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Festival de Cinema Italiano : 'A Última Vez que Fomos Crianças' | 2023

NOTA 7.0

Voltado ao público infantil, longa aborda a amizade de quatro crianças em tempos de guerra

Por Rafa Ferraz @issonãoéumacrítica


O cinema é uma forma de arte, enquanto o filme é um produto desse meio. Como qualquer produto, os filmes são concebidos com um público-alvo em mente, apesar de alguns possuírem um apelo mais amplo, como é o caso do subgênero de super-heróis. Essa versatilidade não está restrita ao cenário hollywoodiano, pois no Brasil, um dos maiores fenômenos de bilheteria foi a série de longas d' Os Trapalhões. Embora a comédia fosse sua característica predominante, eles também abordaram mensagens de cunho social e momentos verdadeiramente emocionantes. "A Última Vez que Fomos Crianças" segue essa mesma fórmula, apresentando uma narrativa familiar e convidativa, mas com o diferencial marcante de ser ambientada no contexto da Segunda Guerra Mundial. Essa aparente contradição se revela acertada, especialmente do ponto de vista pedagógico. 

Na trama, acompanhamos Ítalo (Vincenzo Sebastiani), filho de um líder fascista, Cosimo (Alessio Di Domenicanto), um jovem que perdeu os pais na guerra, Riccardo (Lorenzo McGovern), de uma família judia, e Vanda (Carlotta De Leonardis), uma órfã que tem o sonho de ser adotada. Os quatro formam uma improvável amizade no auge da Segunda Guerra Mundial. Quando Riccardo é capturado pelos nazistas, eles se unem em uma corajosa missão de resgate. Simultaneamente, dois adultos, Agnese (Marianna Fontana), uma freira residente do orfanato e Vittorio (Federico Cesari), oficial do exército italiano e irmão de Ítalo, partem em busca das crianças. 

A jornada retrata a inocência da infância em contraste com os horrores da guerra, e, de maneira acertada, os segmentos que fornecem contexto histórico passam por um filtro que simplifica certos aspectos para tornar o discurso mais acessível ao público-alvo. Na Europa, em particular nos países do Eixo, o ensino sobre a ascensão dos governos nazifascistas faz parte da educação desde muito cedo. Na Alemanha, existe até uma palavra para isso: "Vergangenheitsbewältigung", que se traduz como "lidar com o passado." (Vergangenheit = passado; Bewältigung = reconciliar-se, sobrepujar). Mesmo com uma abordagem mais leve e uma trilha sonora de fanfarra que confere um tom quase festivo a certos momentos, o terço final da trama pode surpreender dado o impacto de alguns desfechos. 

Apesar da tenra idade, o elenco demonstra talento graças ao carisma e a química entre os protagonistas. Os personagens, seguindo uma fórmula comum em filmes desse tipo, apresentam arcos facilmente identificáveis, como o gordinho atrapalhado, o jovem corajoso, a órfã esperta e o judeu vítima de preconceito e perseguição desmedida. Essa estrutura, embora simples, evita reforçar estereótipos e proporciona uma perspectiva infantil que se alinha à proposta, permitindo que o público veja o conflito através dos olhos de cada um deles. É claro que há uma certa "limpeza" na ambientação e na maquiagem. É plausível imaginar que, naquela fase da guerra, a Itália já empilhasse corpos e destroços nas ruas, mas a inclusão desse realismo certamente restringiria o alcance da narrativa. 

O filme, com uma duração de cerca de 1h30, peca por uma aparente extensão desnecessária, particularmente após a primeira hora em que o elenco adulto ganha foco, tornando-se repetitivo e desinteressante. No entanto, o filme carrega consigo um peso significativo: a missão de transmitir às novas gerações a importância de compreender o peso do passado. Não se trata de ressuscitar velhos fantasmas, mas de conscientizar que as sombras do nazifascismo ainda podem se manifestar. A prevenção do renascimento dessas ideologias é imperativo, e o cinema desempenha um papel fundamental nessa luta. 








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