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'O Mundo Depois de Nós' : thriller da Netflix ilustra a dependência tecnológica como mal necessário | 2023

NOTA 6.0

Por Maurício Stertz @outrocinéfilo 


Dizem as más línguas que uma próxima extinção em massa, comparáveis a era glacial ou vulcânica, seria por consequência direta da tecnologia. Parece até mesmo mais um destes pessimismos modernos e apocalípticos que são espalhados por aí, mas a configuração da vida humana totalmente dependente da tecnologia, não permite espaços para que erros aconteçam nesse caminho. Essa autodepreciação parece cada vez mais real. No dia a dia, não é apenas uma dependência mesquinha de uma rede social, mas a sujeição tecnológica que, a esta altura, nos envolve até o pescoço, como em areia movediça, em todos os aspectos da vida. O risco está aqui, não apenas em inteligências artificiais vingativas a lá James Cameron. Um simples passo em falso e poderíamos voltar ao breu absoluto das cavernas rapidamente. Pensando nisso, o autor Rumaan Alam escreveu seu livro homônimo que serve de base para este thriller. 


Protagonizando esse experimento social, uma família americana decide por sair de férias a uma casa de campo que haviam alugado. Durante a ida, tudo aparenta perfeita normalidade. Aos poucos tudo aquilo que é tecnológico, perde sua principal função: os telefones já não funcionam mais, a internet não tem mais sinal e até mesmo um navio se perde em sua escala logística. Em meio a este tempo de escuridão fenícia, dois estranhos aparecem na porta em busca de abrigo, dizendo ser os donos da casa.

Com grande elenco, formado principalmente por Julia Roberts, Mahersala Ali e Ethan Hawke, à primeira vista a estética empregada por Sam Esmail relembra grandes nomes do gênero, como Jordan Peele e Shayamalan. Com a utilização de muitas tomadas aéreas, drones e movimentações “esquisitas” de câmera (de lado ou ponta cabeça), como havia feito na excelente 'Homecoming', com Julia Roberts na primeira temporada, extrai uma sensação de observar seu próprio filme, com a lente se esgueirando por todos os lados a fim de não ser notada em nenhum momento pelos personagens e permitindo aproximar-se apenas quando um close for necessário. Abre-se espaços para que a trama possa ser desenvolvida com todas as suas camadas de tensão.

Ao posicionar os personagens ao centro, sem saberem sequer o que está acontecendo, a descoberta é feita em conjunto (nós com eles). A natureza humana aflora em cada um e essa microssociedade tende a se reorganizar rapidamente. Essa é a fórmula certeira para rechear o clima em tensão, enquanto as pistas aparecem. Pois sem saber o que realmente está acontecendo, a ameaça aparenta ser ainda pior, as teorias conspiratórias explodem e a urgência pela descoberta, geralmente ao fim, é o que mantém o engajamento durante toda a duração – a propósito, são quase duas horas e meia. Por se tratar de um olhar crítico à sociedade, há espaço para suas disfuncionalidades, principalmente na dependência cibernética, mas também no racismo estrutural evidente, nas carências humanas, representada cada um com seus arcos de personagens completos e na procura por recomeços.

Por ser longo em duração, a preocupação com as consequências aos personagens baixa como poeira, enquanto a curiosidade pelos “porquês” num ato final maquiavélico cresce ainda mais. O problema é que não há! Este é apenas um recorte de tempo. Existe o antes e existirá o depois, quando os créditos aparecem. Seria imediatismo de minha geração internética achar que todos os ciclos do filme devessem ser encerrados ali. Até que ao final, totalmente aberto, pudesse parecer que a falta de sinal também havia me atingido e na escuridão abrupta me vi tateando por explicações.








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