'Luzifer': longa austríaco nos conduz a uma trama minimalista e introspectiva | 2022
NOTA 7.0
Onde está o Diabo?
Por Rafa Ferraz @issonãoéumacrítica
Dirigido pelo austríaco Peter Brunner, na trama acompanhamos Maria (Susanne Jensen) e Johannes (Franz Rogowski), mãe e filho que moram isolados nas montanhas onde se dedicam a práticas religiosas diárias e uma vida ascética. Com o avanço de empreendimentos comerciais na região, a modernidade toma conta de suas rotinas trazendo com ela a perda da inocência, traumas do passado e um inimigo implacável.
Trafegando entre o melodrama e o horror, no equilíbrio entre o abstrato e o real, ‘Luzifer’ é pouco claro em sua narrativa e de fato, desde o início não se propõe a ser, de modo que, se afastando do didatismo, nos proporciona uma experiência sobretudo sensorial, passando pelo vazio e o silêncio dos alpes até o simbólico e verborrágico fanatismo que domina o dia a dia da família. Entretanto, essa sutileza é prejudicada por um ponto de virada próximo ao terço final que se por um lado surpreende, por outro rompe abruptamente com a sugestão até então proposta, comprometendo a estrutura e tornando os acontecimentos demasiadamente expositivos.
A atuação de Rogowski é soberba, seja nas interações com personagens secundários, especialmente a mãe, bem como em momentos mais contemplativos onde sustenta uma interpretação corporal bastante intensa e expressividade que, com auxílio de enquadramentos e close-ups bem inseridos, enfatizam questões de caráter mais íntimo e reflexivo. Não é por acaso que ele hoje é considerado um dos atores europeus mais relevantes no velho continente, em especial graças as excelentes parcerias com o diretor e roteirista alemão Christian Petzold, com quem trabalhou em ‘Em Trânsito’ (2018), ‘Undine’ (2020) e cujo próximo longa juntos tem data para lançamento comercial este ano, intitulado ‘Afire’, projeto esse já apresentado e aclamado na mais recente edição do Berlinale.
O cinema mínimo, em uma definição breve, não é a busca pela escassez, mas um encontro com a essência. Nesse trajeto, formas mais introspectivas de conexão se evidenciam e são postas em primeiro plano. Sem ter mais para onde olhar, nos resta a entrega, não importa se para a dor, a raiva ou o medo. A arte se comunica de muitas formas, até mesmo quando nada diz.
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