Dez razões para ver 'Top Gun : Maverick' no cinema
Top Gun enaltece o cinema como experiência sensorial
Por Vinícius Martins @cinemarcante
'Top Gun: Maverick' já é um dos maiores sucessos de 2022, tanto em crítica quanto em público e bilheteria. Seu lançamento original era previsto para dois anos atrás, mas não se deixe enganar: o filme não está atrasado, e sua estreia é bastante pontual em sincronia com a necessidade da atualidade de olhar para o passado e aprender com ele.
Pensando nas tantas qualidades que o filme possui em sua estrutura narrativa e também na perícia técnica que lhe compõe, conversei com os demais membros do Papo e concordamos que este filme é um evento que captura o ato de experimentar o cinema em sua essência, com uma qualidade primorosa e emocionante. Com isso, elaborei uma lista com curiosidades sobre o filme e algumas razões para que você, que está aí lendo, vá assisti-lo no cinema enquanto ainda há tempo - e caso você já tenha ido vê-lo, para te dar motivos para revisitá-lo.
➤ EDIÇÃO
Me recordo, de imediato, do filme 'Mad Max: Estrada da Fúria', que chegou aos cinemas brasileiros em meados de 2015 e conquistou o Oscar de Melhor Edição no ano seguinte, graças ao trabalho de Margaret Sixel na organização das mais de 480 horas de filmagens para um filme de duas horas de duração. A escolha sobre o que vai ou não para o recorte final é, por muitas vezes, algo difícil de fazer - e impor uma coerência narrativa e visual a um filme de ação intensa, deixando tudo nítido e concebendo ao público uma noção de espaço que permita a plena apreciação da ação definitivamente não é uma tarefa para qualquer um. Tem que ter talento, e isso os editores de 'Top Gun: Maverick' tem de sobra. Eddie Hamilton e Chris Lebenzon são os nomes deles; grave-os bem, pois você certamente os verá na próxima temporada de premiações. Lebenzon, que foi editor do primeiro filme 36 anos atrás, retorna para o posto com a missão de compilar as mais de 800 horas de filmagens de voos de modo a dar fluidez à trama e naturalidade aos cortes. E devo dizer: há muito tempo não havia uma edição tão bem trabalhada no cinema hollywoodiano.
➤ O TRABALHO DE SOM
Um dos maiores méritos de se assistir ao filme no cinema está na experiência que é a captação do som, e de igual maneira devo destacar a sua distribuição espacial cirúrgica, feita de modo a preencher todos os cantos da sala. É incrível o trabalho feito aqui, dimensionando as camadas sonoras que compõem a sensação ímpar de se estar dentro do cockpit dos caças apresentados no decorrer do longa. A dinâmica perceptiva de obstáculos, mísseis e até mesmo do atrito do ar ventando furiosamente é retratada com uma qualidade estonteante, e a imersão nas situações de risco se atenua graças à excelência da área sonora.
➤ EFEITOS PRÁTICOS
Tom Cruise, a princípio, não queria fazer um segundo filme de Top Gun; o astro foi convencido pelo diretor, Joseph Kosinski, em um curto intervalo de aproximadamente 30 minutos durante as gravações de 'Missão: Impossível - Efeito Fallout'. Após vender a ideia do roteiro e conseguir a atenção do intérprete de Maverick, Kosinski recebeu uma exigência do ator (e também produtor do filme em questão), que foi: O filme deve ter o mínimo de CGI possível. Com isso em mente, houve uma série de estudos para impor o máximo de verdade às cenas. Os voos são, em sua quase totalidade, reais; as cenas de interação nas cabines dos aviões não foram gravadas em computação gráfica, com uma tela verde no fundo, mas sim em aviões de verdade, durante voos e manobras de verdade. E isso nos leva ao próximo ponto: a verossimilhança
Uma das notícias que mais chamou a atenção na ocasião do lançamento do filme foi uma que trazia a informação que um satélite chinês saiu de sua órbita para fotografar o avião Darkstar, que é o modelo supersônico apresentado na primeira grande sequência de ação. A própria marinha dos Estados Unidos contou para a produção o que tinha acontecido. O produtor Jerry Bruckheimer relatou à imprensa, todo orgulhoso, que "um satélite chinês fotografou nosso avião. Eles realmente acharam que era real, porque construímos da forma certa." Kosinski, o diretor, destacou o cuidado de tornar as coisas mais reais possíveis. Sobre o Darkstar ele disse: "Aparece no filme ao lado de aeronaves reais como F-18, P-51 e muitas outras. Para que o público comprasse nosso avião como real, trabalhamos junto com as mesmas empresas que criam os verdadeiros."
Outro ponto que merece destaque são as reações e passagens físicas dos atores durante as manobras. É possível ver em seus rostos o peso da gravidade quando fazem curvas acentuadas ou dão guinadas evasivas, tanto em treinamento quanto em combate, e isso é o que mais efetivamente torna a encenação toda em algo crível. São atores, estão atuando, mas também estão submetidos aos efeitos reais do cenário em que foram colocados. Tem uma cena onde o personagem de Miles Teller está em um caça e é feita uma manobra rápida para cima e para baixo; nesse momento é nítida a expressão de calafrio em seu rosto, um quase medo provocado pelo desconforto pontual de estar flutuando dentro do avião, mesmo que por apenas alguns instantes. São cenas assim que elevam a experiência de assistir 'Top Gun: Maverick' a um patamar superior.
➤ A FOTOGRAFIA
Assinada pelo chileno Claudio Miranda, a fotografia de 'Top Gun: Maverick' é um colírio para os olhos. Miranda, para quem não conhece, foi o responsável pela cinematografia do excelente 'O Curioso Caso de Benjamin Button', lançado no Brasil em janeiro de 2009, e foi vencedor do Oscar de Melhor Fotografia em 2013 por seu trabalho primoroso em 'As Aventuras de Pi'. Aqui em 'Top Gun: Maverick' a iluminação das cenas é brilhante, e digo isso sem querer forçar nenhum trocadilho. A maneira como Miranda posiciona a câmera e explora o confinamento limitado das cabines dos aviões revela seu tato para o espaçamento, fazendo um ótimo uso de todos os ângulos e transportando o público para junto dos personagens. Vale estacar uma comparação entre duas sequências em particular, envolvendo o posicionamento da câmera perante os pilotos. Em cenas individuais de combate entre eles mesmos durante o treinamento, a câmera está sempre posicionada com os pilotos evidenciados ao centro do quadro; e na cena em que se encaminham para efetivar a missão, a câmera de dentro dos cockpits mostra os pilotos e a formação ao seu redor, um de cada lado, apresentando em tela que a equipe formada se fez como uma extensão uns dos outros, como uma unidade. A boa fotografia comunica muito, e o faz com sutileza e exatidão.
➤ UM ESPETÁCULO DE EMOÇÕES
'Top Gun: Maverick' é uma obra emocionante justamente por ser feita com o coração; e por ser absurdamente emocional, sua capacidade de alcance ao público se expande e abrange gerações que habitualmente não compartilham dos mesmos gostos. Suas passagens emotivas se dão desde a apreensão pelo risco iminente da missão como também pelo apelo aflorado (mas nada gratuito) da nostalgia, que aqui é elevada a níveis altíssimos. A potencialização de tais emoções rende um turbilhão de sensações que caminham de mãos dadas entre si. 'Top Gun: Maverick' é aquele tipo de filme completo, que entrega aventura, ação, comédia (em uma dosagem perfeitamente calibrada), suspense, guerra, romance (com uma química deliciosa de flerte e experiências passadas entre Penny e Maverick, que Jennifer Connelly e Tom Cruise entregam sem tirar o brilho de novidade entre eles após anos sem se verem), e também drama. O luto aqui se apresenta como uma memória do passado que, embora calorosa, também expressa algumas culpas e admirações. Entre surpresas e tradições oitentistas, este filme cativa principalmente pela coragem de ser o que é sem se curvar às demandas que já saturaram o mercado audiovisual atualmente.
➤ TRILHA SONORA
Quando se trata de roteiro, ver diversos nomes creditados pode significar uma bagunça descomunal no entrelaçamento de enredos e narrativas paralelas. Já no âmbito musical, as chances de se obter sucesso são muito maiores - e é exatamente o caso deste novo filme. Assinada por Lady Gaga (que também é a intérprete da canção principal, 'Hold My Hand'), Hans Zimmer (que venceu seu segundo Oscar este ano por 'Duna', de 2021), Harold Faltermeyer (que é o compositor da trilha sonora do primeiro filme, de 1986) e Lorne Balfe (responsável, entre outros sucessos, pelas trilhas do sexto e sétimo 'Missão: Impossível'), a trilha sonora de 'Top Gun: Maverick' é recheada por acenos nostálgicos, é claro (a reprise do tema principal nos créditos iniciais e a cantiga de 'Great Balls of Fire' no piano que o diga), mas não abdica de ter sua própria originalidade enquanto novo filme. A melodia de 'Hold My Hand' é pincelada em diversas passagens durante o filme, mas mais discretamente do que 'My Heart Will Go On' em 'Titanic', de James Cameron, embora a pegada seja aparentemente a mesma. Fixar a canção tema de forma discreta na trilha é um artifício que poucos conseguem fazer com sucesso, e aqui foi um casamento feito com grande êxito.
➤ UM EVENTO CINEMATOGRÁFICO
Após diversos adiamentos por conta da pandemia, Cruise e Kosinski insistiram em manter o filme guardado para preservar a experiência cinematográfica que é assisti-lo na tela grande. Enquanto outros títulos se renderam ao streaming e/ou optaram pelo lançamento mais limitado mesmo com a pandemia em alta, o retorno de Maverick aos cinemas após quase 40 anos ficou esperando a hora certa para que o grande público pudesse testemunhar seu gigantismo na telona e, com isso, obter o merecido lucro pela excelência do resultado final. Este é um evento para ser apreciado no cinema, na maior tela possível, captando ao máximo cada detalhe e referência que a produção espalhou e escondeu de modo a encher cada quadro com muita riqueza. A última vez que vi um filme se dispor tão magnificamente a estabelecer o cinema como um templo de devoção à sétima arte foi em 2016, quando 'O Regresso' chegou às salas do Brasil. Se há um filme atualmente em cartaz que merece ser apreciado com toda a imersão que o cinema pode oferecer e vale o investimento de cada centavo, então esse filme é 'Top Gun: Maverick'.
➤ UMA CARTA DE AMOR AO CINEMA
Na primeira das duas vezes que fui assistir ao filme, houve um momento de diálogo entre a pessoa de Tom Cruise e o seu público, onde o astro agradeceu a presença de todos e confirmou todo o amor que o filme carrega em todas as suas etapas e camadas. Quando rolam os créditos vê-se que centenas de pessoas - milhares, na verdade - se envolveram direta e indiretamente para fazer o filme acontecer. O resultado é fruto de um trabalho conjunto, um esforço coletivo para levar o máximo de realismo possível para a tela, dentro da fantasia alegórica que é o cinema. Na segunda vez que fui ao cinema não teve a declaração de Cruise, mas ainda assim suas palavras reverberam no decorrer do filme como uma confirmação de seu amor pelo cinema como a arte que ele é.
➤ A JORNADA DE AMADURECIMENTO
Maverick, como o conhecemos no primeiro filme, tem questões sérias a resolver no âmbito da disciplina e do respeito à hierarquia. Ele termina o longa de 1986 com uma inclinação ao dito "tomar jeito", se aprumando para ensinar aos novos recrutas a engenhosa façanha que é pilotar um caça. Contudo, como nos é informado logo no início do novo filme, quando ele retorna ao programa Top Gun, aquela faceta durou apenas dois meses e Maverick logo descobriu sua inabilidade em repassar conhecimento aos outros enquanto professor e tutor. Antes disso, no entanto, o filme nos mostra que Maverick continua tendo problemas de obediência e, embora obtenha sucesso em suas estripulias, ainda é movido pelo ímpeto de superar a si mesmo de forma despreocupada quanto a colocar a própria vida em risco. Isso é, inclusive, jogado em sua cara lá pelo meio do filme, quando ele é afrontado por Rooster, interpretado por Miles Teller que aqui encarna toda a ferocidade do filho de Goose. Mas Maverick, apesar da idade, ainda era um homem em formação, com algumas lições a aprender.
O Maverick que termina o filme não é o mesmo Maverick que o abriu. São homens diferentes, com uma visão de mundo diferente e um novo propósito para seguir. Pode parecer besteira (e talvez soe até fútil) afirmar que esse filme é feito para homens, mas devo confirmar que ele é sim. Significa que é exclusivamente para o público masculino? Claro que não, o público feminino também tem adorado o didatismo do filme (a nossa Karina Massud que o diga), mas é justo enfatizar que este é um filme para os garotos que viraram homens e para os que ainda precisam virar. É uma jornada de amadurecimento masculino, de redenção e acerto de contas com o passado. É uma caminhada rumo a própria paz, que todos precisamos fazer em algum momento para dar sequência à própria história. Alguns críticos consideram esse filme masculino demais, mas eu discordo. Ninguém fala que 'Lady Bird' (2018) é feminino demais, mesmo ele sendo um filme feito para enaltecer a jornada feminina de amadurecimento. Honestamente, prefiro encarar esse filme como uma obra humana demais, onde erros e acertos moldam o caráter de seus personagens e lhes transformam em pessoas melhores.
Para finalizar, deixo abaixo um música adorável e contagiante que tocou no filme, que é de uma das minhas bandas favoritas. Senhoras e senhores, aqui está 'I Ain't Worried', de OneRepublic.
Uma boa semana a todos e assistam 'Top Gun:Maverick' nos cinemas.
⧪⧪⧪
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