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'A Linha' : estridências familiares em longa francês que fica no limiar entre o melodrama e o cômico | 2023

NOTA 4.0

Por Alan Ferreira @depoisdaquelefilme


“A Linha” se inicia com um contraditório balé. Aproveitando a ligação da família de protagonistas (formada por quatro mulheres) com a música, a diretora Ursula Meier utiliza o recurso da câmera lenta para ironizar a violência dos movimentos de uma briga entre mãe e filha. Após essa lamentável dança, o espectador é convidado a tentar entender as razões e os desdobramentos da desavença que culminou numa drástica decisão judicial: Margaret deverá se manter afastada, durante o período de três meses, a uma distância mínima de cem metros da casa de sua progenitora.

Já com um histórico de situações em que seu comportamento agressivo veio à tona, a personagem vivida por Stephanie Blanchot busca, a seu modo, uma reaproximação. Contudo, devido aos traumas deixados na família, a pequena Marion decide lembrá-la visualmente dos limites impostos pela Justiça, pintando literalmente a tal linha do título nas cercanias da casa. A partir da tentativa de controlar seus impulsos e respeitar a fronteira criada pela irmã mais nova para demarcar barreiras emocionais, Margaret fará o possível no intuito de se reconectar com todos aqueles que, de algum modo, sofreram com seus atos.

O grande problema dessa produção francesa reside na dificuldade flagrante que a cineasta possui de encontrar o tom certo para a história que pretende contar. Enquanto algumas situações beiram o absurdo e claramente foram pensadas para gerar humor, as escolhas da direção e a chave de interpretação em que as atrizes principais se encontram, bastante inclinadas para o melodrama, geram uma incompatibilidade que atrapalha o curso da narrativa. Além disso, é notória a falta de aprofundamento psicológico nas questões que unem e separam as integrantes daquela família para além da música. Enquanto Margaret é brigona porque sim, a mãe Christina (Valeria Bruni Tedeschi) passa quase toda a projeção como uma artista sem noção em que a mágoa jamais se mostra de forma convincente. A única cuja trajetória se estabelece de modo minimamente razoável ao longo da trama é a da já referida irmã caçula interpretada por uma promissora Elli Spagnolo, sobrando para as demais figuras femininas uma ingrata sobreposição de cenas de gritaria e empurrões.

Sem saber lidar com o nonsense e fazendo dele apenas inconsistência, Ursula Meier não consegue cruzar com eficiência os limites dos modelos narrativos com os quais almeja diálogo. Assim, o que poderia ser um belo drama familiar com doses de comicidade protagonizado por mulheres, resume-se a um amontoado de atritos marcados por um comportamento histriônico, a tal ponto de fazer com que este humilde crítico desejasse, a certa altura, sofrer momentaneamente da mesma limitação auditiva que acomete uma das personagens centrais. Definitivamente, os muitos embates travados aos berros em “A Linha” não são música para os nossos ouvidos. 





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