'Nosso Amigo Extraordinário' : filme traz reflexão sensível sobre velhice e tolerância | 2023
NOTA 7.5
Por Karina Massud @cinemassud
Envelhecer ativo, com saúde e qualidade de vida é um privilégio para poucos. Em “Nosso Amigo Extraordinário” conhecemos o Milton, um senhor viúvo e aposentado que tem uma vida tranquila... seu casal de filhos está criado, ele tem uma boa casa e uma boa renda, mas a solidão e o tédio o perturbam; a coisa mais empolgante que ele faz no seu quotidiano é ir na reunião de moradores da sua cidadezinha com os vereadores locais. Até que um dia acontece algo inusitado: uma nave espacial cai em seu jardim com um extraterrestre que ele acaba abrigando em casa.
A história é parecida com a de “Cocoon” (1985), onde alienígenas se alojam numa piscina perto do asilo e viram a vida dos idosos de pernas pro ar. Só que em “Nosso Amigo Extraordinário” (o título original é “Jules”, e aqui temos mais um título nacional desastroso, jamais canso de bater nessa tecla) a trama é mais simples mas igualmente bela nas consequências da visita inesperada.
É maravilhoso ver o brilhante ator Sir Ben Kingsley viver um protagonista comum e descomplicado. Ele, que sempre nos brinda com personagens densos e interpretações grandiosas como Gandhi, Lenin, Georges Méliès ou Salvador Dali, agora nos deleita com a interpretação de um homem que poderia ser o seu vizinho ou colega de trabalho. Kingsley constrói várias camadas em Milton através dos seus olhares cheios de significados, solidão, tédio ou espanto, e seus silêncios de indignação como quando sua sanidade mental é colocada a prova por sua filha – angariando pro personagem uma empatia enorme do público.
Ninguém, exceto suas amigas Sandy e Joyce, acredita que Milton hospeda um alien; o que passa a ser um ponto positivo pro trio que têm a partir daí uma virada de vida e tem a alma rejuvenescida. Eles embarcam numa jornada de desabafos e reflexões sobre a velhice, sobre a invisibilidade que sentem ter perante a sociedade intolerante com o diferente do padrão. Jules, o amigo extraterrestre, na sua quietude e calma para resolver os problemas pra voltar pro seu planeta, consegue tirar dos seus amigos muitos relatos íntimos e acaba se tornando um terapeuta pros terráqueos. Cada um que senta do seu lado abre o coração e conta suas aflições presentes e alegrias passadas em belos monólogos. A forma como encaram e lidam com a velhice é exposta, e nem sempre é agradável, pois os velhos ainda são tratados de forma bem aquém da merecida. Jules os une e os torna cúmplices nesse “segredo”, que além de ser um remédio pro tédio, os ajuda emocionalmente.
O diretor Michael Turtletaub (que dirigiu “Jamaica Abaixo de Zero” e “Enquanto Você Dormia” e produziu “Pequena Miss Sunshine” e “A Despedida”), lança um olhar pro drama e não de ficção cientifica, que é assumidamente uma trama simples porém sensível sobre sentimentos. Há sim a busca do ET pelo serviço secreto, mas o foco da trama é a amizade, a solidão na terceira idade, a redescoberta da alegria e a tolerância com o diferente. “Nosso Amigo Extraordinário” chega sem muito estardalhaço ao catálogo da Netflix, mas com carisma suficiente pra conquistar e emocionar quem procura por um filme simples porém bonito.
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