Adsense Cabeçalho

'Órfã 2 : A Origem' amplia história de Esther à sombra do primeiro filme | 2022

NOTA 6.0

She's a maniac, maniac…

Por Vinícius Martins @cinemarcante 

Estamos em um período de resgate de filmes clássicos, que retornam na forma de sequências e tendem a atrair aqueles que preferem, na hora de comprar o ingresso, "apostar no seguro" e assistir a tramas que já são conhecidas e ampliam suas mitologias. Em 2022 temos, oriundos de 2009, 'Avatar 2: O Caminho da Água' e 'Órfã 2: A Origem' - que seguem caminhos diferentes na revisita aos seus personagens. O novo 'A Órfã', em especial, acompanha uma aparente nova tendência de criar sequências prequelas, apresentando eventos anteriores ao primeiro filme de modo a justificá-lo, conectando um universo próprio e costurando uma franquia - como visto há poucos anos em 'Annabelle 2: A Criação do Mal' e no vindouro 'Pearl' (filme 2 de 'X: A Marca da Morte').

Enquanto no primeiro 'A Órfã' havia um pudor técnico de linguagem e apreciação por meio da fotografia, aqui o destaque vai para o jogo de câmera que determina as proporções necessárias para tornar o filme visualmente crível. É inevitável recordar as cenas de interação com os hobbits em 'O Senhor dos Anéis' (2001), mas o que ocorre em uma cena (muito bem elaborada) de plano sequência é mais comparável ao trabalho de '1917' - isso no que diz respeito ao cuidado da perspectiva para esconder cortes, que aqui dão lugar às trocas entre a atriz Isabelle Fuhrman e alguma dublê infantil (do tamanho que a órfã devia ter no primeiro filme) que interage com o ambiente melhor do que a mulher de 1,60m que Fuhrman é em seus 25 anos de idade (23, durante as gravações). A cena em questão demanda correria e esconderijos, e é eficiente em convencer o princípio que Fuhrman ainda seria pequena como era 13 anos atrás. Contudo, o filme provoca um estranhamento um tanto desconfortável sobre as feições nada infantis da Fuhrman atual.

Se colocadas lado a lado as duas Esthers desses dois filmes, é muito fácil notar que neste segundo capítulo há uma adulta interpretando uma criança. O rosto magro e comprido é bem mais definido do que a carinha inchada e mais redondinha que Fuhrman tinha no primeiro filme. No terceiro ato de 'A Órfã' havia uma preocupação em como fazer uma criança parecer uma adulta, e aqui o oposto ocorre durante todo o filme e, honestamente, fracassa quase totalmente - não por falta de esforço ou talento por parte de Fuhrman, mas por uma limitação clara no orçamento que poderia promover um trabalho de maquiagem mais qualificado e efeitos visuais mais apropriados. Até a perspectiva fica fragilizada com isso; na cena em que o pai de Esther entra no quarto dela sua cabeça está mais alta que o marco superior da porta, evidenciando o calço que o ator usava para ser mais alto que Fuhrman e, desse modo, fazer parecer que Esther era mais baixa.

O filme apresenta um relaxo considerável em seu acabamento, e isso se vê, principalmente, nos efeitos visuais. Perante a enorme preocupação em estabelecer o tamanho proporcional de Esther, outras áreas acabaram pecando em disfarçar o chroma key e renderam cenas tão artificiais quanto as esquetes do 'Casseta & Planeta'. Uma cena em especial me fez rir de tão ridícula, onde um carro segue por uma estrada e a motorista gira o volante alegremente enquanto a paisagem no fundo permanece estática. O corte para a pista à frente mostra curvas leves, mas quando retorna ao ângulo do capô para dentro do carro a paisagem lateral (e também a vista numa distância maior pelo para-brisa traseiro) permanece constante como se estivesse em linha reta. Até o reflexo das árvores secas no para-brisa dianteiro parece mais falso que nota de três reais. E coroando tudo isso, temos uma sequência termodinamicamente bastante irregular, com um fogo abastado que parece até coisa de Bollywood. 

Mas calma, nem tudo é desastre. Quem revisitou recentemente o primeiro filme ou ainda o tem bem gravado na memória, já sabe antecipadamente o que virá no final da 1h30 de duração; contudo, o grande trunfo desse segundo 'A Órfã' é o seu miolo. É como uma viagem cujo destino já é conhecido, mas que se desvia da rota e passa por algumas paisagens diferentes até chegar lá. Confesso que me surpreendi, mesmo descobrindo a reviravolta antes de ela se revelar. O enredo explora a fuga de uma pequena criminosa altamente perigosa chamada Leena do manicômio onde estava confinada, e apresenta sua transformação quando assume a identidade de Esther, que era uma menina desaparecida há pouco mais de três anos (isso entre 2007 e 2008, que é quando esse prelúdio se passa). A interação entre Fuhrman e Julia Stiles (que interpreta a mãe da verdadeira Esther) é o ponto mais alto do filme, com olhares de desconfiança e que se fazem em um flerte constante com o reconhecimento de uma mãe que sabia muito bem a filha que tinha.

Com uma dúzia de conveniências e facilitações em seu roteiro (e sem uma equivalência de camadas e subtextos em relação ao antecessor), o filme tem lá sua diversão mesmo tendo o título mais inadequado do ano. 'First Kill', em seu original ("Primeira Morte", em tradução livre), não é cabível aqui porque a mulher que assume a identidade de Esther inicia o filme já presa por vários homicídios e é tida como a prisioneira/paciente mais perigosa do recinto. Com isso, o subtítulo traduzido também se torna falho, pois não se trata de uma trama de origem verdadeira para a personagem. E assim, com tropeços que não dá para ignorar e um resultado tolerável e descontraído no fim das contas, fica a menção da falta que faz a assinatura e o zelo de um bom diretor como Jaume Collet-Serra.


Vale Ver Mas Nem Tanto!



Nenhum comentário