, um roteiro que não reinventa a roda mas é dinâmico em abordagem, e personagens de alto potencial carismático.

E justamente por essas qualidades confesso que saí do cinema com a impressão de que havia acabado de assistir um episódio aleatório de 'Patrulha Canina' (quem tem filhos sabe do que estou falando), que se empenha em ensinar virtudes aos pequenos por meio de ações coordenadas de trabalho em equipe e interações que visam sacrifícios altruístas, sempre aplicando alguma lição nada sutil em sua conclusão para enfatizar a bondade e o respeito. Aqui, no caso, a jornada de Lightyear é bem diferente em ambientação e avidez do estúdio que o produz, mas não consegue tirar a impressão de ser apenas mais um produto comercial explorado por seu apelo nostálgico. É um terno feito sob medida para se encaixar a 'Toy Story', mas é uma pena que o alfaiate seja míope.



Vale Ver!



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