'Derrapada' : Pedro Amorim contorna as implicações de uma juventude imediata | 2023
NOTA 8.0
Por Maurício Stertz @outrocinéfilo
Há quem simplifique a vida em um grande jogo de ações e reações, como se fossem peças esmaltadas de dominó postos na vertical. Basta que uma caia para que o “caminho normal” se altere por completo. O “normal” poderia significar: um trabalho bem-sucedido, a realização pessoal ou uma família confortável. O que move cada um de nós, é único. Mas será que poderíamos controlar estes resultados? O livre arbítrio que diversos escritores de (auto)ajuda espalham por aí promete facilitar. O que não imaginamos (e os escritores sequer avisam) é que “derrapamos” com frequência por situações individuais ou coletivas e esbarramos justamente naquela peça mais importante sobre a mesa. Pode ser o resultado de uma educação deteriorada, a perda de um emprego importante ou até mesmo por uma gravidez na adolescência que irrompe sem avisar.
Em 'Derrapada', filme brasileiro dirigido por Pedro Amorim, a narrativa acompanha Samuca e Alicia e os desvios claros pela adolescência. São curvas que irão alterar o futuro, ali na frente. Em 2016, enquanto Samuca passava seus dias pelas pistas de skate do Rio, voando baixo e testando suas manobras, sua escola havia sido ocupada por uma juventude que buscava melhorias à educação pública. É pela curiosidade que lá conhece Alicia, uma garota ativa e ativista sempre à frente do processo. Dentre as faíscas dos problemas sociais já conhecidos, surge o romance dos dois. Como adolescentes, vivem o que há de viver. Até que, a vida no skate de Samuca ou o futuro na advocacia de Alicia são balançadas por uma gravidez aos 17 anos.
Desde o início, a quebra da quarta parede e a confidencia dos pensamentos de Samuca fazem do filme um grande palco para seus medos e inseguranças. Um diário íntimo, em que nós, os espectadores, somos os leitores que espiam cada uma de suas palavras. Quando recebe a notícia de que seria pai, por exemplo, compartilha sua imaturidade, muito por causa da idade, mas volta, como se estivesse ciente do nosso julgamento constante. Aliado a isso, a montagem desempenha um papel importante, trazendo o tom cultural das ruas formadas como organismos vivos marcados por pinturas secas e memórias frescas. Até mesmo os desenhos de Samuca viram transições coloridas e ingênuas entre o que é episódico. E quando acelera a passagem do tempo, tem outra ferramenta narrativa interessante, reforçando a urgência do que estão vivendo.
Estes são alguns detalhes sutis que convergem e fazem a direção de Pedro Amorim chegar no lugar mais alto. Pontos que escalam o comprometimento a um discurso social, como uma bandeira levantada para uma nova geração inteira, ao tratar diretamente sobre amadurecimento dos dois adolescentes como exemplos das consequências de ações passadas. Mas que, apesar do alerta claro, tem a delicadeza de retribuir com um recorte otimista, de uma vida que se adapta, muda as prioridades e se prepara melhor para as novas “derrapadas” que vierem.
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