“Lola e seus Irmãos”: uma dramédia que abraça a leveza e a simplicidade para enaltecer o estreitamento dos laços familiares I 2022
NOTA 7.5
Por Alan Ferreira @depoisdaquelefilme
Alguns filmes possuem um ar tão despretensioso que parecem não apresentar grandes conflitos ou dramas mais acentuados. São histórias que, através de uma estética naturalista, quase que esvaziam o peso dos problemas de seus personagens centrais, conferindo-lhes uma leveza que pode sim, por vezes, ser tão eficaz quanto carregá-los com as tintas do melodrama. Neste sentido, “Lola e Seus Irmãos” funciona como uma espécie de espelho invertido de uma narrativa dirigida pelo mestre Pedro Almodóvar: suave e sem arroubos.
Logo na cena de abertura vemos Lola brincando com uma criança que, minutos depois, descobrimos ser seu sobrinho. Trata-se da festa de casamento de seu irmão mais velho Benoît e a primeira rusga que se apresenta é o atraso da terceira ponta desse triângulo fraterno, Pierre. Ali já vemos um pouco dos traços de personalidade de cada um deles e como os três se enxergam dentro daquela dinâmica familiar. A partir disso, a vida profissional/emocional de cada um deles será exposta em situações cotidianas e o longa se desenvolverá através dessas relações que, óbvio, foram moldadas por elos, rupturas e reconciliações passadas.
Como o projeto é centrado nas figuras presentes no título, cabe aqui uma contextualização acerca deles: Lola (uma graciosa Ludivine Sagnier) é uma advogada que redescobre o prazer numa relação amorosa após muito tempo; Benoît (vivido pelo diretor Jean-Paul Rouve) é o dono de uma ótica que, perto dos cinquenta anos, entra em crise ao descobrir a gravidez da nova (e bem mais jovem) esposa; e Pierre (José Garcia numa semelhança impressionante com Robert Downey Jr.) é um homem orgulhoso que, após um erro de cálculo, é demitido da empresa de demolições onde trabalha, o que tornará complicada a manutenção da faculdade do filho.
Da rotina deste último o longa pinça sua imagem mais grandiloquente e simbólica: a de um prédio vindo abaixo. Um equívoco na aplicação de explosivos ou na escolha desastrada de uma palavra podem causar fissuras difíceis de consertar. Porém, Rouve trabalha a reconstrução sugerida a partir dessa metáfora pela cartilha da comédia de costumes, edificada com simpatia, valendo-se das interações pessoais ao longo do tempo – repare na ótima sacada das visitas regulares ao cemitério – num equilíbrio quase sempre eficiente entre riso e lágrima.
Chegando com considerável atraso aos cinemas brasileiros, “Lola e Seus Irmãos” é uma dramédia sem invencionices narrativas, focada nos laços humanos, que se fortalecem e se desfazem frente às oscilações na jornada no núcleo que encena. Seu humor – nem sempre efetivo, é verdade – reside no texto e ganha maior fluidez graças ao entrosamento do elenco. Se, por vezes, Rouve quer dar aos diálogos uma substância filosófica – até Heidegger é citado em dado momento – no melhor estilo Woody Allen dos velhos tempos (autor de pérolas como, vejam só, “Hannah e Suas Irmãs”), os resultados mais convincentes surgem quando o filme abraça a despretensão, provando que a vida ordinária, na qual o “simples” esquecimento de um nome pode estremecer estruturas, já é complexa o bastante por si só.
Vale Ver!
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