'Emancipation – Uma História de Liberdade' reabre as chagas da escravidão | 2022

NOTA 6.0

Por Karina Massud @cinemassud 

Em uma foto já amarelada pelo tempo vemos um homem negro sentado, curvado e cabisbaixo, e suas costas chamam a atenção pois são totalmente cobertas por cicatrizes enormes. Essa imagem é chocante e muito emblemática, pois tais marcas foram feitas por inúmeras chicotadas e torturas dos homens brancos. Esse homem eternizado na foto chamava-se Gordon, e ficou conhecido como “Peter Chicoteado”, um símbolo da luta antiescravagista cuja trajetória heróica é retratada no longa da Apple TV “Emancipation – Uma História de Liberdade”. 

Nos EUA a escravidão foi abolida parcialmente pelo Presidente Abraham Lincoln em 1863 com a Proclamação da Emancipação, e depois totalmente pela 13ª Emenda da Constituição em 1865. Em meio à Guerra de Secessão, Peter escapa da senzala numa plantação de algodão da Luisiana, um dos treze estados confederados do Sul que lutavam contra a abolição; enfrentando dez dias de fuga insana até chegar a um acampamento dos estados do Norte, que acabariam vencedores. 

Peter é um homem de alma liberta num corpo escravizado que sofre punições terríveis, mas que se apoia em sua fé inquebrantável em Deus para não esmorecer. A espiritualidade é muito presente no longa, cuja narrativa é pontuada por questionamentos que ocorrem a todos que passam por dificuldades: “Se todos são filhos de Deus, por que Ele não olha pelos escravos?” O ator Will Smith, ainda sob a sombra do escândalo do tapa que deu no comediante Chris Rock no Oscar 2022, parece o mesmo em todos os papéis dramáticos, incluindo o papel em “King Richard: Criando Campeãs” (2021) que lhe rendeu a estatueta dourada. As muitas caretas e a projeção do queixo para frente só comprovam que ele ainda precisa de muito ensaio para viver a contento personagens mais densos.

Antoine Fuqua, se sempre acerta como diretor de filmes de ação descompromissados como “Dia de Treinamento”, “O Protetor” e “Invasão à Casa Branca”, nesse épico não foi igualmente bem sucedido. Suas escolhas criativas são exageradas:  a luta de Peter contra o crocodilo no pântano ou os escravos cavando a cova pros colegas assassinados; tornando a narrativa cansativa e esvaziando o poder das imagens sobre a escravidão, que em poucos minutos falariam por si só. Destaque pra linda fotografia, uma mistura de tons pálidos e sépias até chegar ao preto e branco; tons que potencializam os horrores aos quais os escravos são submetidos.

A exploração do homem pelo homem foi e sempre será repugnante, por mais que a vejamos em produções diversas. “Emancipation – Uma História de Liberdade” está a anos-luz da grandeza de “12 Anos de Escravidão” (2013) ou de “Amistad” (1997), mas tem sua importância para que a imagem de “Peter Chicoteado” se perpetue e sirva de alerta pra que a humanidade não volte a cometer as mesmas atrocidades.

Vale Ver Mas Nem Tanto!