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'Enola Holmes 2' : o formidável desenvolvimento de Enola Holmes | 2022

NOTA 9.0

Ela sabe de alguma coisa. Isso é infinitamente mais perigoso.

Por Vinícius Martins @cinemarcante 

O grande pensador, musicista e poeta Renato Russo, que fez de Brasília seu berço e palco artístico para tratar temas delicados e mexer em alguns vespeiros (assuntos como suicídio e inconformismo político), disse certa vez uma frase que carrego comigo no peito: "Consegui meu equilíbrio cortejando a insanidade". Curiosamente, assistindo 'Enola Holmes 2', a nova adição original ao catálogo da Netflix, me flagrei lembrando dessas palavras enquanto acompanhava a personagem-título (interpretada mais uma vez com um talento absurdo por Millie Bobby Brown) adentrando um caso aparentemente simples em sua nova vida de detetive, mas que se desdobra, aos poucos, em um escândalo caótico com potencial para desestabilizar as camadas sociais da Londres da era vitoriana. Enola, neste novo filme, tem uma curva de aprendizado bem sinuosa e, de igual maneira, deliciosíssima de acompanhar enquanto ela torna o público cúmplice em suas aventuras arriscadas. Ela, assim como Renato, procura seu equilíbrio - e tem diante de si uma maré de insanidades para cortejar.


Enquanto Enola tenta lidar com a estrutura cultural que insiste em lhe subjugar, eis que surge uma cliente improvável com um mistério a ser resolvido. O roteiro de Jack Thorne é bem enfático ao estabelecer algumas passagens de cunho crítico que valem tanto para o século XIX quanto para o atual, ressaltando ideais feministas de forma leve e orgânica à narrativa do mistério e às pontuais e engraçadas quebras da quarta parede que Enola promove. O feminismo é o tema central tanto deste filme quanto do anterior, e a valorização das personagens femininas aqui é elevado a um outro patamar com a adição de figuras reais que foram grandes nomes a influenciarem o sufrágio feminino com a greve das Matchgirls - quem estudou a história saberá disso logo no primeiro ato do filme, somente com a menção de um nome; contudo, mesmo aos familiarizados com o evento contemporâneo ao mistério que Enola tem para resolver, o filme continua surpreendente, gracioso e agradável de acompanhar.

O maior destaque do filme, contudo, vai para a coragem que o próprio tem ao propor uma reformulação de conceitos clássicos e apresentar a intrigante e astuciosa figura do arquirrival de Sherlock Holmes desde os livros de Conan Doyle - e vale citar que esse arco de Sherlock mais uma vez não ofusca o protagonismo de Enola; pelo contrário, acrescenta elementos cruciais para as andanças entre os pontos A e B. O desenvolvimento aqui é formidável, e digo isso me referindo tanto ao filme em sua cadência como também à jornada individual de Enola. A personagem cresce e amadurece, e o filme cresce junto com ela. Ao assumir as próprias fragilidades e aceitar suas limitações, a menina-mulher entende muito sobre a vida e ensina, através de diálogos que parecem inverter alguns princípios estabelecidos no primeiro filme por um critério de dedução, que ninguém muda o mundo sozinho. E como dizia o grande Renato no final de 'Pais e Filhos', sobre quem são nossos pais, é reforçada a ideia de que eles são "o que você vai ser quando você crescer". Esse último verso sempre me veio como uma interrogação, mas, ao crescer, me soou mais como uma constatação firme e pouco mutável. Somos os privilégios e as batalhas daqueles que vieram antes de nós, e 'Enola Holmes 2' trabalha esse conceito muito bem.


Vale Ver!



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