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'O Pálido Olho Azul' : Christian Bale e Harry Melling engrandecem a nova trama detetivesca da Netflix | 2022

NOTA 7.0 

Por Alan Ferreira @depoisdaquelefilme 

Histórias de detetive parecem ter caído de vez no gosto popular nos últimos anos. O que antes eram revisitações esparsas, nas quais se destacam a refilmagem realizada por Kenneth Branagh de “Assassinato no Expresso do Oriente” e seu herdeiro mais recente “Entre Facas e Segredos”, tem se tornado um verdadeiro resgate de um filão até então adormecido. Hoje, já é possível dizer que tramas misteriosas – em consonância, inclusive, com o boom do subgênero true crime - vem ganhando cada vez mais espaço no catálogo das plataformas de streaming, sobretudo da Netflix. De uns tempos para cá, a empresa não só investiu na continuação do sucesso capitaneado por Rian Johnson, como também catapultou duas aventuras de Enola Holmes, aproveitando, numa só tacada, o hype em torno de uma das estrelas de “Stranger Things” e o interesse do público jovem por esse tipo de enredo. Até mesmo “Wandinha”, o fenômeno da vez, tem sua base narrativa calcada nos dotes detetivescos da personagem vivida por Jenna Ortega. E é neste cenário oportuno que surge “O Pálido Olho Azul”.

Baseado no livro homônimo de Louis Bayard, lançado em 2003, o longa traz Christian Bale na pele do investigador aposentado Augustus Landor, que é chamado de volta à ativa para desvendar um assassinato ocorrido nas cercanias de uma academia militar no estado de Nova Iorque em 1830. Lá, ele encontrará o suporte de ninguém menos que Edgar Allan Poe, um cadete dotado de inteligência e sensibilidade acima da média, mas pouco hábil na relação com os demais colegas de regimento. E está justamente no valor dado à interação entre os dois, que contam com ótimas performances de seus intérpretes, o melhor a se observar na competente – até certo ponto – condução de Scott Cooper. Não que o realizador de “Tudo por Justiça” (também protagonizado por Bale) não tenha almejado imprimir um estilo gótico bem ao gosto do autor de clássicos como “O Corvo” e “O Gato Preto”. Entretanto, apesar de a fotografia de Masanobu Takayanagi se esforçar para empalidecer os ambientes, fazendo-os, contraditoriamente, parecerem bem mais bonitos do que intrigantes, o resultado na construção de uma atmosfera lúgubre jamais se aproxima da que já fora talhada por autores como Tim Burton – discípulo que confessa em cada fotograma o seu fascínio pelo escritor norte-americano.   

Outros aspectos que enfraquecem um bocado a experiência são o desenvolvimento escasso de alguns traços dos personagens e a pouca relação dos crimes com o que eles simbolizam neste tipo de literatura: o lado mais sombrio do ser humano. Christian Bale faz o possível para conferir peso ao drama que envolve o desaparecimento da filha de Landor, ao passo que Harry Melling é bem menos explorado do que poderia, com Poe sendo delineado pelo roteiro apenas como um jovem isolado que não se encaixa numa instituição rígida e castradora, só que sem maiores ampliações de seus dilemas e daquilo que o torna extraordinário. Já as presenças de nomes imponentes como Timothy Spall, Robert Duvall e Gillian Anderson – em papel muito semelhante ao de Miranda Richardson em “A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça” – são apenas protocolares e não alteram a mediania do projeto com suas participações. E, lamentavelmente, não há o que falar sobre a quase figuração de Charlotte Gainsburg, completamente desperdiçada em papel de ínfima relevância.

Embora tente nos surpreender com algumas artimanhas interessantes, mas de pouco fôlego, “O Pálido Olho Azul” se sustenta na maior parte do tempo pela química que brota da improvável dupla de detetives que nos apresenta. Se a resolução soa um tanto descuidada, sobretudo no que tange o embate entre ciência e ocultismo no terço final, o caminho pavimentado até ali faz jus, com um ou outro descuido, aos ensinamentos deixados pelos mestres para os quais presta tributo. E a julgar pelo sucesso obtido em seus primeiros dias à disposição do público, não chega a ser nenhum grande mistério o futuro que uma indústria fria e calculista como a cinematográfica reserva a este filão cada vez mais solidificado.   




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