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'As Verdades' : longa vai além do suspense policial para discutir o que percebemos como realidade I 2022

NOTA 7.5

Por Eduardo Machado @históriadecinema 


Abrindo o dicionário Aurélio, procurei a definição da palavra “Verdade” e lá consta: “substantivo feminino; Que está em conformidade com os fatos ou com a realidade”. As palavras “fatos” e “realidade” são tratadas, porém, como se fossem unidimensionais, ou seja, como se houvesse apenas um modo de enxergá-las. A diferença, entretanto, do que cada um pode perceber como real é notável e é isso que o longa dirigido por José Eduardo Belmonte e estrelado por Lázaro Ramos, Bianca Bin, Drica Moraes, Thomás Aquino e Zé Carlos Machado explora. Não existe uma só verdade, existe o que percebemos.

Baseado no conto japonês que inspirou Akira Kurosawa a criar o clássico “Rashomon”, o filme traz Lázaro Ramos como o policial Josué, que retorna à cidadezinha onde cresceu no interior da Bahia para atuar como delegado, anos após o breve romance que teve com Francisca (Bianca Bin). O que poderia ser um serviço pacato, logo é interrompido por um crime: Valmir (Zé Carlos Machado), hoje noivo de Francisca, é encontrado com sinais de espancamento e atropelamento, à beira da morte. Quem cometeu o crime?


Partindo desse princípio, poderíamos pensar se tratar de um básico filme com a conhecida estrutura “quem matou?”. Mas “As Verdades” faz mais do que isso, pois importa menos o que acontece e mais como os participantes da história viveram e perceberam os acontecimentos. De início, o principal suspeito é Cícero (Thomas Aquino), de quem Josué logo toma depoimento. Após um tempo desaparecida, Francisca conta a sua versão à polícia, e Valmir, ainda no hospital, também relata o seu lado da história. Os relatos possuem pontos em comum, mas são sempre de alguma forma enviesados, deixando questões em aberto.

Ora, desde a Grécia Antiga, Aristóteles já tratava da percepção como dependente do corpo e da mente. Percepção, nesse caso, é o processo através do qual os indivíduos interpretam as informações que afetam seus sentimentos e ações. Portanto, não é necessariamente igual a realidade, pois lhe fornece apenas um significado limitado, próprio de cada ser humano. A percepção é construída pela familiaridade – conjunto de experiências vivenciadas pelo indivíduo, sua cultura e habilidade cognitiva. Com base nessa premissa podemos entender que inclusive Josué pode perceber de maneira diferente as narrativas que lhe chegam e até mesmo nós, como espectadores, podemos ser de certa forma parciais.

O excelente roteiro de Pedro Furtado sabe bem como causar a dúvida no espectador e deixar com que ele, de acordo com a sua própria percepção, possa elucubrar o que teria acontecido. Não são fatos, são narrativas e vale mais aquela que preferimos acreditar, o que é ratificado notadamente em uma cena entre Sâmia (Edvana Carvalho), uma das policiais que trabalha com Josué, e Amara (Drica Moraes), mãe de Francisca.

Um suspense policial, mas também um drama existencial. “As Verdades” nos convida a pensar sobre a vida e no que devemos acreditar. Se existem muitas verdades, valem mais nossos valores.



Vale Ver!



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