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'As Histórias de Meu Pai' : comédia de Jean-Pierre Améris examina os efeitos na relação de Pais e Filhos | 2023

NOTA 6.0 

Por Maurício Stertz @outrocinéfilo

Seria ingenuidade minimizar de qualquer forma a ‘profissão’ de ser pai. Ingenuidade infantil, por sinal. O encontro entre Pai e Filho carrega muito mais do que apenas educar ou estar presente, é talvez o maior idealismo repassado à frente. E este ‘encontro’ rende histórias que recheiam o Cinema. De Pais heróis à vilões,  por vezes inspiradores,  outras autoritários, afinal a arte imita a vida desde que se deu por conta de ser. Basta uma boa história contada, com cada virgula ganhando mais tempo para respiração do que deveria ou cada acontecimento com a importância aumentada que o fascínio dos pequenos se transforma na adoração de um herói real de habilidades que parecem saídas diretamente dos filmes.  É por estas linhas cadenciadas, com a liberdade para uma mentirinha aqui, outra ali, que a ingenuidade irretocável dessa relação se confunde com autoridade no filme francês 'As Histórias de Meu Pai'


Em Paris, na década de 1960, Emilie é recrutado para a grande missão de sua breve vida: um segredo de Estado que devia guardar pelo bem do fascínio pelas tantas histórias enérgicas que escutava do pai.  Àquela altura, o garoto acreditava fielmente que ele realmente havia conhecido alguns políticos famosos da época e até mesmo inventado esportes. Mentiras infantis e saudáveis. Somente quando o pai compartilha os assuntos diários da geopolítica, claramente sérios demais para sua idade, que o garoto fica confuso, mas releva, por mera formalidade àquele que lhe falava.  Com a missão importantíssima dada por seu pai,  suas responsabilidades aumentam e o jovem recruta precisa agir. O por quê? Não fazia questão de entender.

Rapidamente seu mundo fantástico e infantil é afanado pela autoridade agressiva que surgia esporadicamente. As histórias do pai perdiam o entusiasmo e a missão que parecia ingênua e até boba num primeiro momento (riscar muros ou entregar cartas), escala em proporções e adere peso dramático à narrativa. O diretor Jean-Pierre Améris mantém uma clara tentativa de desvendar a manipulação e a subordinação nas ações, com uma alusão a como os “filhos” de uma pátria estariam suscetíveis ao ordenamento de suas hierarquias. Obedecer a ordens sem questioná-las ou mesmo julgar valores. A história fora da tela apresenta muitos exemplos, não preciso nem citar.

A comédia cria as brechas favoráveis ao assunto. O diretor se apropria da figura paternal e caricata, escondendo por detrás dele um subtexto pesado de ser carregado, principalmente por Emilie. Assim, o  discurso afiado se mantém, a família se desfigura aos poucos e é percebido que o fascínio se esvai dos olhos ainda brilhantes de um filho, mesmo que leve anos para se apagarem como uma luz estrelar que há muito não trafega pelo espaço. Certas partes da ingenuidade infantil desaparecem e a consciência se molda, uma seleção natural do recruta mais forte ao posto na grande missão de ser filho.

E neste vai e vem, são definidos os lados e criam-se traços de empatia com cada um dos personagens, enquanto o diretor  tenta suavizar suas próprias inserções de seriedade e finaliza o filme com uma passagem muito mais literal e polida (até demais), longe da comédia que testou em algum momento. O arrependimento e o perdão podem não significar reparações totais, mas essas são histórias que cabem a pais e filhos resolverem, como heróis ou vilões ao final. 





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